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Lula tem direito de não ter paciência para o rame-rame da pequena política. Mas não de manter esse estilo de governo
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Vamos aos fatos:
- Falta um projeto de futuro ao governo, e o bolsonarismo cresce nesse vácuo.
- A estratégia de acalmar o mercado e apenas perseguir ferreamente o superávit fiscal é inviável. Levada a ferro e fogo, é caminho certo para a derrota eleitoral em 2026. Mesmo que o bolsonarismo seja extirpado do Banco Central, no próximo ano, deixará um legado de terrorismo fiscal que inevitavelmente amarrará o novo presidente.
- Lula tem minoria no Congresso e a aprovação de qualquer coisa exige um corpo a corpo que ele não parece mais disposto a perseguir. E nem o condene. Depois de tudo o que passou, a vitória em 2022 salvou o país provisoriamente do fascismo.
- Se Lula não parece disposto a repetir o Lula de 2008, se a idade pesa, se o calvário a que foi submetido quebrou alguma mola interna, há que se pensar em outras saídas.
O caminho não é nem chutar o balde fiscal, nem seguir o realismo dos eunucos, de que nada poderá ser feito sendo minoria no Congresso, ainda mais a maioria sendo de ultradireitistas ou fisiológicos.
Então só restam dois caminhos: pedir o boné; ou definir novas formas de atuação política e de busca da mobilização da opinião pública, em ações de coordenação interna que não dependam do Congresso para sua concretização.
O caminho passa, inevitavelmente, por uma mudança na forma de gestão do governo.
Lula tem todo o direito de não se animar mais com o dia-a-dia da política miúda, os rapapés a deputados e senadores, a maioria dos quais sem nenhum espírito público. Mas não tem o direito de paralisar o governo. Tem que definir um modo de gestão que planeje as políticas públicas e o preserve para as decisões finais do que deve ser feito.
Para tanto, o modelo é óbvio e já tem precedentes históricos. Trata-se de montar Grupos de Trabalho, interministeriais, incluindo todos os organismos envolvidos com cada meta proposta.
Só para efeito de exemplo, analise a volta da indústria naval. Sua reconstrução envolve o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, desenvolvendo o planejamento para petróleo e gás. Mas envolve também a FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos), ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia, o BNDES, o Ministério da Fazenda, a Receita Federal, a ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial). E por aí vai.
Reuniões periódicas, definição da função de cada um, balanços periódicos, tudo isso dará uma agilidade tremenda aos projetos. Para cada GT haverá um coordenador levando as principais conclusões a Lula, que dará a palavra final e resolverá os temas mais complexos. E terá muito mais entrega a fazer, do que inauguração de obras do PAC – que dificilmente acontecerão por falta de orçamento.
Tome-se o caso dos medicamentos – já contado aqui. A meta é de produção de 70% dos medicamentos internamente. Mas na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) estão paralisados exames de produtos com o equivalente a R$ 17 bilhões de faturamento/ano. E tudo por conta da falta de pessoal, de uma agência que não tem concurso desde 2013.
Quem resolve o pepino? O Ministério da Saúde é que não é, nem mesmo o da Gestão, porque tudo está amarrado ao orçamento. Em um modelo de GT, todos os agentes estarão discutindo todos os detalhes do plano, tudo que é necessário para colocar a meta em pé. E o papel de Lula será definir os objetivos e resolver os impasses.
Hoje em dia, o desânimo do mercado com o governo não se prende a nenhuma dúvida sobre a parte fiscal. Qualquer analista minimamente informado sabe que a economia tem bons fundamentos. O desânimo – inclusive dos gestores externos – é com a falta de perspectivas. E a criação de perspectivas se dá com gestão rápida e eficiente, que abra espaço para investimentos em atividades produtivas.
Repito: Lula tem todo o direito de não ter mais paciência para o rame-rame da pequena política. Nas últimas décadas, foi o brasileiro que mais contribuiu para que o Brasil permanecesse no campo das nações civilizadas.
Mas não tem o direito de manter esse estilo de governo, já que um modelo moderno de gestão será o caminho mais rápido para entregar resultados e conferir a Lula o papel nobre, de quem decide as grandes questões e faz as grandes entregas.
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)