QUEM VAI ATÉ O FIM COM BOLSONARO ?

CHARGE DE AROEIRA

A história está à disposição de todos para que qualquer tentativa de repetição não a transforme em farsa. O ano de 2022 é muito simbólico para o Brasil. O cidadão/contribuinte/eleitor vai decidir em outubro (em 1º e/ou 2º turno) quem governará o país nos próximos quatro anos. Completam 200 anos a Independência do Brasil de Portugal, proclamada em 7 de setembro de 1822 por Pedro I, filho de D. João VI, que comandava o reino de Portugal, Brasil e Algarves, e o centenário da Semana de Arte Moderna, que sacudiu a chamada “Paulicéia Desvairada”, movimento de artistas e intelectuais da época que visava criar uma identidade nacional do ponto de vista cultural. Como a cultura não está nas prioridades ou no raio de alcance do governo Bolsonaro, como indica o quilate dos gestores que nomeou para a área cultural, de resto tratada a ferro e fogo, segundo o conceito do falecido guru, o “terraplanista” Olavo de Carvalho, de que a guerra ideológica faz do “marxismo cultural” o seu Cavalo de Troia, restaria alguma luz sobre o bicentenário da Independência.

Entretanto, se as pesquisas eleitorais não indicarem, até o fim de março, uma opção mais confortável para o presidente Jair Bolsonaro que a possibilidade de derrota para Lula ainda no 1º turno, ou derrota certa no 2º – o que poderia levar o atual candidato à reeleição a tentar se blindar politicamente contra uma enxurrada de processos se perder o cargo de presidente, mediante a renúncia ao cargo majoritário em troca de uma eleição garantida para o Senado Federal ou a Câmara dos Deputados, onde teria imunidade -, em 31 de março o presidente da República promoverá, como já disse, a troca de 11 ministros atuais que deverão concorrer a cargos de governador (três em princípio: Tarcísio de Freitas ao governo de São Paulo, Onyx Lorenzoni, ao do Rio Grande do Sul, e João Roma, ao da Bahia; os demais disputariam vaga no Senado ou na Câmara). E o mês da Independência será tomado pela campanha.

Considerado “um mau soldado” pelo ex-presidente Geisel – um general cioso da hierarquia e da disciplina nas Forças Armadas, que demitiu, por insubordinação à orientação de abertura política de seu governo, o general Ednardo D’Ávila Mello, comandante do II Exército (SP), após as mortes, por torturas nas celas do DOI-CODI (defendidas pelo deputado e presidente), do jornalista Vladimir Herzog e do operário Manuel Fiel Filho; o ministro do Exército, general Sylvio Frota; e o ministro chefe da Casa Militar, general Hugo Abreu, da Brigada de Paraquedista, arma de Bolsonaro. Geisel deu a Abreu a opção de pedir demissão. Reformado como capitão, Jair Messias Bolsonaro nunca teve posto de comando. Quando muito, liderava um pelotão. Se chegasse a coronel poderia comandar Regimento. Nas três patentes de general, com uma estrela, poderia comandar uma brigada; com duas, uma divisão de Exército e, com três estrelas, uma das regiões militares do país. Se ficasse no Exército e galgasse cargos de major para cima poderia ter frequentado cursos da Escola de Comando de Oficiais e a graduação na Escola Superior de Guerra.

Em todas as etapas participaria de reuniões de Estado-Maior, nas quais se discute amplamente uma situação para se ver as possibilidades de sucesso ou fracasso de determinação ação. Como não foi burilado pela responsabilidade compartilhada, viu-se nas reuniões ministeriais (como a famosa de 22 de abril de 2020) porque faltavam método e pauta, coisa corriqueira até em uma reunião de condomínio. E no longo período de mandato parlamentar, iniciado como vereador no Rio de Janeiro (1998 a 1991, quando, eleito em outubro de 1990, assumiu a cadeira de deputado federal pelo RJ), jamais pensou grande. Fez carreira política, defendendo interesses corporativos das forças armadas, PMs e bombeiros, com extensão a milicianos egressos das forças auxiliares. Além de nomear parentes, usou o apartamento funcional para “comer gente (sic)”.

