O PACOTE ECONÔMICO TÍMIDO ANUNCIADO PELO GOVERNO FEDERAL

O programa para pequenas e médias empresas brasileiras é uma proposta extremamente restrita, um pastiche do que já está em andamento na França

O pacote econômico foi anunciado com ênfase. Teve a presença do presidente Jair Bolsonaro, e sua dificuldade em soletrar a palavra “problema”, e presidentes de três instituições: Roberto Campos Neto, do Banco Central, Pedro Guimarães, da Caixa Econômica Federal, e Gustavo Montezano, do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

O pacote é pífio. Consiste das seguintes medidas:

Cria uma linha de crédito emergencial para Pequenas e Micro Empresas (PMEs) visando exclusivamente financiar dois meses de salários dos funcionários, até dois salários mínimos.

É uma proposta extremamente restrita, um pastiche de propostas já em andamento na França.

Por lá, o banco estatal transfere recursos para a banca privada, estritamente para financiamentos de prazos superiores a 12 meses. Concedendo o financiamento, o banco público banca 85% do risco e o setor privado os outros 15%.

Por aqui, a proposta é ridiculamente inferior:

* Financiará apenas os salários que constem da folha das PMEs – uma minoria no universo das PMEs, especialmente depois da flexibilização da legislação trabalhista.

* Haverá um montante de R$ 20 bilhões ao mês, com R$ 17 bi bancado pelo Tesouro e R$ 3 bilhões pelos bancos, com divisão proporcional de riscos.

* Os juros serão de 3,75% e empresas terão 6 meses de carência e 36 para pagamento, operacionalizado pelo BNDES. Em vários países, o governo banca até 85% do salário do trabalhador. Pelo pacote Guedes, a dívida ficará inteiramente com as PMEs.

Por isso mesmo, as declarações de Montezano, do BNDES, beiraram o ridículo. Particularmente encantado com a engenharia fiscal montada, Montezano assegurou que se tornaria um case mundial, demonstrando um desconhecimento absurdo para o cargo que exerce.Leia também:  O declínio do império americano, por Rogério Maestri

Nas medidas mais voltadas para mercado e grandes corporações, valeu a experiência de Roberto Campos Neto.

Uma das medidas será a criação de um fundo, administrado pelo BC, com autorização para liberar recursos na compra de carteiras de letras financeiras das instituições com problemas de liquidez. Corrige-se a decisão do Secretário do Tesouro Nacional, Mansueto de Almeida, que proibiu a venda e quase quebrou o mercado.

Também acenou com a possibilidade do BC comprar créditos diretamente das empresas, outro passo relevante para conferir liquidez e fazer o dinheiro chegar na ponta.

O papel da Febraban

O depoimento mais chocante foi o de Pedro Guimarães, da CEF. Não tanto pelo que a Caixa fará, mais pelas práticas de mercado até hoje adotadas por todos os bancos.

No cheque especial, as taxas estavam em 14% ao mês; no financiamento de cartão de crédito, em 7% ao mês.

Campos Neto tentou justificar. Nessas taxas estão embutidos o custo dos juros, o medo de ficar sem liquidez e o custo do capital.

Não há explicação para tais níveis de taxas. Uma das explicações favoritas é que os bancos embutem no custo do financiamento a probabilidade de inadimplência.

Com taxas de 14% ou mais ao mês, a inadimplência é uma certeza. Na verdade, o que os bancos fazem – praticando essas taxas – é se habilitar ao patrimônio do devedor.

Para conseguir financiamento, o banco exige garantias. Quando a empresa entra em cheque especial não tem mais esperanças de sobrevivência. Os custos financeiros servem apenas para inchar o passivo na hora do banco se habilitar às garantias oferecidas.Leia também:  Profecias apressadas do caos e coisas que virão, por Gilberto Maringoni

Na crise do pacote Joaquim Levy, houve uma razia no patrimônio das empresas. Foi um endividamento amplo, uma falta de crédito total, da qual os bancos se defenderam com um ataque implacável sobre as garantias.

Desta vez, se tem empresas sem patrimônio, sem ainda ter se recuperado das crises anteriores, expostas ao mesmo jogo.

A solução para isso seria um trabalho de articulação de todos os bancos. Poderia ser feito pela própria Febraban (Federação Brasileira dos Bancos), mas ela parece ter perdido a capacidade de articulação, principalmente devido aos níveis de concentração bancária.

A obrigação, então, teria que ser do Banco Central, negociando ou impondo. Mas não há governo.

LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)

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