Estatal distribuía mais de 100% do lucro aos acionistas no governo Bolsonaro; agora, a retenção coloca Prates na berlinda
A mudança no pagamento de dividendos da Petrobras em 2023 não agradou ao mercado financeiro e nem à grande mídia, que não só fala em crise na estatal como numa suposta disputa entre o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates.
Após a divulgação de um lucro recorde em 2023, a Petrobras anunciou ao mercado que encaminhou para Assembleia Geral Ordinária (AGO) a distribuição de dividendos equivalentes a R$ 14,2 bilhões – considerando os dividendos antecipados ao longo do exercício, ajustados pela Selic, o montante pago em 2023 vai chegar a R$ 72,4 bilhões.
“O lucro remanescente do exercício, após os dividendos e formação de reservas legais e estatutária, totaliza R$ 43,9 bilhões, e o conselho propôs que esse montante seja integralmente destinado para a reserva de remuneração do capital com a finalidade de assegurar recursos para o pagamento de dividendos, juros sobre o capital próprio, suas antecipações e recompras de ações”, disse a estatal na ocasião.
A notícia não foi bem recebida pelos analistas do mercado financeiro, mesmo com cálculos mostrando que o valor de R$ 72,41 bilhões pode ser inferior aos dividendos extraordinários pagos no último biênio (média anual de R$ 155,7 bilhões), mas são 12 vezes maiores do que a média observada entre 2003 e 2020 (R$ 5,9 bilhões).
Diante disso, a grande mídia – em especial os jornais Folha de São Paulo e O Globo – tem usado a mudança de política como mecanismo de ataque contra a estatal, colocando em perspectiva inclusive uma possível demissão de Prates.
“Em suma, o que era para ser tratado como um sucesso, foi derrubado pelo Globo simplesmente porque não se cometeu a irresponsabilidade de outros anos, de distribuir todo o lucro sem se preocupar com o futuro da companhia”, lembra o jornalista Luis Nassif.
Distribuição de todo o lucro
Os dividendos gerados pela Petrobras no primeiro ano do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foram ajustados após os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, quando a totalidade do lucro líquido era distribuída aos investidores.
Cálculos elaborados pelo DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) a pedido da FUP mostram que, apenas nos 3 anos e meio de Bolsonaro, a Petrobrás gerou R$252,8 bilhões em lucro líquido e pagou R$258,7 de dividendos aos seus acionistas – ou seja, a empresa pagou 102,3% do lucro em dividendos, usando parte das reservas de lucro que tinha acumulado em períodos anteriores.
“Desde total de dividendos, 43% foram para acionistas de fora do Brasil e outros 36,8% para a União (governo federal) e BNDES. Mas não foi sempre assim, de 2003 a 2013 a empresa sempre apresentou lucro e pagou dividendos, mas numa proporção bem menor, média de 34% do lucro”, disse a FUP, na ocasião.
Em novembro de 2022, tanto a FUP (Federação Única dos Petroleiros) como a Anapetro (associação que representa os petroleiros acionistas minoritários da Petrobras) entraram com processo contra a então gestão da empresa e seus conselheiros diante da possibilidade de a estatal distribuir R$ 50 bilhões em dividendos apenas no terceiro trimestre de 2022.
“Além de questões legais, a distribuição de dividendos de tal magnitude é imoral. Em 2022 serão R$ 180 bilhões de adiantamento de dividendos referentes a 2022, mais R$ 37 bilhões pagos no primeiro semestre, relativos a restos a pagar de dividendos de 2021. Ou seja, a Petrobrás vai distribuir, pelo critério caixa, R$ 207 bilhões de dividendos em 2022”, frisou na época o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar.
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Tatiane Correia
Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.