E me lembro que, há tempos, não vejo mais as fotos ridículas de Bretas mostrando os músculos. Sinal de que, ao menos o ridículo começa a ser extirpado da vida nacional.
Admito ter uma implicância visceral com os arrogantes, não apenas com o arrogante poderoso, mas com o arrogante sem status. Por isso mesmo, guardei para mim uma implicância profunda em relação a um contraparente do interior. E antes mesmo do fenômeno Bolsonaro.
Nunca fez nada para mim, na verdade nunca cheguei a trocar mais que meia dúzia de palavras com ele, mas até sua postura corporal era de arrogância. O que aconteceu com ele foi, simplesmente, que, morando em uma pequena cidade do interior, passou a ter acesso a informações “especiais” de grupos de WhatsApp – no caso, a ditos profundos do juiz Marcelo Bretas, um magistrado carioca que se notabilizou pelas fotos em academias, comprovando que pensava com os bíceps. Foi o que bastou para o contraparente se considerar “empoderado”.
Da Lava Jato para Bolsonaro foi um passo. E, aí, minha implicância aumentou de forma exponencial. Bolsonaro tornou-se sua influência absoluta, repetindo seus conceitos selvagens. Quem o conheceu antes do “empoderamento” garantia que era muito simpático e acessível antes do fenômeno do WhatsApp. Mas como era possível aquela transformação?
Vieram as eleições, a posse de Bolsonaro, a pandemia, as mortes, inclusive no seu entorno.
De repente, na volta à pequena cidade, encontramos um novo personagem, simpático, leve, acessível, divertido. Mais que isso, orgulhando-se das histórias do seu pai, policial, dos exemplos de generosidade, de acolhimento aos presos, a ponto de levar cobertores à cadeia, em tempos de frio. A surpresa maior não era a história em si, mas o orgulho do filho bolsonarista em relação a virtudes execradas pela selvageria bolsonarista.
Outros parentes diziam que ele voltou a ser o que era. O que determinou a transformação, a volta à normalidade?
Aí fico sabendo que abjurou o bolsonarismo, descontaminou-se. É impressionante! Lembra as cerimônias de exorcismo dos filmes de terror, com final feliz. Voltou a ficar leve – como diziam que era -, amistoso, defensor dos valores da solidariedade, da generosidade, orgulhoso das boas ações do pai.
Apenas confirma que o bolsonarismo é uma doença social. Não é algo intrínseco à sociedade brasileira, mas fruto de uma ignorância ancestral, que impede a avaliação correta de causas e consequências. A ignorância impedia o país de ver as consequências da Lava Jato, da política de guerra da mídia, do fenômeno Bolsonaro e até das críticas ao politicamente correto – isto é, aos valores que sustentam sociedades civilizadas.
Agora, à medida que a realidade estende seu manto pedagógico sobre o país, a grande noite do bolsonarismo vai se diluindo e a melhor parte do país se reencontra com os valores da civilização.
E me lembro que, há tempos, não vejo mais as fotos ridículas de Bretas mostrando os músculos. Sinal de que, ao menos o ridículo começa a ser extirpado da vida nacional.
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)