Afronta aos nordestinos

Se tivesse sido lapidado nas Forças Armadas ou na vida política, Bolsonaro, que se julga um diamante bruto, embora tenha mais o segundo que o primeiro predicado, não teria cometido o deslize mortal esta semana em sua “live” das quintas-feiras quando desdenhou da figura do Padre Cícero. Até os brasileiros mais ou menos letrados e especialmente todos os nordestinos sabem que Padre Cícero (Cícero Romão Batista), nasceu no Ceará, no Crato, e viveu e morreu em Juazeiro do Norte, no sertão cearense, onde foi erguida gigantesca estátua de concreto, ponto de veneração e romarias. Com 27 metros de altura, fora o pedestal, a imagem do santo de devoção dos nordestinos, é monumental. Mas fica não só atrás da estátua do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro (38 metros de altura, com o pedestal), como das estátuas do Cristo em Elói Mendes (MG), construída em 2007, com 39 metros de altura, a de Nossa Senhora do Carmo, inaugurada em 2018, no Crato, também no sertão cearense, com 45 metros, superada pelos 56 metros de altura da imagem de Santa Rita de Cássia, inaugurada em 2010 em Santa Cruz (RN). A maior estátua do Brasil, réplica quase perfeita da Estátua da Liberdade, que é o símbolo das lojas Havan, surgida em Brusque (SC), com a sósia miniatura da original na entrada do Rio Hudson, em Nova Iorque, foi instalada por Luciano Hang, o empresário amigo de Bolsonaro, no estacionamento de sua mega loja no município de Barra Velha (SC), com 57 metros de altura, incluindo o pedestal. Este monumento o presidente deve ter conhecido na sua última ida ao estado barriga verde, no fim do ano passado.

Para piorar a gafe, se não bastasse o desrespeito e a falta de informação para falar de um “santo” venerado pelos nordestinos em geral, Bolsonaro indagava ao vivo se alguém sabia em “qual cidade de Pernambuco estava a estátua de Padre Cícero?”. Diante do silêncio constrangedor no estúdio, arrematou: “um monte de paus-de-arara (sic) por aqui e ninguém sabe em que cidade fica Padre Cícero, pô? Juazeiro do Norte, parabéns aí. Ceará, desculpa aí. Ceará”, declarou, sem corar, o presidente. Se fosse mais culto e preparado, teria estudado o que ia falar. A menção ao Padre Cícero veio na “live” para explicar o decreto da semana anterior, quando chegou a anular 122 antigos decretos de luto pela morte de personalidades brasileiras (em seus mais de três anos de mandato, Bolsonaro, que pouco demonstrou empatia pelos mais de 630 mil mortos pela Covid-19, só decretou luto oficial duas vezes: pelas mortes do ex-vice-presidente Marco Maciel, em junho de 2021, e do guru bolsonarista Olavo de Carvalho, em janeiro último). Diante das reclamações de aliados políticos do Nordeste, o presidente voltou atrás e tentou se explicar. O tiro saiu pela culatra. Ou como se diz no Nordeste, “depois do tombo, o coice” – da cavalgadura no ginete desastrado.

A emenda foi ofensiva aos cearenses e aos nordestinos em geral. Se tivesse pensado melhor, não iria jogar uma bola fora menosprezando a população dos nove estados onde vivem 54 milhões dos 214 milhões de brasileiros e onde estão aptos a votar 42 milhões de eleitores. Os caciques políticos aliados ao governo alertaram o presidente para não bulir com Padre Cícero, pois é justamente no Nordeste, segundo a pesquisa PoderData do site Poder 360 desta semana, onde Lula tira a maior vantagem sobre Bolsonaro (51% a 26%). É no Nordeste e junto às mulheres (44% preferem Lula, o dobro das que declaram intenção de votar em Bolsonaro) que estão as maiores adesões ao ex-presidente da República. A Bahia (que não visitou nas chuvas de janeiro) é o estado mais populoso as região (15 milhões) e com mais eleitores, seguido por Pernambuco, Ceará e Maranhão. Luís Inácio da Silva, ainda menor de idade, veio de Garanhuns (PE) com a família para São Paulo, a bordo de um caminhão “pau-de-arara”. O caminhão tinha uma lona levantada na carroceria, sob a qual viajavam retirantes no fim dos anos 50. Devido aos riscos e a inúmeros acidentes com mortes, este tipo improvisado de transporte, ainda comum das áreas rurais, foi proibido de circular nas estradas federais e estaduais desde o fim dos anos 70.

