
Ortellado não é um completo despreparado. Seu problema é o viés, o oportunismo, sempre anti-esquerda, anti-PT, valendo-se do estratagema de tomar a parte – a militância – pelo todo.
Há muitas formas de fazer o jogo da direita. Há tempos, o mais insistente propagador de teses favoráveis à direita é Pablo Ortellado, professor da USP e articulista de O Globo.
Seu jogo é simples. Ele cria um personagem genérico: o militante do PT. Militante é algo vago, agressivo, que busca espaço na radicalização e, em geral, não tem nenhuma expressão no partido. Vale para militantes do PT, de Ciro, do PSDB e de Bolsonaro. Não há nenhuma diferença entre eles. São como touros bravos chifrando a bandeira que colocam à frente.
Militantes ciristas e petistas se equivalem na agressividade mútua. No entanto, Ortellado tem foco único:
“Em paralelo, lulistas acusaram duramente os eleitores de Ciro de irresponsáveis, por empurrar com o seu voto as eleições para um segundo turno imprevisível. Essa pressão contra os eleitores, por seu caráter desrespeitoso e agressivo, não convenceu um único cirista. Apenas contribuiu para torná-los ainda mais resistentes a votar no petista. Afinal, os votos em Ciro são de quem, por um motivo ou outro, tem grandes reservas com Lula ou o PT”.
O militante petista ataca o militante cirista porque julga que seu voto vai impedir a vitória de Lula no primeiro turno e pode abrir espaço para a de Bolsonaro no segundo. O militante ciristas ataca o lulista porque diz que Lula faz concessões e, sem Lula, Ciro venceria Bolsonaro. É um jogo previsível, de bolhas de redes sociais.
Aí, o gênio da sociologia admite que os ataques de Ciro a Lula estão sendo utilizados pela militância bolsonarista – conforme matéria recente do Globo. Se estão sendo utilizados pelos bolsonaristas, significa que os ataques de Ciro a Lula beneficiam Bolsonaro? Longe disso. A candidatura de Ciro é ótima porque tira eleitores de Bolsonaro – e não de Lula. Entenderam? Ao atacar Lula, Ciro é difundido pelos bolsonaristas não em favor de Bolsonaro, mas do próprio Ciro.
Ortellado não é um completo despreparado. Seu problema é o viés, o oportunismo, sempre anti-esquerda, anti-PT, valendo-se do estratagema de tomar a parte – a militância – pelo todo.
Nada contra ser um pensador de direita explícito, e existem vários na mídia, assumindo sua identidade. O problema é a malícia e o oportunismo.
Ortellado surgiu na mídia alternativa com uma defesa intransigente do que de mais radical apareceu nos movimento de rua, os blockbusters. Efetuou alguns estudos sobre o pensamento dos manifestantes de rua. E ganhou visibilidade com os blogs alternativos, para quem ele oferecia artigos.
Sua conversão à direita deu-se por cooptação direta da revista Veja, na fase mais escabrosa do seu jornalismo. Ortellado foi contratado para um trabalho sobre o radicalismo na blogosfera e o uso de fake news – logo por ela, a Veja.
Montou um estudo com vários vieses. O primeiro, foi comparar sites de ultra-direita, geradores conhecidos de notícias falsas, com sites jornalísticos de esquerda, que faziam contraponto à mídia tradicional praticando jornalismo.
O segundo foi um estudo falsificado sobre o perfil dos leitores da mídia tradicional e dos blogs de esquerda. A comparação foi com portais, tipo UOL, que distribuem matérias de celebridades, abriga sites de sexo, esportes. Qualquer estudioso saberia separar os leitores de acordo com as editorias. O leitor de política e de economia é diferente do leitor de ilustrada e, nos portais, muito diferente do leitor de sites de celebridades ou de sexo.
Mas valeu-se da espertezas de comparar coisas desiguais para assegurar que leitores da imprensa tradicional eram mais jovens e mais engajados.
Esse trabalho foi apresentado pela Veja em um seminário com agências de publicidade e se transformou no principal instrumento para os sites dito progressistas serem vetados pelas agências de publicidade. Todos eles – a direita geradora de fake news e os blogs de esquerda – foram enquadrados na mesma categoria pelas agências de publicidade, e proibidos de receber publicidade.
Mesmo assim, Ortellado continuou faturando a imagem do “esquerdista que nós confiamos”. Ganhou a pesada incumbência de substituir Vladimir Safatle como “nosso colunista de esquerda” na Folha. Substituiu um intelectual brilhante e intelectualmente honesto, por um exercício semanal de críticas à esquerda, no formato malandro de autocrítica. A direita passou isenta por seus artigos.
Por isso, salve Magnolli, Merval, Coutinho e direitistas que defendem suas teses e se expõem às críticas sem recorrer a malandragens retóricas.
“Democracia é coisa frágil. Defendê-la requer um jornalismo corajoso e contundente. Junte-se a nós: www.catarse.me/jornalggn“Veja mais sobre:militante de direita, O Globo, Pablo Ortellado
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)