A VIRGEM DE COPACABANA

O mais famoso dos bairros brasileiros, conhecido no mundo inteiro, é, sem dúvida, Copacabana, cuja praia, com o mesmo nome, é um dos marcos da beleza do Rio de Janeiro. Um símbolo tão forte quanto o Cristo Redentor e o Pão de Açúcar. Nada parece representar melhor o espírito da metrópole do que a querida Copacabana. Porém, ao contrário do que a maioria imagina, o bairro não é exatamente um carioca da gema.

Copacabana é a cidade boliviana, no Lago Titicaca, na qual, no século XVI, a Virgem Maria apareceu aos incas. E, por isso, ganhou o título de Nossa Senhora de Copacabana. Os milagres atribuídos a ela foram difundidos no continente e um devoto português, dois séculos depois, ao passar pela Bolívia, encantou-se com o poder da Padroeira do Titicaca e trouxe para o Rio de Janeiro uma imagem abençoada. O português, com a ajuda do alto clero lusitano da Arquidiocese do Rio de Janeiro, bem como de compatriotas, conseguiu erguer uma igrejinha no rochedo que separa Copacabana de Ipanema.

Era frequentada pelos pescadores que, ainda hoje, à altura do Posto 6, vendem peixes frescos. Originou-se, assim, a denominação da Praia de Copacabana. O santuário dedicado à Virgem não existe mais. Acabaria sendo demolido, no início do século passado, para a construção do Forte de Copacabana. Continua, entretanto, venerada pelos cariocas e dá nome à sua Igreja matriz, à Rua Hilário de Gouveia, justamente na esquina com a longa avenida, que atravessa o bairro, batizada de Nossa Senhora de Copacabana.  

A localidade, contudo, não se tornou famosa no planeta pelo fervor à Virgem. Mas, sim, para além da esplêndida praia estendida por quatro quilômetros, pela intensa vida mundana que marcaria Copacabana durante o último século – com inúmeros personagens e moradores. O próprio Walt Disney (1901 – 1966), magistral diretor cinematográfico americano, inspirou-se na dolce vita em torno do monumental Hotel Copacabana Palace, onde esteve hospedado, em 1941, ao criar o Zé Carioca, uma de suas legendárias figuras, para contracenar com o Pato Donald.

A mesma Copacabana seria o cenário ideal para a cantora portuguesa Carmen Miranda (1909 – 1955), nascida na região do Porto, radicada no Rio de Janeiro, que, com trejeitos e balangandãs, se transformaria em uma das estrelas de Hollywood, entre os anos 1930 e 1940, e um dos ícones da cultura do Brasil – influenciando, no final da década de 1960, o movimento da Tropicália liderado pelos compositores baianos Caetano Veloso e Gilberto Gil. O maior dos poetas brasileiros do século XX, o mineiro Carlos Drummond de Andrade (1902 – 1987), morou grande parte da vida no bairro, e era comum vê-lo caminhando pelas ruas Conselheiro Lafayete e Bulhões de Carvalho, no Posto Seis – quase sempre ligeiramente cabisbaixo. Eram copacabanenses de corpo e alma os integrantes do Clube dos Cafajestes, um grupo de boêmios arruaceiros – do qual era membro e ativista o mineiro Heleno de Freitas (1920 – 1959), extraordinário centroavante do Botafogo.  

Surgiria também, nos anos 1950, nos salões do Copacabana Palace, o colunismo social no País – símbolo perfeito da mundanidade nacional. O precursor foi o jornalista Jacinto de Thormes, pseudônimo do carioca Maneco Muller (1923 – 2005), na “Última Hora”, seguido, pouco depois, por outro carioca, Ibrahim Sued (1924 – 1995), no concorrente “O Globo”. O colunismo se multiplicaria rapidamente em todo o Brasil e consagraria o bairro banhado pelo Atlântico que recebeu o nome da Virgem do Lago Titicaca.                       

ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)

Albino Castro é jornalista e historiador

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