Grupo onde Daniela Lima trabalha tem o rabo preso com Moro, uma situação equivalente ao que representou o vídeo da festa da cueca para desembargadores do TRF-4
Na entrevista à Globonews, Sergio Moro omitiu fatos e disse algumas inverdades, que poderiam ter sido contrapostas, porém não o foram, e é importante apontar alguns desses pontos e informar a razão pela qual a emissora onde Daniela Lima trabalha tem muita dificuldade de contestar o ex-juiz.
Moro atribuiu a investigação da qual é alvo, no âmbito do Conselho Nacional de Justiça e no Supremo Tribunal Federal, a uma suposta perseguição do governo Lula.
“Esses fatos são de vinte anos atrás (…). Se eu tivesse cometido um crime muito grave lá em 2004, estaria prescrito. Então, por que está se investigando fatos de 2004 e 2006 (…)?”, questiona.
Adiante, Moro relaciona a investigação ao governo Lula.
“Quem agiu de acordo com a lei, quem combateu o crime, quem fez justiça neste país, é agora perseguido politicamente no governo Lula com uma investigação de fatos que são de 2004 a 2005, e concomitantemente se quer investigar no CNJ alguém que sequer mais é juiz. Então, o CNJ, a corregedoria do CNJ não tem competência para isso, mas quer investigar.”
Em poucas palavras, Moro atacou o CNJ e o STF, como se fossem puxadinhos do governo Lula, e não foi confrontado. Mas, se ele quer uma resposta, aí vai. A razão pela qual Moro está sendo investigado é um depoimento de Tony Garcia em 2021, quando Lula nem sequer era candidato a presidente.
No dia 4 de março daquele ano, Tony Garcia foi ouvido pela juíza substituta Gabriela Hardt, na presença da procuradora da república Elena Urbanavicius. Tony contestava o pedido do Ministério Público Federal de rescindir o acordo de delação homologado por Sergio Moro em 2004.
No depoimento, ele revelou ter sido agente infiltrado do então juiz, o que contrariava a lei, e por ordem deste gravado interlocutores com prerrogativa de foro, como o presidente do Tribunal de Contas do Estado, Heinz Georg Herwig.
Também contou que havia levantado informações e realizado gravações que envolviam desembargadores do TRF-4 e ministros do STJ, que Moro não tinha poderes para mandar investigar. Gabriela Hardt e a procuradora Elena Urbanavicius não tomaram nenhuma providência diante de uma notícia-crime.
Dois anos depois é que o depoimento explosivo de Tony Garcia viria a ganhar o encaminhamento devido. Documento obtido com exclusividade dá conta de que o juiz Eduardo Appio determinou a remessa do depoimento para o Supremo Tribunal Federal.
“O embargante (Tony Garcia) relata ter trabalhado inclusive com o auxílio e participação de um agente da Polícia Federal, sendo que sua atuação como infiltrado incluía prestação de contas do que apurava, junto aos senhores Procuradores da República (inclusive Procuradores Regionais, com foro no STJ), bem como ao Exmo Sr. Juiz Federal Sergio Fernando Moro (hoje Senador pelo Paraná)”, escreveu Appio, no despacho que decidiu pela suspensão do processo contra Tony Garcia pelo prazo máximo de um ano e o envio do depoimento ao STF, em razão dos indícios de crime cometidos por Moro.
Três semanas depois, Appio foi afastado do cargo, sem direito à defesa, por decisão da corte administrativa do TRF-4. Gabriela Hardt, que tinha voltado a responder pela 13a. Vara, revogou o despacho de Appio e marcou o julgamento de Tony Garcia, em que ele provavelmente seria preso.
Tony decidiu, então, dar entrevista ao 247, em que denunciou Moro por tê-lo usado como agente infiltrado, e Gabriela Hardt, por não ter tomado nenhuma providência em relação a seu depoimento, o que, em tese, caracteriza crime de prevaricação.
O ministro Dias Toffoli, que herdou de Ricardo Lewandowski as ações relacionadas à operação Spoofing e ao acordo de leniência da Odebrecht, que envolvem Moro, suspendeu as ações contra Tony Garcia e avocou os processos relacionados a ele que tramitam na 13a. Vara.
Também decidiu tomar o depoimento do ex-agente infiltrado de Moro, o que deu início a uma investigação.
De novo: quando a denúncia contra Moro foi feita, em 2021, o presidente era Jair Bolsonaro, de quem o ex-juiz foi aliado. Além disso, a fala de Moro parte do pressuposto de que instituições como o STF e o CNJ estejam a serviço do governo de plantão.
Ao comentar a entrevista de Sergio Moro, Tony Garcia usou termos duros. “O meliante covarde Sergio Moro culpa Lula. Para se defender do indefensável! Acuado por seus crimes, o patife alega desconhecimento sobre o conteúdo de uma conversa de uma hora comigo gravada pela Polícia Federal. Alega prescrição desses crimes”, através da rede X (antigo Twitter).
A dificuldade da Globo em aprofundar as denúncias contra Moro reside no fato de que o ex-juiz tem contra um dos controladores do grupo material explosivo, encontrado em uma operação da Lava Jato.
Em 2016, na operação Triplo X, a Polícia Federal, por ordem de Moro, fez busca e apreensão na filial brasileira do escritório de advocacia Mossak Fonseca, especializado na abertura e manutenção de empresas em paraíso fiscal.
Ao que parece, Moro queria documentos que comprometessem Lula no caso do triplex do Guarujá, mas encontrou papéis que indicavam o uso de uma offshore para comprar e manter outro triplex, o de Paula Marinho, filha de João Roberto Marinho, numa ilha na região de Paraty.
Funcionários da Mossak Fonseca que haviam sido presos foram liberados, e os papéis comprometedores não tiveram andamento. O episódio Mossak Fonseca lembra o da festa da cueca. Moro instruiu Tony Garcia a localizar o vídeo, ao que parece conseguiu, mas não usou nos processos.
Os desembargadores do TRF-4 que participaram da orgia no hotel Bourbon sabiam, no entanto, que o titular da então 2a. Vara Federal em Curitiba tinha o material. Quem não rezou na cartilha dele caiu.
“Na época, vazaram notinhas nos jornais sobre a fita, e teve desembargador que até perdeu o casamento porque, com medo, contou para a mulher, achando que o Moro usaria o material de alguma forma, e ela não perdoou”, diz um antigo funcionário do TRF-4, que acompanhou de perto o caso.
“Pobrezinho… Ele não sabia que Moro não queria usar a fita, mas acuar a todos no TRF-4”, acrescentou.
É bom que a Globo entre no caso de Sergio Moro, e a profundidade da apuração revelará qual o grau de autonomia de seus jornalistas. A entrevista de hoje, com pouco contraponto, pareceu ter sido fruto daqueles acertos por cima.
Ou seja, Moro procurou alguém da cúpula da emissora e exigiu ser ouvido. Daí porque ele poupou explicitamente a repórter e esta tirou o pé do acelerador.
JOAQUIM DE CARVALHO ! BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)