A COPA DE MESSI E MBAPEÉ SEM PELÉ

CHARGE DE MIGUEL PAIVA

O futebol, como sabemos, foi inventado na Inglaterra. Poucos se dão conta, porém, que a cobiçada bola de futebol, o velho e bom balão de couro, objeto de encanto em todo o planeta desde o século passado, levou muito mais tempo para cruzar os 33 quilômetros do Canal da Mancha, entre a Inglaterra e a França, do que perfazer a distância de quase sete mil quilômetros do imperial porto de Southampton, no Sul da Inglaterra, à deslumbrante Buenos Aires às margens do Rio da Prata.

O primeiro Campeonato Inglês foi disputado em 1888, sagrando-se ganhador o Preston North End, cidade ao centro do país. Apenas cinco anos depois, em 1893, foi criado o certame argentino, já organizado pela legendária AFA (Asociación del Fútbol Argentino) – saindo vitorioso o Lomas Athletic Club, de Lomas de Zamora, um dos subúrbios da metrópole portenha.

A Federação Francesa de Futebol só seria formada em 1919 e promoveria, 13 anos mais tarde, em 1932, o campeonato nacional, vencido pelo Olympique Lillois, de Lille, ao Norte da França. O nobre e viril esporte bretão, nascido disciplinado e impetuoso nos relvados da Velha Albion, se transformaria quase em uma obra de arte, no Novo Mundo, graças ao fascínio dos craques que proliferaram notadamente, em Buenos Aires e Montevidéu. Assim como, nas primeiras décadas do século XX, no Rio de Janeiro, com Fluminense e Botafogo, e em São Paulo, com Paulistano e SPAC (São Paulo Athletic Club) – que participam, atualmente, de torneios amadores.  

E foi nesse universo mágico, ao Sul das Américas, onde surgiu, em 1957, no Santos e na Seleção Brasileira, o maior gênio do futebol, Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, único jogador a ganhar três copas do mundo, e que nos deixou no último dia 29 de dezembro, em São Paulo, aos 82 anos. Faleceria 11 dias após a eletrizante final do mundial, protagonizada, justamente, por Argentina e França, no Qatar, na região dos Emirados Árabes, quando a seleção do extraordinário Messi sagrou-se campeã, pela terceira vez, ao empatar por 3 a 3 e, nos pênaltis, vencer por 4 a 2.

Se é verdade que a bola demorou mais para atravessar o Canal da Mancha do que desembarcar em Buenos Aires, é igualmente legítimo reconhecer a França como a grande propulsora da FIFA. Não podemos esquecer, inclusive, que o venerável francês Jules Rimet (1873 – 1956), quando Presidente da entidade (de 1921 a 1954), criou a Coupe du Monde, tomando a ousada decisão de levar ao Rio da Prata a primeira edição, disputada em Montevidéu – conquistada pela arrebatadora Celeste Olímpica. O gesto de Rimet representou uma homenagem aos indomáveis uruguaios, bicampeões olímpicos, em 1924 (em Paris) e 1928 (em Amsterdam) – numa época em que a competição era equivalente à Copa do Mundo.

Devemos ainda aos franceses o apropriado título que Pelé passou a ostentar a partir de 1958 – de Le Roi, ou seja O Rei. A denominação foi cunhada pelos atentos e talentosos cronistas da prestigiosa revista bissemanal “France Football”, publicada em Paris. Os franceses, desde então, foram os maiores admiradores de Pelé na Europa. “France Football”, aliás, também idealizaria, em 1955, da Copa Europeia dos Campeões – a Champions League.     

O mundo começou a perder o incomparável Pelé dos gramados, em 1974, quando encerrou a carreira no Santos – prolongada, posteriormente, no New York Cosmos, de 1975 a 1977, atuando ao lado de craques europeus como o alemão Franz Beckenbauer e o italiano Giorgio Chinaglia. Embora afastado dos campos há 45 anos, o desaparecimento agora de Le Roi torna mais triste e pobre o esporte cujas estrelas, no Mundial do Qatar, foram o argentino Messi e o francês Mbappé. Ambos, em alguns momentos, lembram a magia e a genialidade do Rei. 

ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)

Albino Castro é jornalista e historiador

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