Se Jair Bolsonaro tivesse uma assessoria decente e não improvisada, como é seu modo de ‘governar’, que mais parece as manobras de “zerinho” (rodopio na pista), que fez ao volante de um carro no parque Beto Carrero, em Penha (SC), poderia ter se inspirado na famosa viagem que o então presidente general Emílio Garrastazu Médici fez em julho de 1970 ao Nordeste, quando pronunciou na reunião de encerramento do Conselho da Sudene, em 6 de julho um copioso e comovente discurso sobre o homem do Nordeste. Médici, que, depois de comandar o III Exército (o de maior contingente do país, na fronteira com Uruguai, Argentina e Paraguai, os participantes, com o Brasil, da maior carnificina da América do Sul, no século 19 (a “Guerra contra o Paraguai”), foi chefiar o Serviço Nacional da Informações no governo do marechal Costa e Silva, 2º presidente do regime militar, a quem sucedeu, após a junta dos três ministros militares (a “junta dos três patetas”, segundo o jornalista Elio Gaspari) ocupar o poder por algumas semanas diante do AVC de Costa e Silva, era um homem de poucas palavras. Mas se cercou de pessoas competentes, sobretudo na secretaria de Comunicação, comandada pelo então coronel Otávio Pereira da Costa, herói da FEB. O general alagoano, que morreu em novembro do ano passado, com 100 anos, tinha entre seus auxiliares jornalistas de quilate e especialistas em comunicação, como Carlos Alberto Rabaça. Claro que o discurso não era da lavra de Médici, que não falava de improviso em público. E muita gente atribui, erradamente, a frase famosa de Médici de que “A economia vai bem, mas o povo vai mal” como tendo sido pronunciada nesta reunião da Sudene. Não é verdade. Ela foi dita quatro meses antes, em 10 de março de 1970, na abertura do ano letivo dos cursos da Escola Superior de Guerra, na Urca. Bolsonaro nunca cursou a ESG. Nesta data, em março, o país já acumulava taxas expressivas de crescimento do PIB e o teor completo da frase de Médici, que comemorava os 20 anos da criação da escola pelo ex-presidente Marechal Eurico Gaspar Dutra, e procurou traçar um desenho do Brasil futuro (tinha cinco meses de governo) foi que, segundo a edição do JORNAL DO BRASIL de 11 de março de 1970, ao examinar os esforços e os sucessos obtidos nos últimos seis anos pelos três governos militares, chegou à “pungente conclusão de que a economia pode ir bem, mas a maioria do povo ainda vai mal”. Na Sudene, Médici abriu o discurso dizendo: “Aqui vim para ver, com os olhos da minha sensibilidade, a seca deste ano, e vi todo o drama do Nordeste. Vim ver a seca de 70, e vi o sofrimento e a miséria de sempre”. Esse “vim ver e vi” passou a ser reiterado em cada parágrafo ou frase. Ao final do discurso, Médici lançou a ideia que os militares pensaram ser a redenção dos nordestinos – a criação de programas “de colonização em zonas úmidas do Nordeste, do Maranhão, do Sul do Pará, do Vale do São Francisco e do Planalto Central, de forma a absorver as populações de áreas consideradas totalmente desaconselháveis à vida humana”.

Foi o começo da destruição das florestas tropicais e equatoriais do Maranhão, Sul do Pará e Norte de Mato Grosso. Os assentamentos, que seriam implantados à margens da Transamazônica e da futura Perimetral Norte, fracassaram. Mas abriram caminho para a extração de madeiras, a destruição de florestas e a explosão de Serra Pelada, quando a descoberta de pepitas de ouro, já no governo Geisel, atraiu milhares de nordestinos e brasileiros de outras regiões para o garimpo de Serra Pela. Improvisado e explorado manualmente, o garimpo extrairia muito mais ouro se fosse em escala industrial, pela então estatal Vale do Rio Doce. A exploração ficou inviável após o fechamento de Serra Pelada no governo Collor. A “febre do ouro” contaminou gerações, que se espalharam, nas décadas seguintes em garimpos ilegais em rios e parques nacionais e mais recentemente nas áreas de proteção a tribos indígenas, que foram abertas no governo Bolsonaro, completando a agressão ao meio-ambiente. Será que Bolsonaro crê que levar a água da transposição do São Francisco ao sertão do Nordeste – obra iniciada com Lula, continuada com Dilma e Temer e que teve 20% concluídos no atual governo – pode redimí-lo das ofensas ao Padim Ciço?

