Os que acompanharam esta coluna da última 5ª feira, 19 de outubro, e leram ontem a coluna Coisas da Política, com considerações sobre a eleição na Argentina, não se surpreenderam com a não vitória – tida como certa pelas principais mídias brasileiras – do candidato ultrarradical, Javier Milei. Além de não levar no 1º turno, Milei perdeu a liderança para o ministro da Economia por 36,7% a 29,98%. Com diferença de quase 7 pontos, faltou pouco para Massa levar no 1º turno (bastaria ter mais de 40% e dez pontos sobre Milei).
Milei contava ganhar no 1º turno, mas manteve os mesmos 30% de quando liderou as primárias de agosto. Ele imaginava que nesta 2ª feira, com sua vitória, o dólar blue (o paralelo da Argentina) dispararia, com sua proposta de adotar o dólar como moeda nacional em lugar do peso e acabar com o Banco Central de La República Argentina. Mas o dólar blue, que chegou a passar de 1.000 pesos no meio da semana passada, e recuou na véspera da eleição, ficou estável a 900 pesos, e o dólar oficial subiu apenas 0,33%, a 368 pesos. A crise que não se agravou na Argentina trouxe alívio ao dólar no Brasil.
Massa e Milei vão se enfrentar no 2º turno em 19 de novembro. No domingo anterior, 12 de novembro, haverá o grande debate entre os dois pela TV, quando se espera que os que não votaram nos dois exerçam sua preferência. Uma das surpresas do esvaziamento da candidata Patrícia Bullrich, do “Juntos pela Mudança”, que contava com o apoio inicial do ex-presidente Maurício Macri. Massa, que ganhou mais de sete pontos em relação às primárias, espera absorver parte dos eleitores influenciados por Macri.
É o que insinua o site do “Âmbito Financiero”, publicação especializada em economia e política, que atribuiu o esvaziamento da candidatura de Bullrich, que fora a ministra da Segurança do governo Macri, a manobras de bastidores do ex-presidente, carreando apoio a Massa. A versão é tanto mais estranha quando, em setembro, Massa e Macri trocaram fortes acusações sobre a responsabilidade na crise econômica do país. Quem entende “los hermanos”?
A força da Grã-Buenos Aires
Pelos mapas eleitorais das diversas províncias argentinas, percebe-se que a a surpreendente vitória de Massa veio da força do peronismo na Província de Buenos Aires, que concentra quase 40% dos eleitores do país. Massa teve 43% dos votos da região, em parte pela reeleição do governador Axel Kicillof (45%), também peronista, contra apenas 25,7% de Javier Milei.
O candidato ultradireitista da União pela Pátria, que teve apoio ostensivo da família Bolsonaro, com a presença do deputado Eduardo Bolsonaro (retirado do ar numa entrevista à TV quando pregava a liberação de armas no país). Ganhou nas províncias de Santa Fé, onde fica Rosário (por 32,5% a 29,7%), em Córdoba (por 33,5% a 29%) e em Mendoza, (42,25%), onde Massa teve o pior desempenho, ficando atrás dos 25,85% de Bullrich, com apenas 23,58%. Vale lembrar que 69 deputados brasileiros (56 dos quais do PL de Jair e Eduardo Bolsonaro) subscreveram carta de apoio a Milei.
Além do passa-fora na TV, reforçado por críticas dos jornalistas da C5N ao pai, Jair Bolsonaro, “em boa hora tirado do poder no Brasil”, um trio de publicitários que já participara da campanha de Lula atuou em apoio a Massa, depois do inesperado revés em agosto, e conseguiu virar o jogo. Uma das táticas explorada por Massa foi bater na proposta de mudar o regime cambial, apontado como as portas do caos para a Argentina.
O país tem pequena escala industrial e enfrenta forte seca que derrubou a produção e as exportações agrícolas, alimentando a inflação. Esta deu um salto em agosto após a desvalorização de 32% do peso, exigido pelo FMI para liberar crédito de US$ 7,5 bilhões. A inflação chegou a quase 140%, e Massa (ministro da Economia) diz que tudo começou quando o governo Macri se rendeu ao Fundo Monetário Internacional, que passou a “governar a economia”.
Focus confirma IPCA dentro do teto
No Brasil, a pesquisa Focus, concluída 6ª feira, sem que todos os agentes financeiros precificassem o impacto da redução de 4,1% no preço da gasolina e a lata de 6,6% no litro da gasolina vendido às distribuidoras nas refinarias da Petrobras, a partir de sábado (21 de outubro), houve nova redução nas previsões do IPCA em dezembro: a mediana das respostas de 152 instituições financeiras, consultorias e institutos de pesquisa reduziu a taxa dos 4,75% da semana anterior para 4,65% (e a mediana das 113 respostas dos últimos cinco dias úteis caiu para 4,60%). O teto da meta é de 4,75% (3,25% de IPCA+1,50% de tolerância). Há um mês, o mercado previa 4,86%.
Para 2024, o mercado reduziu a projeção do IPCA de 3,88% para 3,87% (3,85% nos últimos 5 dias). Também dentro do teto da meta (3,00% de IPCA+ tolerância de 1,50%=4,50%). Um dos fatores de baixa das apostas foi a revisão nas projeções dos reajustes de preços administrados, com forte influência da gasolina e demais combustíveis. Caiu de 10,18% este ano para 9,68% (sendo 9,60% nas apostas dos últimos cinco dias).
O IPCA 15, que será divulgado na próxima 5ª feira, pode reforçar as convicções do Comitê de Política Monetária do Banco Central, que se reúne na próxima semana (31 de outubro e 1º de novembro) para definir a taxa de novembro (o mercado espera nova baixa de 0,50 ponto percentual, para 12,25% ao ano e sinais para a reunião de 12 e 13 de dezembro e o começo de 2024. O mercado prevê a Selic caindo a 11,75% em 2023 e a 9% em 2024.
O mercado está prevendo inflações comportadas em outubro (0,26% a 0,27%), novembro (0,29% a 0,30%) e dezembro (0,51%). O que mais deve agitar o mercado nesta e até a próxima reunião de dezembro é a indicação antecipada dos substitutos da diretora da Área Internacional, Fernanda Guardado, e do diretor de Cidadania e Relacionamento, Maurício Costa Moura.
Os mandatos vencem em 31 de dezembro de 2023, mas o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, quer antecipar a indicação para que o recesso do Congresso na 2ª quinzena de dezembro e em janeiro não deixe os dois cargos vagos, como ocorreu no fim do mandato de Bruno Serra (28 de fevereiro), na importante diretoria de Política Monetária, acumulada desde março por Diogo Guillen, diretor de Política Econômica e de perfil mais conservador.
Uma composição do Copom mais afinada com o ministério da Economia, que se faz representar por Gabriel Galípolo na Política Monetária, acelera a redução dos juros. O fato é fundamental para abrir espaço ao crescimento, pedra de toque da política de ajuste fiscal do governo, que depende mais do aumento da arrecadação.
GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)