AS AMERICANAS E O BBB ( BIG BANG BANCÁRIO)

CHARGE DE MIGUEL PAIVA

A 23ª edição do Big Brother Brasil (BBB) estreou ontem com várias desistências de última hora, por motivos vários. Mas a mais ruidosa foi a do patrocinador master, a brasileira Americanas, que já tinha várias provas dinâmicas de marketing programadas. Para não perder uma cota de mais de R$ 100 milhões, a Rede Globo negociou rápido com a argentina Mercado Livre, a maior empresa da América Latina, que fará marketing no BBB.

Mas enquanto telespectadores curiosos – alguns deles viciados – seguem a atração, os analistas do mercado de capitais escarafuncham os balanços dos bancos para identificar quais os credores que poderão ser mais prejudicados com a solução da Americanas para cobrir o rombo não contabilizado de um mínimo de R$ 20 bilhões do crédito de risco sacado que deveriam ser lançados nas contas a pagar (passivo) com fornecedores pessoas jurídicas.

Conforme denunciou há uma semana o CEO da Americanas, Sérgio Rial, ex-presidente do Santander Brasil (que renunciou três dias depois da função de gestor do “imbroglio” junto aos bancos credores, em princípio), a empresa pagava fornecedores com crédito bancário, mas não reconhecia essas transações como dívida no balanço. As dívidas somavam em setembro R$ 19,7 bilhões, mas Rial apontou valor real mínimo adicional de mais R$ 20 bilhões.

Além de fraude bilionária interna, que vinha sendo rolada há anos, é inacreditável como os auditores da PWC não detectaram a manobra e consideram os balanços em conformidade. Parece claro que os alertas feitos pela Comissão de Valores Mobiliários, em 2016, sobre as apropriações de custos nas operações entre empresas varejistas e fornecedores, com intermediação bancária, eram procedentes. Quem sabe as normas contábeis tenham que ser revistas com maior transparência às normas do IASB e o CPC, e seguidas, principalmente, pelas empresas de auditoria?

O impacto do problema

No último balanço conhecido (3º trimestre de 2022) o total de contas a pagar com fornecedor era de apenas R$ 5,0 bilhões (passivo), bem menor que o rombo de R$ 20 bilhões. A conta estoque (ativo) era de apenas R$ 5,77 bilhões, aderente à conta fornecedor. A situação indica que a mecânica da empresa era pagar fornecedores com crédito e baixar da conta fornecedores e estoque.

Após o 1º tombo de mais de 77% nas ações da Americanas, na reabertura dos negócios com os papéis da empresa, semana passada, os analistas e gestores de carteiras e de fundos de investimento não se debruçam apenas sobre os balanços dos bancos que podem ser afetados com um pedido de recuperação judicial, por exemplo, mas com a possibilidade de as empresas concorrentes do comércio varejista repetirem a maquiagem. Isso porque se o setor de comércio segue atrativo, é preciso evitar cair em nova cilada.

Não se sabe a solução que os três principais acionistas da Americanas, o trio controlador da 3G Capital, Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, adotarão para reforçar o capital da empresa, com a duplicação do endividamento. Na reunião com os bancos credores semana passada, quando ainda representava as Americanas, Rial ouviu a exigência de aporte mínimo de R$ 10 bilhões.

Diante da pressão dos bancos, que desejam suspender o fluxo de crédito à empresa enquanto não se decidir seu futuro a Americanas recorreu à Justiça para bloquear a execução de ativos e depósitos (o BTG quis confiscar depósito de R$ 1,2 bilhão em garantia). Mesmo com aporte de capital (cujo montante depende do que for levantado na auditoria da PWC (desta vez com lupa ampliada) não está descartada a hipótese de pedido de Recuperação Judicial.

O analista do setor financeiro da Genial Investimentos, Wagner Biondo, fez um levantamento dos bancos credores da Americanas. Entre os bancos que têm ações negociadas da B3 estão o Santander, Bradesco, Itaú, Banco do Brasil e BTG-Pactual. São ainda credores a Caixa Econômica Federal, o Banco Safra, o Daycoval, Banco ABC e o BV.

Wagner Biondo estima que em caso de RJ da Americanas, os bancos deveriam fazer uma provisão de 30% em relação ao total de exposição ao crédito concentrados no 1º trimestre deste ano. Levando em consideração 100% de impacto sobre o lucro (após impostos), o impacto nos bancos seria uma redução média nos lucros de -15,5% nos últimos 12 meses.

Mas a conta seria desigual. Os com ações em bolsa que têm as maiores exposições no segmento varejo/comércio em relação ao total de crédito estão: BTG Pactual (6,7%), Bradesco (5,9%), Itaú (3,7%) e Santander (3,1%). O BB tinha 1,9%. Já as exposições do Safra e do Daycoval no varejo/comércio são bem maiores: 11,8% e 18,4%, respectivamente.

GILBERTO DE MENEZES CÕRTES ” JORNAL DO BRASIL)

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