ARTIGO DO MINISTRO BARROSO REAVIVA DEBATE SOBRE GOLPE CONTRA DILMA EM 2016

CHARGE DE NANDO MOTTA

“Falta de apoio político como real motivo para impeachment é eufemismo para golpe. Ou não?” (Flávia Oliveira, comentarista da GloboNews, no Twitter).

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Como o ministro Luís Roberto Barroso, do STF e do TSE, é um homem fino, que usa as palavras com delicadeza, ele não emprega a palavra golpe no artigo que escreveu sobre os motivos que levaram à queda da presidente Dilma Rousseff, em 2016, revelado hoje pela minha amiga Mônica Bergamo, em sua coluna na Folha.

“A justificativa formal foram as denominadas pedaladas fiscais _ violação de normas orçamentárias _ embora o motivo real tenha sido a perda de sustentação política”, explica Barroso no texto escrito para a edição de lançamento da revista do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais), no próximo dia 10.

Vivêssemos num regime parlamentarista, em que a perda de apoio político leva à queda do gabinete, perfeito. Só que aqui ainda estamos no regime presidencialista, e a perda de sustentação política não está prevista na Constituição para justificar um impeachment.

O que tivemos foi um golpe parlamentar baseado num processo político, sem crime formalizado de responsabilidade, com base num parecer da notória jurista Janaína Pascoal, a pomba gira, promovido por um parlamento corrupto, comandado pelo Centrão de Eduardo Cunha, que hoje governa o país, depois que a Lava Jato abriu caminho para levar ao poder um presidente inepto, responsável pela tragédia que estamos vivendo, com o beneplácito do STF do ministro Barroso.

Já no ano passado, como lembra Mônica Bergamo, Barroso havia expressado o mesmo raciocínio na abertura do Simpósio Interdisciplinar sobre o Sistema Político Brasileiro:

“Creio que não deve haver dúvida razoável de que Dilma não foi afastada por crimes de responsabilidade ou corrupção, mas, sim, foi afastada por falta de sustentação política. Até porque afastá-la por corrupção, depois do que se seguiu, seria uma ironia da história”.

Pois foi mesmo uma ironia da história o que se seguiu, ministro Barroso, quando o golpista Michel Temer assumiu o lugar de Dilma Rousseff, contra quem nunca houve um processo por corrupção.

Em outro trecho do artigo, o ministro escreve que Temer procurou “implementar uma agenda liberal, cujo êxito foi abalado por sucessivas acusações de corrupção. Em duas oportunidades, a Câmara dos deputados impediu a instauração de ações penais contra o presidente”. Era a mesma “agenda liberal”, a “ponte para o futuro”, depois adotada por Bolsonaro & Guedes, que acabou com os direitos trabalhistas e rifou a Petrobras, dois dos principais motivadores do golpe.

Veja quanta ironia. A mesma Câmara que cassou o mandato de Dilma, uma presidente honesta, em nome do combate à corrupção, em defesa da família e da propriedade, absolveu o seu sucessor, em troca das mesmas benesses do Tesouro Nacional ora oferecidas ao Centrão pelo presidente de turno, para evitar o seu impeachment. .

Nas volta que a vida dá, mesmo evitando usar a palavra maldita, o artigo de Barroso tem o mérito de reavivar o debate sobre o golpe de Estado de 2016, que tinha sido esquecido até agora no atual debate eleitoral. Tudo o que aconteceu depois, com “Supremo, com tudo”, e que levou o país a ser hoje um pária mundial, foi mera consequência.

Assim como as pesquisas de popularidade não elegem um presidente, também não podem ser usadas para derrubar outro, só para atender ao “clamor da opinião pública”. Caso contrário, Bolsonaro já teria sido afastado há muito tempo pelo conjunto da obra de destruição do país.

Cabe agora ao ministro Barroso, como presidente do TSE, adotar as medidas necessárias para evitar que se repita, em 2022, o uso criminoso das redes sociais, como já está acontecendo, para destruir a reputação dos adversários políticos, com a fábrica de fake news e vídeos manipulados.

Como se dizia antigamente, é preciso cortar o mal pela raiz para evitar novos abalos à nossa jovem e frágil democracia.

Vida que recomeça.

RICARDO KOTSCHO ” SITE DO UOL” ( BRASIL)

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