O mar de 200 milhas

Claro que prefiro o regime democrático, sob o comando dos políticos, com respeito às leis e aos direitos das minorias, e os militares nos quartéis, cumprindo seus deveres constitucionais. Como também devem fazer os policiais federais, os funcionários da Receita Federal, do INSS, do SUS. Os professores, os promotores, os juízes e desembargadores. Cada funcionário público com sua função e sua competência. Baseado na transição por que passaram Portugal e Espanha quando ingressaram na União Europeia em 1992 e seus soldados passaram a integrar as Forças da OTAN, há anos defendo que as Forças Armadas deviam se profissionalizar no Brasil (os armamentos modernos, caros e sofisticados, assim como máquinas agrícolas e caminhões exigem pessoas treinadas e qualificadas). O serviço militar obrigatório anual (extinto, por dispensável, na península ibérica e em outras nações europeias) poderia ser transformado num serviço cívico obrigatório, cumprido ao longo de dois anos, em períodos escalonados, preferencialmente nas férias escolares, em diversas regiões do país (nas cidades e no interior, incluindo a Amazônia e o sertão nordestino). O contato com novas realidades poderia ampliar a visão de muitos jovens sobre o Brasil, quem sabe levando ideias novas para as regiões e locais desconhecidos, onde também poderiam surgir oportunidades de trabalho. O apoio de estudantes de medicina teria sido valioso na pandemia. No censo, o IBGE poderia absorver parte deste contingente com custos bem menores. Outros programas sociais poderiam engajar os jovens. Mas isso é um tema que discuti há muitos anos (1988), com o general Otávio Costa, que lembrava, perante os saudosos Evandro Carlos de Andrade e Luiz Alberto Bitencourt, passagens do meu tio Geraldo Menezes Côrtes, quando comandou a Vila Militar de Realengo (RJ), na 2ª Guerra. Meu tio, que foi reformado como general entrou para a política em 1958, como o 3º mais votado no Distrito Federal. Recém eleito deputado federal pela UDN da Guanabara, morreu em novembro de 1962, quando, líder da UDN ia para Brasília num jatinho Paris da FAB, que caiu em Nova Lima (MG).

Para mostrar que não tenho prevenção com as boas ideias que podem nascer no meio militar, um amigo chamou atenção esta semana para manchete de “O Globo há 50 anos”. O jornal de Roberto Marinho dava como principal notícia a intenção da Petrobrás (então com acento) de explorar a plataforma marítima continental para tentar encontrar petróleo. Vale lembrar que três semanas depois do famoso discurso na ESG, em 25 de março de 1970, o governo Médici anuncia que o Brasil declarou perante a Assembleia Geral da ONU a extensão do mar territorial das tradicionais 12 milhas náuticas (22,22 quilômetros) para 200 milhas. Anos antes, apesar da soberania sobre as 12 milhas, o Brasil entrou em desavença diplomática com a França porque seus pesqueiros estavam invadindo a plataforma brasileira para capturar lagostas no litoral do Nordeste brasileiro. Na época, muita gente desdenhou do “mar de 200 milhas”, considerando que era mais um “ufanismo do regime militar”.

A manchete de O Globo em 1972 dá conta de que a diretoria da Petrobras estava programando investimentos pesados na plataforma marítima. Na verdade, desde 1967, depois de buscar, com pouco sucesso, petróleo em terra, a Petrobras se lançou a explorar a plataforma marítima, com a perspectiva de ter óleo além da área de 12 milhas. Entre os técnicos da estatal que foram estudar, no fim dos anos 60, geologia do petróleo na Universidade de Tucson (Texas), por recomendação de Mr. Walter Link (engenheiro de petróleo americano que foi execrado no Brasil quando disse, no fim dos anos 50, que “não havia petróleo no Brasil”, se referia ao território terrestre, tanto que estimulou a qualificação dos quadros técnicos da estatal para pesquisa em águas profundas, no mar, o que ocorreu de 1967 a 1975), estava Carlos Walter Marinho Campos, formado na escola de Engenharia de Minas de Ouro Preto (MG). Homenageado como o nome da sub-sede da Petrobras em Macaé, centro operacional da Bacia de Campos, Carlos Walter, chefe da geologia da estatal (quase toda reciclada em Tucson, ou na Rússia), foi o responsável por insistir na exploração na plataforma marítima, onde, em 1971, foram achados os primeiros indícios de petróleo na Bacia de Campos. A primeira descoberta, feita pela plataforma semi-sumersível Sedco 135-D, ocorreu em agosto de 1974, (furo mundial de Ênio Bacelar, do JORNAL DO BRASIL, menos de um ano após a crise do petróleo). Inconformado com a informação de que o poço era seco, Marinho insistiu com os técnicos para perfurar no campo ao lado, daí que o poço do campo de Enchova foi chamado 3-EN-1-RJS. A primeira produção efetiva veio em 1977. Hoje, com os avanços das descoberta do pré-sal, em 2007, quando outro engenheiro da Petrobras, formado em Tucson, Guilherme Estrela, descobriu o pré-sal da Bacia de Santos, a Bacia de Campos, ainda produz 30% do petróleo brasileiro, do pré-sal saem 70% do petróleo e gás, em camadas bem mais profundas, havendo até grandes reservas de pré-sal na Bacia de Campos. Se não fosse o mar de 200 milhas (arquitetado também pelos competentes quadros do Itamaraty), a Bacia de Campos e o pré-sal da Bacia de Santos, onde há campos gigantes de petróleo a mais de 300 km da costa, poderiam estar sob cobiça estrangeira. E me recordo, que aos 12 anos, ouvi meu tio (poucos dias antes dele morrer) convocar meus irmãos mais velhos a “estudar a profissão do futuro, a engenharia do petróleo”. Diante a pobreza dos atuais debates entre os militares brasileiros, concluo que a sociedade civil se capacitou bem mais para estudar e discutir as questões ambientais inerentes à soberania da Amazônia. Salvo exceções, os militares pararam no tempo.

