ANTÔNIO CARLOS DE ALMEIDA CASTRO
29.jul.2019 (segunda-feira) – 12h24
atualizado: 29.jul.2019 (segunda-feira) – 13h00
Tem crescido na advocacia, na sociedade civil organizada e em vários outros grupos um sentimento de que o impeachment é uma necessidade frente aos inúmeros desmandos, à inaptidão, e à falta de respeito não só com a Constituição, mas com a moralidade pública do presidente Bolsonaro e de seu grupo mais próximo que está governando o Brasil.
“De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto.”
Rui Barbosa
Bolsonaro se apegou firmemente a um juiz que contribuiu com sua eleição, tendo auxiliado de forma definitiva ao condenar seu principal opositor. Esse juiz teve a desfaçatez de assumir o Ministério da Justiça, considerado por muitos como o principal ministério de um governo democrático. Para ele, não se tratava de um cargo político, mas de uma missão, a qual só pode ser compreendida a partir de sua perspectiva pessoal, segundo a qual ele sente como se fosse ungido para ser o próximo presidente da República. Mostra-se evidente que ele trabalhou muito para isso, vamos convir.
Os recentes desvendamentos de mensagens enviadas por esse juiz, hoje Ministro, demonstram aquilo que muitos sempre disseram –que, na verdade, o verdadeiro chefe da força-tarefa da Lava Jato sempre foi Sergio Moro. É desconcertante para o Poder Judiciário, e até desmoralizante, eu diria.
Penso que um Poder Judiciário independente, que pretende ser um Poder sério, tem que estar absolutamente envergonhado da postura desse juiz que, até muito pouco tempo atrás, falava, de forma pretensiosa, em nome do Judiciário. Era como se ele fosse o próprio Poder Judiciário. Um juiz de primeira instância que posava com certa empáfia de uma importância que descobrimos ser advinda de uma relação espúria com parte do Ministério Público e parte da Polícia Federal.
O governo Bolsonaro, em 6 meses, conseguiu envergonhar o Brasil em diversos momentos frente aos olhos de qualquer nação civilizada, e frente aos olhos das pessoas que tem uma capacidade mínima para fazer uma análise crítica do que estamos vivendo. É absolutamente óbvio que ele é inepto. Talvez não tenha ele a dimensão do que é o cargo da Presidência da República, tendo conseguido fazer, em tão pouco tempo, uma série de movimentos e ações que constrangeram o Brasil em todos os fóruns internacionais.
Jair Bolsonaro virou uma piada nacional e internacional. É interessante porque, talvez, como ele não tenha percepção exata do cargo que ele ocupa ele não tenha a capacidade de avaliar o que está fazendo ao expor ao Brasil ao ridículo. Nem ele, nem seus filhos, nem o pessoal mais chegado a ele. Então, não tenhamos a ilusão, não será por sentir vergonha do ridículo ao qual estamos sendo submetidos que esse governo tomará qualquer atitude digna para reconhecer a necessidade de mudar de rumo. Quem não tem a noção do ridículo não se sente ridículo e não sabe o mal que está fazendo ao Brasil.
De uma forma mais objetiva, o que o governo Bolsonaro faz com o desmantelamento da saúde e da educação, bem como com o enfrentamento bizarro da questão da segurança pública é algo que impressiona qualquer pessoa com um pingo de lucidez, seja de direita, seja de esquerda. Ministros caricatos, inteiramente incultos e alheios à realidade nacional com o objetivo único de fazer uma campanha de retrocesso dos avanços que foram alcançados nos últimos anos. Algo pueril, se não fosse criminoso.
A indicação de seu filho, o “fritador de hambúrguer”, para a Embaixada do Brasil em Washington é algo que definitivamente ninguém acreditou que ele teria a coragem de levar adiante. Mas ele levará, pois, conforme adiantado, o presidente não tem qualquer noção do ridículo. O governo perdeu a noção do ridículo. Desculpe, nunca teve. Essa nomeação significa claramente a entrega da Amazônia e das terras indígenas aos americanos. Ele foi sincero durante a campanha, assumiu que era homofóbico, assumiu que era racista e que apoiava a tortura. Hoje, apenas está colocando em prática o que prometeu. A responsabilidade é das 57 milhões de pessoas que o elegeram.
E a gravidade da situação vai se delineando quando o governo começa a desmantelar as diversas organizações da sociedade como um todo. Aquilo que é óbvio, a ignorância ridícula e engraçada –incorporada no ministro da Educação, na ministra que virou motivo de chacota nacional, na indicação de um filho despreparado para assumir a embaixada nos EUA, na afronta diária que ele faz aos militares com uma arrogância e prepotência de um capitão que é claramente um militar frustrado por não ter chegado ao generalato, e, no entanto, ser hoje o Comandante das Forças Armadas, e no desprezo que ele tem com os militares– já seria o suficiente para demonstrar a fragilidade do momento.
Entretanto, há coisas muito mais graves. O destempero do presidente com a imprensa nacional e internacional, a vontade deliberada de vender a Amazônia, a agressividade vulgar dele com Felipe Santa Cruz, presidente da OAB. Esses e tantos outros disparates levam a uma convicção de que ele não tem nenhuma condição de exercer a Presidência. Precisamos desmacará-lo. Derrotá-lo na sua soberba e ignorância. Só assim ele e seus seguidores não sairão como vítimas no retrato da história
Hoje eu entendo que o mais crítico é que a sociedade civil tem que enfrentar com maturidade o momento que vivemos. Quando houve a insurreição contra o governo Dilma, que era um governo com o qual não concordava na maioria das vezes, não havia qualquer motivo para que o impeachment fosse levado às últimas consequências. Aquilo foi, e penso que ninguém mais tem dúvida, um golpe contra a Constituição, um golpe contra o povo brasileiro.
Imagino, neste momento, o arrependimento dos Aécios, dos Temers e dos Eduardos Cunhas da vida. Tínhamos que ter dado seguimento natural ao momento democrático que vivíamos, mas houve uma opção pelo golpe e por afastar o sistema democrático e as garantias constitucionais.
Em muito pouco tempo a história está dando a resposta ao golpe. Tenho para mim que a solução não pode ser mais um golpe. O impeachment não pode ser o instrumento do Congresso Nacional para um momento de caos governamental, administrativo e institucional. Devem sempre ser seguidos rigorosamente os critérios constitucionais para o impeachment. Caso o senhor Jair Bolsonaro seja declarado inimputável, poderemos ter uma discussão acerca das consequências da inimputabilidade.
Entretanto, não há motivos para que o Congresso Nacional decrete o impeachment de um presidente incompetente. É bom para o país que ele governe os 4 anos, é bom que os 57 milhões de eleitores tenham a dimensão do que fizeram, do fosso que se criou entre a civilização e a barbárie. Três anos e meio pode ser muito para mim que já estou com 61 anos de idade e terei que conviver com a mediocridade, com o escárnio e com o descaso, mas certamente é muito pouco para a consolidação de um sistema constitucional democrático do país que amo.
ANTÔNIO CARELOS DE ALMEIDA CASTRO ” BLOG PODER 360″ ( BRASIL)
Antônio Carlos de Almeida Castro
Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, tem 61 anos. Nasceu em Patos de Minas (MG) e cursou direito na UnB, em Brasília. É advogado criminal.