“O quadro descrito por Washington na delegacia faz lembrar em muito a estratégia fascista de tomada do poder”, escreve a jornalista
As investigações apenas começaram, mas a julgar pelas primeiras apurações, podemos depreender que existem mais armas, munições e dinheiro envolvido na tentativa de ataque terrorista no sábado (24/12), próximo ao aeroporto internacional de Brasília, do que podem caber na vida do empresário e gerente de posto de gasolina George Washington de Oliveira Souza, 54 anos.
À vera ele tem, segundo apurações do colega jornalista Alceu Castilho, ligação com o transporte de madeira e participação em outros postos de gasolina, além do “Cavalo de Aço”, no qual diz trabalhar.
Só por esse arranque nos trabalhos de levantamento sobre a vida do terrorista, preso na penitenciária da Papuda desde o dia 25, deu para ver que se puxar a linha vai-se constatar que, além do armamento pesado que ele adquiriu por R$ 160 mil, a sustentar os seus planos, como bem observou o futuro ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (PSB) havia “gente poderosa financiando. E, chamando os nossos comerciais, aqui, não custa lembrar: agro é tech, agro é pop.
Em depoimento na 1ª Delegacia de Polícia (Asa Sul), ele admitiu a motivação política do crime. E, principalmente, disse que se sentiu motivado pelas palavras de Bolsonaro: “um povo armado, jamais será escravizado”.
O quadro descrito por Washington na delegacia faz lembrar em muito a estratégia fascista de tomada do poder – como na Itália em 1922. Diferente de golpes de Estados clássicos, muito em voga na América Latina nos idos de 1960/1970, e de formação das Ditaduras e Ditaduras Militares, nesse há o componente da “insurreição”.
O modelo tem inspiração nos fascistas empreendedores da “Marcha sobre Roma”, que em final de novembro completou 100 anos. A insurreição visa instalar o caos, não se confundindo com o golpe de Estado (que no entendimento clássico de uma instituição do próprio Estado, se subleva contra a ordem constitucional, como se deu com os militares em 1964 no Brasil).
Tal como descreveu em seu depoimento, o que o bolsonarista pretendia era gerar o caos, para forçar a chamada de uma ação de “Garantia da Lei e da Ordem” – GLO -, o que forçaria a instalação de um “estado de sítio”, levando, talvez, ao adiamento da posse do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva.
Os fascistas trabalham para a desordem e descrédito da ordem constitucional, atacando a Constituição e seus garantidores: a Suprema Corte ou a legislação; ou a forma de organização eleitoral, como Donald Trump em 2020. No Brasil Bolsonaro fez de um tudo para repetir a fórmula, não levando em conta que de tanto “ensaiar”, seus movimentos foram acompanhados sem surpresa, mas com muita atenção pelos responsáveis pela eleição e os seus desdobramentos, sendo possível aplicar medidas preventivas contra eles.
No modelo dos fascistas há o incentivo à violência, a fim de dividir a sociedade entre Nós e Eles, bons e maus, patriotas e traidores, utilizando-se de uma “novilíngua” que não dialoga, apenas classifica os indivíduos. Através de campanhas de medo atacam instituições, partidos e pessoas, não se detendo perante a possibilidade real de derramamento de sangue, e até mesmo o considerando bem-vindo, pois geraria “mártires” para a causa.
O objetivo desse atentado, como descreveu Washington, para a Polícia, era gerar o aumento da violência política buscando paralisar o país. No caso dos fascistas, através da ocupação de ferrovias, rodovias, praças e prédios públicos, como fizeram os “Camisas Negras” de Mussolini ou as SAs hitleristas e, claro, contando com o apoio das Forças Armadas. Em nosso caso, elas estão se fazendo de mortas, entrando apenas com a conivência de ceder vagas nos estacionamentos nas imediações dos quartéis, por exemplo, para os carros dos “acampados”, ou deixando montadas as estruturas de banheiros químicos e barracas –, quando tinham não só o direito, mas também o dever de as retirar, solicitando a ação da prefeitura, que acionaria a Polícia estadual para agir nesse sentido.
Na ação em si, ou seja, a instalação do caos, o Washington estava certo de que contaria com agentes das Forças Armadas também na quebra de hierarquia e da disciplina, o que levaria o Estado Democrático de Direito ao Colapso. Daí, desse caos, costuma emergir a figura do “homem providencial”, o único apto a comandar a “regeneração” da Nação e a quem todos devem obediência. Ele é o Führer, o Duce, o Conductur, o Generalíssimo, em suma o “mito” que agrega o conjunto das Direitas, ultrapassadas pelo caráter massivo e “popular” do fascismo. Aqui – que Deus nos livre e guarde! – entraria em cena Bolsonaro, o “autor intelectual” do caos promovido a partir de um atentado detonador.
O bolsonarista que tentou explodir a bomba na área do Aeroporto Internacional de Brasília usou explosivos oriundos de garimpos e pedreiras no Pará. Veio de lá para participar dos atos em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília.
No fascismo, simultaneamente são intensificados os atos de agressão contra todos os políticos, apontados como corruptos e impatrióticos, incapazes de apresentar soluções aos problemas imediatos. “Ele” exige sacrifícios, a renúncia aos Direitos Civis em nome da ordem e da “Liberdade” (essa entendida como um direito negativo, ou seja, o “direito” de não se submeter ao Estado de Direito). Assim, num clima de violência e terror, multiplicando atos de ocupações, agressões e desobediência em massa, querem a intervenção das “forças da ordem” (que eles mesmos desafiaram!), para regenerar a Nação. Foi assim a “Insurreição dos ricos” em La Paz em 2019, abrindo espaço para os comandantes militares – justificados pelo caos social. Com eles instalaram um governo inconstitucional.
Agora, como no Capitólio, em La Paz ou no ensaio feito quando policiais em greve promoveram a paralisia do Estado do Ceará, estamos perante de uma técnica de Insurreição. A imposição da Lei no âmbito do Estado de Democrático de Direito encontra-se sob sério risco perante as novas práticas, inspiradas nos modelos clássicos dos fascistas. Ainda bem que o futuro ministro da Justiça, Flávio Dino, não esperou ser empossado para agir. Ao contrário de José Múcio, da Defesa, que só hoje entrou em cena para “dialogar” com o Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, ainda ministro da pasta, identificado com Bolsonaro. Tomara que consiga, pelo menos, a promessa de retirada do entulho verde e amarelo da frente dos quartéis.
DENISE REIS ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)