Os ricos e a hipocrisia nos impostos

O ex-secretário da Receita Federal, o pernambucano Everaldo Maciel, publicou esta semana um contundente artigo na “Coluna do Noblat”, do conterrâneo Ricardo Noblat, no site “Metrópoles”. O tema é a injusta e desigual tributação que penaliza mais os pobres que os ricos. (no Brasil, como a carga tributária é mais de 70% assentada nos impostos indiretos incidentes sobre bens e serviços, os pobres ainda sofrem mais desigualdade que no 1º mundo). Esta é uma correção que o Brasil precisa fazer para pleitear o ingresso no clube da OCDE, que atualmente congrega 38 países, com carga tributária mais calibrada sobre a renda e o patrimônio do que sobre o consumo.

Maciel lembrou que no “Forum Econômico Mundial”, de Davos (Suíça), um grupo de 100 milionários presentes, autodesignado “Milionários Patriotas”, divulgou carta em que reconheciam que suas fortunas cresceram com a pandemia e que os sistemas tributários eram injustos. Piedosamente, pediam para ser mais tributados. Ironicamente, Maciel citou frase atribuída ao pensador francês La Rochefoucauld (1613-1680): “a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude”, para lembrar ser certo “que os ricos, especialmente os milionários, pagam desproporcionalmente menos impostos que os demais contribuintes”. Porém, afirmou, “é igualmente certo que as leis tributárias, que lhes permitem pagar menos impostos, não decorrem, por óbvio, de pressão política dos pobres. Ao contrário, como se constata na forte oposição, no Congresso norte-americano, às propostas tributárias do presidente Biden”.

E completou com o conhecimento de causa de quem comandou o Fisco durante os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso e enfrentou forte “lobby” no Congresso e na mídia quando quis taxar mais os mais ricos. “Para evitar o pagamento de impostos, grandes multinacionais e milionários não praticam a vulgar sonegação. Recorrem a talentosos e bem remunerados especialistas que produzem requintados planejamentos tributários, invulneráveis a alíquotas nominais elevadas ou a pretensões de tributação das fortunas. Essa arma, não tão secreta, ainda que desconhecida para os leigos, é um agente formidável na geração de desigualdades entre pessoas e países”.

E completou: “os que se valem do planejamento abusivo alegam que tão somente lançam mão de brechas na legislação tributária, como se elas nascessem por geração espontânea”.

Maciel lembrou que em 2021, Chuck Collins, professor do “Institute for Policy Studies”, em Washington, publicou um livro (“The Wealth Hoarders”) em que mostra como “os bilionários pagam milhões para esconder trilhões e assim acumular riquezas, por meio de astuciosos planejamentos”. Assinala o autor, entre muitos exemplos, que quase a metade das empresas norte-americanas têm inscrição fiscal em Delaware o estado americano que cobra a menor tributação e é conhecido como paraíso fiscal. Acrescenta que um único endereço em Wilmington, mais populosa cidade daquele Estado, é o domicílio fiscal de 285 mil empresas”, destaca o ex-secretário da Receita.

Aqui, os brasileiros preferem os paraísos fiscais do Caribe (Bahamas, Ilhas Cayman, Aruba ou as Ilhas Virgens Britânicas, onde Paulo Guedes, quando Lula foi eleito, em 2002 abriu empresa “off shore” para guardar US$ 9,5 milhões, segundo documentos da “Pandora Papers”. Antes, os “Panama Papers” indicavam que só uma das gavetas de um escritório de advocacia e contabilidade na Cidade do Panamá era sede de uma centena de empresas. E o Brasil, por ora, para evitar a fuga de capitais para paraísos fiscais, se dispõe a igualar os tributos sobre as empresas transnacionais.

GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)

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