PORTUGAL, GUERRA FRIA E UCRÂNIA

CHARGE DE MIGUEL PAIVA
  • Quase uma Suíça ibérica, depois da fraticida guerra civil espanhola (1936 – 1939), que teria causado cerca de um milhão de mortos, Portugal, sob o regime do Professor António de Oliveira Salazar (1889 – 1970), simpatizante do fascismo italiano de Benito Mussolini(1883 – 1945), surpreendeu o mundo e declarou-se neutro na Segunda Guerra (1940 – 1945). Milhares de refugiados europeus, sobretudo de origem judaica, buscaram o porto seguro de Lisboa, naquele período, a caminho das Américas – tendo como destino final, na maioria das vezes, os Estados Unidos e o Brasil.
  • Mas o Portugal salazarista, após a neutralidade no último grande conflito continental, mergulhou de cabeça, ao contrário dos suíços, na Guerra Fria. Foi um dos 12 signatários, em quatro de abril de 1949, da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), assinado em Washington – do qual faziam parte, para além dos Estados Unidos e Canadá, nove países da Europa: Bélgica, Dinamarca, França, Islândia, Itália, Luxemburgo, Noruega, Holanda e Reino Unido. Seriam incorporados também à OTAN, em 1952, com o endurecimento da Guerra Fria, Grécia e Turquia.
  • Só três anos mais tarde, em 14 de maio de 1955, nasceria o bloco militar que faria frente à OTAN, liderado pela União Soviética, denominado Pacto de Varsóvia – por ter sido a capital polonesa a sediar o encontro. Compunham o grupo militar as 15 repúblicas soviéticas, entre as quais, a Ucrânia, bem como Albânia, Alemanha Oriental, Bulgária, Hungria, Polônia, Romênia e Tchecoslováquia.   A queda do Muro de Berlim, em nove de novembro de 1989, e a dissolução, dois anos depois, da União Soviética, em 26 de dezembro de 1991, pareciam indicar o fim da Guerra Fria. Mas não foi o que aconteceu.
  • O Pacto de Varsóvia, de fato, esfarelou-se, porém, a OTAN continuou a crescer e expandir os seus domínios ao Leste europeu. A organização de Washington atraiu, principalmente, países do antigo Pacto de Varsóvia. Como Albânia, Bulgária, Eslováquia, Hungria, Polônia, República Tcheca, Romênia e cinco das seis repúblicas que formavam a Iugoslávia – ficando de fora apenas a Sérvia. Ingressariam ainda na OTAN os três países bálticos, que eram integrados à União Soviética: Estônia, Letônia e Lituânia.
  • Desde 2014, quando um movimento popular na Ucrânia, intitulado Revolução Laranja, afastou o país da Rússia, os governos de Kiev passaram a flertar com a OTAN – que pretende estender a presença militar às fronteiras russas. Um velho desafio da Guerra Fria. A chegada à Presidência da Ucrânia, em 2019, do comediante direitista Volodymyr Zelensky, 44 anos, de família judia, acelerou o processo de adesão da ex-república soviética à OTAN – afrontando e desagradando o Kremlim, que, sentindo-se ‘vulnerável’, acabaria por desencadear, em fevereiro último, uma ofensiva militar no país vizinho. Tenta impedir, assim, que passem ao controle da OTAN regiões meridionais históricas do Império da Rússia czarista, próximas à Crimeia, reanexada há oito anos a Moscou.
  • São cidades como Luhansk, Donetsk, Mariupol, Khersan, Mykolaiv e a célebre Odessa – fundada em 1794, pelo legendário oficial russo, Marechal Gregório Potemkin (1739 – 1791), em homenagem à Imperatriz Catarina II de Todas as Rússias (1729 – 1796).   Coerente com sua própria trajetória, como um dos pioneiros da OTAN, Portugal condena hoje os ‘desatinos’ do Presidente da Rússia, Vladimir Putin, 69 anos, e recebe refugiados ucranianos – solidário ao bloco ocidental da Guerra Fria. Estes prófugos são as primeiras ‘vítimas’ da trágica conjunção de um governo chefiado por um comediante e de uma Rússia que começa a se reerguer e sonha com a antiga grandeza.      

ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)

Albino Castro é jornalista e historiador

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