“Juntos, o bolsonarismo e a direita fisiológica agrupada no Centrão terão a maioria absoluta da Câmara”, conclui a jornalista Tereza Cruvinel
Vimos todos que o bolsonarismo é maior do que o imaginado e o mensurado pelos institutos de pesquisa. Que a vitória de Bolsonaro em 2018 não foi fenômeno sazonal produzido pela demonização da política e o antilulopetismo, filhos da Lava Jato. O resultado do primeiro turno nos mostra também que o bolsonarismo entranhou-se e deitou raízes mais fundas na sociedade brasileira, e que agora chegou ao Congresso a polarização entre a esquerda e a extrema direita, reduzindo a força da direita fisiológica, que de resto continuará servindo a Bolsonaro, na hipótese tenebrosa de sua reeleição.
Os institutos não erraram ao projetar a votação de Lula. Erraram ao mensurar a força do bolsonarismo. Erraram feio no Sudeste, onde Lula liderava, embora com vantagem não muito grande, nas pesquisas da véspera do pleito. Foi o Sudeste que levou Bolsonaro ao segundo turno, pois a vantagem no Sul e Norte-Centro-Oeste já era conhecida. Ele ganhou em São Paulo com 47,75 contra 40,8 de Lula. Teve 51% no Estado do Rio contra 40,6 de Lula. E em Minas, onde o ex-presidente manteve sempre uma dianteira de 10 pontos percentuais, em média, a vantagem acabou reduzida a cinco pontos percentuais: 48,2 a 43,6%. Para confirmar a lenda de que Minas sintetiza o Brasil nas eleições, vale apontar que os dois tiveram lá praticamente o mesmo porcentual de votos que tiveram no país: 48,4 e 43,2.
Se a subestimação do bolsonarismo pelos institutos foi obra de erros metodológicos, da dissimulação dos bolsonaristas envergonhados, ou de algo ainda oculto, hoje não sabemos, mas é certo que as ferramentas falharam ao identificar o enraizamento da extrema-direita. Agora sabemos que ela se instalou.
Lembro-me de Dr. Ulysses Guimarães citar alguém que dizia: “descontente com o Congresso? Então espere a próxima legislatura.” Era óbvio que o orçamento secreto favoreceria a turma do Centrão na eleição legislativa. Mas estamos vendo algo mais peculiar: Se a esquerda ficou praticamente do mesmo tamanho, quem se fortaleceu foi a extrema direita, tirando muitas vezes o lugar de políticos da direita tradicional, clientelista e fisiológica. E assim, reproduz-se no Congresso a polarização entre a esquerda e a extrema direta.
Dos 27 senadores eleitos, 20 são apoiadores de Bolsonaro. E entre eles, a maioria é de extrema-direita mesmo, como o vice-presidente Mourão, os ex-ministros Damares Alves, Marcos Pontes, Rogério Marinho e Tereza Cristina. Como o evangélico Magno Malta e o estreante Jorge Seif (SC), e mesmo Sergio Moro, no que pese o afastamento de Bolsonaro, que ele tentou superar na campanha. Derrotou seu apoiador da direita tradicional, Alvaro Dias. Kátia Abreu e Rose de Freitas também não voltam. A base de Bolsonaro no Senado terá mais que a maioria absoluta de 41 cadeiras. Que fará Lula com um Senado destes?
Na Câmara também há o avanço do bolsonarismo raiz, com a inacreditável eleição do general Pazuello, ao passo que Luiz Mandetta foi derrotado. Colaboradores como o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, o ex-secretário de Cultura Mario Frias, e as deputadas Bia Kicis e Carla Zambelli foram eleitos. O bolsonarismo emplacou novos nomes, como o cantor Netinho, a influenciadora Antonia Fontenelle, o jogador de vôlei Maurício Sousa e o fenômeno eleitoral de Minas, Nikolas Ferreira. Até Alexandre Ramagem, o serviçal da Abin, e Sergio Camargo, o preto de alma branca da Fundação Palmares, viraram deputados. A bancada da bala ganha o lider do grupo Pró-Armas, Marcos Pollon (MS). A lista é muito grande.
Juntos, o bolsonarismo e a direita fisiológica agrupada no Centrão terão a maioria absoluta da Câmara.
A Federação PT-PV-PC do B conquistou 80 cadeiras, será a segunda maior bancada, mas a presidência da Câmara já se foi para Arthur Lyra, o mais votado em Alagoas. A esquerda contará ainda com 14 deputados da federação PSOL-Rede e 14 do PSB. Sabe-se lá se com os 17 do PDT, mas somando todos, chegamos a 125 deputados. Que fará Lula com uma Câmara destas?
Se não conseguirmos despertar a imensa parcela de eleitores que, no primeiro turno, valorizou mais as pautas de costumes do que a defesa da democracia, a bolsonarização do Brasil vai avançar num eventual e impensável segundo governo Bolsonaro. Depois do Congresso, teremos o avanço do bolsonarismo sobre o Supremo e os tribunais superiores, sobre a elite da administração pública e o conjunto das instituições. Será o suicídio de um povo.
TEREZA CRUVINEL ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)