CAMPOS NETO TEME O MERCADO, NÃO O PT

Vamos a algumas interpretações errôneas de análise.

Não é possível acreditar em teoria que defina como taxa de juros neutra uma taxa de juros real que inviabiliza toda a economia

Na Coluna Econômica de ontem alertei que o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, estava perdendo sustentação junto aos bancos e ao mercado. A manutenção da Selic em 13,75% está desestruturando todo o mercado de crédito e arrasando o mercado de capitais, provocando movimentos violentos de alocação de carteiras.

Mercado e bancos são a sustentação psicológica de um presidente de Banco Central exemplarmente medíocre.

Hoje, o Estadão diz que Campos Neto elogiou o novo arcabouço fiscal por pressão do PT. Como assim? O PT é contra o arcabouço e, mesmo assim, não conseguiu demover Fernando Haddad, um Ministro do próprio PT.

A afirmação de Campos Neto foi feita em um evento do Bradesco. Recentemente, um dos grandes bancos de investimento, padrinho da sua indicação ao BC, alertou para o desmanche do sistema de crédito.

Por todos os lados, começam a pipocar artigos de pessoas do mercado com críticas ao exagero das taxas, 8% acima da inflação. Aliás, a mesma “taxa de juros neutra” acenada por Pérsio Arida anos atrás, quando ganhou o título de Economista do Ano do Conselho Regional de Economia de São Paulo.

Por “taxa de juros neutra” entenda-se um suposto nível da taxa de juros no qual todos os preços se acomodem e cesse a inflação.

Antes de ontem, Campos Neto afirmou que, para atingir a meta de inflação, a Selic deveria estar em 26%. Ontem, aceita o arcabouço fiscal. Mostra duas coisas. Primeiro, a extraordinária mediocridade de um presidente de BC que não consegue sequer enxergar uma crise sistêmica à vista, provocada por ele próprio.

Depois, a repetição de um erro às avessas. Para ajudar Paulo Guedes, jogou a Selic a 2% ao ano. O resultado foi uma fuga de dólares que provocou uma maxidesvalorização que, somada à guerra da Ucrânia, e ao aumento dos preços dos alimentos e energia, trouxe a inflação de volta ao país.

Agora, tenta o caminho oposto, ambos errados.

No seu entorno, na diretoria do BC, existem técnicos especializados na tal metas inflacionárias e na barafunda de cálculos matemáticos introjetados no modelo. Aliás, dia desses provoquei no Twitter um ex-diretor do Banco Central – de bom nível, aliás – e fui abordado por um cabeça de planilha do mercado que me questionou: qual o seu modelo? E soltou gráficos mostrando que ele tinha seu próprio modelo baseado na ciência das metas inflacionárias.

Será que não é hora dos bravos economistas brasileiros, especialmente os ortodoxos, pararem de tratar as metas inflacionárias como bezerro de ouro e questionar sua capacidade de monitorar a realidade?

Taxa de juros real de 8% ao ano é disfuncional em qualquer economia. Não é possível acreditar em uma teoria que defina como taxa de juros neutra uma taxa de juros real que inviabiliza toda a economia. Ou, como diz o neto medíocre do gênio, exija 26% de Selic para trazer a inflação para a meta.

Assim como não é possível acreditar em uma teoria que trate um dos preços essenciais da economia – o câmbio – como fator de ajuste.

Desde a introdução das metas inflacionárias, o jogo é o mesmo:

  1. Para combater a inflação, aumenta-se a taxa de juros, de modo desproporcional em relação às taxas de juros internacionais.
  2. O mercado contrata empréstimos externos a taxas baratas, internaliza os dólares, troca por reais e aplica em títulos públicos brasileiro.
  3. À medida que mais dólares vão entrando, mais o real vai se valorizando, atrapalhando todos os projetos industriais e comprometendo a balança comercial. O mercado ganha nas taxas internas e na valorização do real (porque real valoriozado permite adquirir mais dólares que na entrada).
  4. Quando a situação fica insustentável, há uma fuga de dólares do país, provocando uma maxidesvalorização, que traz a inflação de volta.
  5. A maxi reduz a vulnerabilidade externa e provoca aumento de juros. Com isso, os capitais voltam depressa, iniciando novo ciclo de taxas elevadas e de apreciação do câmbio.
  6. E nenhuma multinacional do setor produtivo vai investir em produção brasileira, sem um mínimo de previsibilidade sobre o câmbio, porque a projeção do seu lucro consiste em estimar o lucro em reais e, depois, o lucro em dólares remetidos à matriz.

Reside nessa armadilha o maior fator de estagnação da economia brasileira. E o tal arcabouço fiscal apenas remenda o desastre que foi a Lei do Teto.

LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)

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