200 anos da independência foram banalizados, escondidos, politizados por um governo incapaz de enxergar a história
Quando o mal de Alzheimer ainda não tinha tomado conta em definitivo de sua mente, o ex-senador, ex-vice-presidente da República, ex-presidente da Câmara, ex-governador, ex-ministro Marco Maciel tinha uma queixa recorrente: não estão planejando as comemorações do Bicentenário da Independência, dizia ele.
Imaginem que ele, morto em 2021, já vinha convivendo com a doença havia uns sete anos. Ou seja, era uma preocupação de quase uma década, pois ele entendia que assim deveria ser, assim pedia a importância da data. Ele defendia, segundo contou sua viúva, dona Ana Maria, que se formasse uma comissão com representantes dos mais diversos setores para que as comemorações envolvessem este jovem país. E ele sabia do que falava, com a autoridade de quem coordenou a Comissão do Sesquicentenário.
E, afinal, 200 anos na história podem não ser muita coisa, mas a independência da Nação é um marco a ser discutido e festejado.
Não seria o momento de uma grande discussão que envolvesse um balanço sobre o passado, mas também sobre o que se quer, como sociedade e como País, para o futuro? O diplomata, historiador e ex-ministro Rubens Ricúpero falou sobre este estado de apatia em entrevista recente à Agência Senado. E contou que servia na embaixada brasileira nos Estados Unidos, em 1976, quando se comemoravam os 200 anos da Independência lá. Foram milhares os eventos comemorativos, organizados pelo governo ou pela sociedade, espalhados por todo o país.
Pois eis que este governo, que parece não ter ninguém responsável nas áreas de Cultura, Educação e Relações Exteriores – algumas das que deveriam estar à frente desta ação – não só não deu a mínima para o Bicentenário, como está banalizando a data. Como se fosse restrita ao desfile militar de sempre. Pior que isso, tenta fortemente sequestrar seu significado. E dá a ele apenas este aspecto bélico, como se pertencesse às Forças Armadas.
Até aqui, ou seja, a menos de uma semana do 7 de Setembro, o que temos são alguns eventos esparsos, sem articulação entre si e de pouco apelo. Ainda mais em meio à campanha eleitoral, quando só se menciona a data para instigar patriotadas, de um lado, ou renegá-las, de outro. Ou, ainda, para falar do esquema de segurança nos desfiles.
De relevante, talvez, a reinauguração do Museu do Ipiranga, em São Paulo, para a qual o governo federal pouco contribuiu, embora mencione em sua página oficial. Que, aliás, traz uma contagem regressiva para a data e mais uma ou outra referência a curiosidades e sobre o Bicentenário e… o Legislativo, que realmente oferece alguma contribuição com publicações, entrevistas, reportagens especiais e artigos.
Claro, temos ainda a efeméride mais comentada, talvez pelo inusitado – ou bizarrice, sobre ela qual muitos já falaram – que é a exposição (contra a vontade até do próprio) do coração do Imperador Dom Pedro I. Convenhamos, não é para qualquer um; quem quiser que vá vê-lo, só não contem com a minha presença.
LETÍCIA BORGES ” BLOG OS DIVERGENTES” ( BRASIL)