À véspera da divulgação do PIB do 1º trimestre pelo IBGE – as previsões variam de +1,4% a +1,6%, o que levou muitas instituições a aumentaram suas projeções para o ano, que se aproximam de 2% (o dobro das previsões do fim de 2022) -, os dados macroeconômicos de abril e as indicações de nova baixa da inflação em maio e junho deixam o Banco Central em sinuca de bico. A economia e o mercado de trabalho resistem à dose cavalar dos juros reais, que geram forte aumento da inadimplência. Vale a pena manter os juros da Selic?
A reoneração dos impostos de combustíveis, energia elétrica e comunicações (com nova rodada em junho) melhorou as contas públicas, sem acelerar a inflação, como temia o Banco Central. O setor público consolidado teve superávit primário de R$ 20,3 bilhões em abril, acima dos R$ 18,3 bilhões previstos pelo mercado). No mês, as receitas superaram os R$ 166,2 bilhões de 2022, somando R$ 170,1 bilhões. Já as despesas, autorizadas pela PEC da Transição, subiram de R$ 137,2 bilhões em 2022 a R$ 154,5 bilhões em 2023.
O governo tem autorização para um déficit primário (receitas menos despesas, sem contar os custos do giro da dívida) de até R$ 238 bilhões, mas na última revisão de abril elevou a previsão de R$ 107,6 bilhões para R$ 136,2 bilhões. A LCA Consultores, ao fazer a revisão das projeções do ano esta semana, projeta déficit primário de R$ 107 bilhões.
Juros, o X da questão
A questão é que, assim como fustigam as famílias, os juros oneram o Tesouro e travam a economia, freando a arrecadação. Os juros nominais do setor público consolidado somaram R$ 45,8 bilhões em abril, frente a R$ 79,9 bilhões em abril de 2022. Boa parte da redução de R$ 34,1 bilhões nas despesas veio das operações de “swap” cambial do Banco Central, com ganho de R$ 14,2 bilhões em abril de 2023 e perda de R$ 15,4 bilhões em 2022).
Em 12 meses, os juros somaram R$ 659,5 bilhões (6,47% do PIB) em abril de 2023, aumento de R$ 176,1 bilhões sobre os R$ 489,4 bilhões (5,35% do PIB) em 12 meses de abril de 2022. Cada um ponto de alta da Selic onera em R$ 40,5 bilhões a dívida em 12 meses. Em abril, a taxa Selic subiu de 10,75% para 11,75 (e chegou a 13,75% em 3 de agosto). Só esses movimentos geraram aumento de mais de R$ 100 bilhões nos juros da dívida, daí as pressões do Tesouro (pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad) para o Banco Central baixar os juros, reativar o PIB e aliviar as empresas e as famílias endividadas.
Com os juros mais reduzidos, a economia cresceria mais e a arrecadação aumentaria, gerando círculo virtuoso desenhado pelo Arcabouço fiscal. Os dados do crédito de abril, divulgados esta semana pelo Banco Central mostram que o saldo das concessões de crédito caiu 0,9% frente a março e 11,1% em 12 meses, 11º mês de contração. As altas taxas do crédito com recursos a taxas livres encolheram 0,3% essa modalidade, enquanto o crédito direcionado (com juros bem mais brandos) avançou 0,2% no mês.
As pessoas físicas são as maiores tomadoras de crédito bancário no país (grandes empresas captam no exterior, no mercado doméstico de títulos ou emitem ações – opção travada pelos juros altos). Assim, o ônus da política monetária pesa sobre as famílias e o Tesouro. Nos 12 meses findos em abril o crédito cresceu 32,2%, sendo 37,7% para a pessoa física (37,1% em março) e diminuiu à pessoa jurídica (21,3% em abril contra 21,5%). Apesar da Selic estável, os “spread” cobrados às pessoas físicas cresceram, indicando a piora da inadimplência, que chegou a 6,2%, maior nível desde outubro de 2016.
IPCA em revisão para baixo
Os resultados mais suaves da inflação, devido à queda dos preços agrícolas no atacado e à nova política de preços da Petrobras, já se refletem na forte descompressão de custos na cadeia produtiva doméstica, que tem provocado moderação nos preços de bens vendidos no varejo. A LCA já revisou de 5,9% para 5,7%, a projeção do IPCA de 2023. A projeção para 2024 segue em 4%.
Mas há um dado que ainda exige cautela do Banco Central: o comportamento do mercado de trabalho. Ainda é preciso verificar se o aumento dos contratos com carteira assinada (registrados mês a mês no Caged) são apenas formalização de trabalhos antes exercidos sem carteira, por temor de maior rigor na Justiça do Trabalho no governo Lula X Bolsonaro) ou efetiva expansão do emprego. O Caged de abril, a ser divulgado agora à tarde, tem estatísticas entre a criação sazonal de 112 mil empregos formais a 189 mil (na mediana do mercado). Vale lembrar que em março foram criadas 195 mil novas vagas.
Como há recomposição de salários (o mínimo teve ajuste em 1º de maio, de R$ 1.302 para R$ 1.320), o Comitê de Política Monetária (Copom) coloca essa questão nos fatores de expansão da política fiscal que justificariam cautela em baixar juros. A ministra do Planejamento, Simone Tebet (que participa do Conselho Monetário Nacional com Fernando Haddad e Roberto Campos Neto, do BC), já disse que não há motivo para a Selic não cair em 2 de agosto.
O mercado esperava redução na taxa de desemprego no trimestre fevereiro a abril de 8,8% para 8,7% (ou de 8,4% para 8,3%, com ajuste sazonal), mas os dados do IBGE, divulgados nesta manhã, apontaram taxa de desocupação (8,5%), estável frente ao trimestre de novembro de 2022 a janeiro de 2023 (8,4%) e recuou 2,0 p.p. ante o mesmo trimestre móvel de 2022 (10,5%).
A população desocupada (9,1 milhões de pessoas) também mostrou estabilidade, frente ao trimestre anterior (9,0 milhões) e recuou 19,9% (menos 2,3 milhões de pessoas) no ano. O total de pessoas ocupadas (98,0 milhão) recuou 0,6% (menos 605 mil pessoas) ante o trimestre anterior e cresceu 1,6% (mais 1,5 milhões de pessoas) ante o mesmo trimestre de 2022. O nível da ocupação (percentual de pessoas ocupadas na população em idade de trabalhar), estimado em 56,2%, caiu 0,5 p.p. frente ao trimestre anterior (56,7%) e subiu 0,4% p.p. ante igual trimestre de 2022 (55,8%).
Por fim, o rendimento real habitual, caiu a R$ 2.891, contra R$ 2.894 em março, mas subiu 7,5% (estável) antes os R$ 2.691 de abril de 2022. OU seja, nada fora do lugar.
GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)