A Inflação, medida pela variação do IPCA ( ÍNDICE DE DE PREÇOS AO CONSUMIDOR AMPLO),fechou em 10,06 % , na fronteira dos dois digitos, em 2021, e muito acima do mesmo teto de intervalo do sistema de metas, que era de 5,25 no ano.
As estimativas apontam queda, em 2022, para perto da metade do registrado no anterior.
Essa redução da inflação para vizinhanças de 5% não expressaria um recuo nos preços. Inflação não é preço alto, como muitos possam imaginar, mas alta de preços. Por isso, a variação menor do IPCA no ano que se inicia significará que os preços continuarão subindo, mas em ritmo mais lento. O que, em 2021, por exemplo, custou R$ 100, custaria R$ 105, em 2022.
Altas mensais em ritmo mais lento, caso se confirmem, farão com que a variação acumulada em 12 meses, a medida mais usada para acompanhar marchas inflacionárias, venha a cair, se não em todos os meses deste novo ano, na maioria deles, principalmente a partir do segundo semestre. Isso ocorrerá porque variações mensais mais altas, ocorridas no mesmo mês do ano anterior, estariam sendo substituídas por variações mensais menores ao longo do ano.
O ano de 2021 foi um período de altas mensais fortes nos preços. Exceto em janeiro, abril e junho, quando o IPCA mensal variou abaixo de 0,5%, a inflação subiu acima 0,8%, com picos em torno de 1% em quatro meses do ano. Basta que a inflação mensal, em 2022, fique abaixo desses índices, mesmo que continue alta, para determinar redução no acumulado em 12 meses.
Superando as expectativas mais recentes, de alta de 0,64%, a inflação preços em dezembro alcançou 0,73%. O resultado passou longe do determinado pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) para o centro da meta de inflação em 2021, que era de 3,75%.
Ao estourar o teto do intervalo da meta, o Banco Central será obrigado a divulgar uma “carta aberta”, justificando o estouro e informando medidas que pretende adotar para trazer a inflação novamente ao centro da meta. É a sexta vez, desde que o sistema de metas foi adotado, em 1999, que houve estouro no teto da meta estabelecida e o Banco Central teve de divulgar um “pedido de desculpa” por não ter cumprido a meta de inflação.
Os principais “puxadores” da inflação em 2021 foram combustíveis, energia elétrica, alimentos, artigos de residência e vestuário. O preço da gasolina subiu perto de 50% e o da energia, mais de 20%. Preços de artigos de residência, categoria que inclui equipamentos eletroeletrônicos, avançaram 12% e os de vestuário, 10%.
O governo tem responsabilidade mais direta nos três primeiros desses itens. No caso dos combustíveis, por exemplo, tentou interferir com redução de impostos, mas a pressão principal vinha da política de preços da Petrobras, que determinava repasse automático das altas no preços internacionais do petróleo, que poderia ter sido alterada por ação governamental, ainda que temporariamente, mas nada nessa direção foi feito.
Também poderia ter pelo menos suavizado altas nas tarifas de energia. O governo foi negacionista em relação à crise hídrica, demorando a reconhecer o problema climático e a tentar acordos com grandes consumidores para evitar picos de consumo. Com isso, contribuiu para que o sistema elétrico tivesse de recorrer à totalidade da reserva de geração termelétrica, mais cara e mais poluente.
Quanto aos alimentos, não procurou promover a composição de estoques reguladores, reservando assim parte da produção destinada à exportação ao mercado interno, diferentemente do que fizeram outros países exportadores de alimentos. Com a alta do dólar e a elevação da demanda internacional, a produção escoou naturalmente com mais força para o exterior, provocando escassez doméstica – e alta de preços – de produtos que são produzidos em larga escala no país, como carnes, arroz e café.
Pressões sobre preços, nos demais itens que puxaram a inflação para cima em 2021, vieram mais da taxa de câmbio, que sofreu forte processo de desvalorização no ano. É o que explica, por exemplo, as altas em eletroeletrônicos, cujos preços são diretamente afetados pela cotação do dólar.
As perspectivas de um ritmo menor na alta de preços em 2022 derivam de algumas premissas previstas para o ano. A principal é de que a atividade econômica ficaria ainda mais retraída. Essa retração está refletida nas estimativas para a variação do PIB (Produto Interno Bruto) muito pequena ou mesmo negativa.
Na mediana das previsões mais recentes do Boletim Focus, o crescimento em 2022 não passará de 0,3% sobre os 4,5% da recuperação cíclica de 2021. Mas esta previsão vem recuando a cada semana e analistas influentes estão prevendo contração da economia de 0,5% em 2022.
Embora esteja em vigor um auxílio de R$ 400 mensais, as possibilidades de que essa transferência de renda impulsione a atividade, como ocorreu com o auxílio emergencial de R$ 600 mensais em 2020, são tidas como menores. A razão é o alcance mais restrito do auxílio atual. Basta observar que despesas com o auxílio de R$ 400 se limitam a R$ 55 bilhões no ano, enquanto o auxílio emergencial, em 2020, injetou quase R$ 300 bilhões na economia.
Além disso, as previsões são de estagnação no mercado de trabalho. Quando muito, segundo especialistas, a absorção de mão de obra desempregada se dará no mercado informal e em atividades menos qualificadas, com remuneração mais baixas. Caso essa expectativa se confirme, o impulso da demanda agregada sobre o crescimento da economia será limitado.
Incertezas, em relação à evolução da pandemia de covid-19, com o surgimento de variantes que, pelo contágio, possam prejudicar a retomada de setores da economia, como os vividos agora com a disseminação da variável ômicron, também retiram impulso do crescimento. Outras incertezas, como as políticas, em ano de disputa presidencial, operam na mesma direção adversa ao crescimento – e também quanto à inflação, pelo potencial de instabilidades nas cotações do dólar.
O quadro restritivo da atividade é reforçado pela perspectiva de que a política de juros do Banco Central se mantenha apertada, com taxas básicas elevadas. A taxa básica de juros (taxa Selic), que fechou 2021 em 9,25% nominais ao ano, de acordo com as previsões, só encerrará o atual longo e forte ciclo de altas, iniciado em março, com a Selic a 2%, perto de 12%, no primeiro semestre.
Esse tipo de ação, dita “contracionista” no jargão do mercado, objetiva retirar dinheiro de circulação, encarecendo o crédito e desestimulando investimentos, como forma de inibir a demanda e aliviar pressões inflacionárias. Ao mesmo tempo, contudo, uma política de juros contracionista também tende a ser inibidora do crescimento econômico.
JOSÉ PAULO KUPFER ” SITE DO UOL” ( BRASIL)