GLORIOSOS 50 ANOS DOS CRAVOS DE LISBOA

  • Revoluções assinalaram cada passo da Civilização ao longo de todos os tempos e trouxeram profundas transformações. Duas delas, ocorridas nos últimos 235 anos, marcaram definitivamente os valores contemporâneos.
  • A primeira, a mais grandiosa, foi a Revolução Francesa, de 1789, que, para além de colocar um ponto final na Idade Moderna (iniciada em 1453), derrubou a Monarquia no país e efetivou o ideal grego platônico da República, elevando aos altares la bourgeoisie – a burguesia.
  • A outra, a Revolução Russa, de 1917, comandada por uma vanguarda intelectual sob a chefia de Vladimir Lenin (1870 – 1924), estabeleceu o Comunismo, em Moscou, nos bizantinos palácios do Kremlim, em favor dos ‘soviets’, isto é, literalmente, a aliança de trabalhadores e soldados – dando o nome de União Soviética a todas as Rússias da época czarista. Ambas tiveram um caráter extremamente antimonarquista e causaram, durante várias décadas, verdadeiros banhos de sangue.
  • Mas uma terceira revolução, a do 25 de Abril de 1974, que nos próximos dias comemorará seus 50 anos, passou à História como a Revolução dos Cravos, justamente porque, de forma incrível, as Forças Armadas deram um golpe militar, sem derramamento de sangue, destituindo um regime no poder desde 1926.
  • Como era primavera, portanto, havia muitos cravos nas mansardas e moradas de Lisboa – e aí alguém teve a ideia de pôr uma dessas flores na boca de um fuzil. A moda se propagou e, em minutos, se tornou símbolo da mais pacífica das revoluções do planeta – motivo de orgulho dos portugueses e povos lusófonos.  Aquela manhã lisboeta, perfumada pelos cravos, lavaria a alma de uma jovem geração, à qual pertenço, que vivia, no Ocidente, o sonho de mudar o mundo e abolir repressões e preconceitos.
  • Acontecia precisamente 226 dias depois da sangrenta deposição do governo de Salvador Allende, aqui, na América do Sul, no Chile, um socialista quase utópico, morto, aos 65 anos, no Palácio Presidencial de La Moneda, em Santiago. A crueldade do assassinato de Allende, seguido da ditadura ultrarreacionária do General Augusto Pinochet (1915 – 2006), levaria o Cone Sul americano à penumbra dos anos de chumbo – que se agravaria com a quartelada de 1976 na Argentina, provocando o ‘desaparecimento’ de quase 30 mil pessoas.
  • Fui surpreendido pelo 25 de Abril de 1974, na carioca Praia do Russel, diante do Aterro do Flamengo, em plena redação dos semanários “Manchete” e “Fatos&Fotos”, da Bloch Editores. Ofereci-me, imediatamente, para participar dos números especiais transmitidos apressadamente às rotativas, dando conta que a Junta Militar mantinha cercado o Convento do Carmo, no Bairro Alto, onde haviam se refugiado o Presidente da República, Américo Tomás (1894 – 1987), e o Chefe do Governo, Professor Marcello Caetano (1906 – 1980).
  • Os dois seriam asilados, posteriormente, no Rio de Janeiro. Guardo até hoje, nos meus acervos, as preciosas edições dos jornais portugueses daqueles dias remetidos, via Varig, à Bloch Editores para usarmos nas matérias que produzíamos sobre a Revolução dos Cravos.
  • A coluna desta semana é a primeira de uma série de quatro que dedicarei ao 25 de Abril de 1974 – e está ilustrada pela capa da revista “Manchete” com o legendário General António Spínola, o General Sem Medo, um dos heróis do movimento vitorioso. Pouco depois, já em O Globo, seria enviado como correspondente à Península Ibérica, sediado em Madri – após a morte do Generalisimo Francisco Franco (1892 – 1975). Foram anos extraordinários que vivi entre o ‘destape y la movida’ madrilenha e as conspirações lisboetas esquerdistas, madrugadas adentro, no Alto da Trindade, à mesma mesa com exilados brasileiros e oficiais lusitanos.  

ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)

Albino Castro é jornalista e historiador

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