A Procuradora Geral da República, Raquel Dodge, deve deixar o cargo em um mês. Depois de trabalhar algum tempo pela recondução à revelia da lista tríplice eleita pela categoria, o que gerou mal estar interno, parece ter percebido que as chances eram próximas de zero. E faz o caminho de volta aos seus. Isso explica a benevolência da chefe do Ministério Público com o procurador Deltan Dallagnol, da Lava Jato, e a contundência do parecer divulgado neste fim de semana pelo arquivamento do inquérito aberto de ofício no STF para apurar ataques virtuais a seus ministros.
No parecer, Raquel elevou o tom a ponto de dizer que o inquérito aberto por Dias Toffoli e relatado por Alexandre Moraes fere a Constituição e que sua existência tornaria o Supremo semelhante a um “tribunal de exceção”. Ela sabe que, com isso, desagrada a suprema Corte do país. Mas, sem recondução no horizonte, espera agradar à própria categoria, na qual continuará atuando. Por isso, não esperem, de Dodge, qualquer apoio a uma possível punição a Dallagnol no Conselho Nacional do Ministério Público.
Apesar disso, são delicadas as circunstâncias do próprio Dallagnol – cujo afastamento da Lava Jato, voluntário ou não, é considerado inevitável – e do ex-juiz e atual ministro da Justiça, Sérgio Moro. Desgastado com a divulgação de seguidos diálogos impróprios pelo site The Intercept e outros veículos, Moro recolheu-se nos últimos dias e amanheceu o domingo na defensiva por conta de mais uma mensagem publicada na Folha mostrando que fez uma palestra paga e não revelada a seus superiores.
Isso, porém, é o de menos. Em processo de desgaste, o ex-juiz enfrenta agora uma forte aliança entre seu chefe, o presidente Jair Bolsonaro, e o presidente do STF no caso Coaf. Com sangue na boca desde que soube, via Intercept, ter sido alvo de investigações de procuradores da Lava Jato, Toffoli aproximou-se de Bolsonaro ao suspender, via liminar, o compartilhamento de informações do Coaf e da Receita pelo Ministério Público sem autorização judicial – beneficiando diretamente o senador Flavio Bolsonaro no caso Queiroz.
O episódio pode ter marcado o divisor de águas na relação de Bolsonaro com Moro, e justamente no momento em que o ex-juiz está mais fragilizado. O presidente não gostou das críticas do presidente do Coaf, Roberto Leonel, à decisão de Toffoli que ajudou seu filho e mandou o ministro Paulo Guedes – em cuja pasta agora se abriga o órgão – demiti-lo. Se isso se confirmar, será talvez a maior desfeita a Moro ao longo desses sete meses em que não foram poucos os revezes, já que Leonel, ex-Lava Jato, foi escolha sua e é homem se sua confiança.
A situação de Moro pode piorar ainda mais se levarmos em conta outras circunstâncias, as do próprio STF, onde a ala garantista pode, a esta altura, formar maioria contra decisÕes da Lava Jato depois que ministros foram citados em suas conversas impróprias. Nada como ver os seus na chapa quente para resolver reagir.
HELENA CHAGAS ” BLOG OS DIVERGENTES” ( BRASIL)