AS POLÍTICAS PÚBLICAS E A FALTA DE VISÃO SISTÊMICA

CHARGE DE CÍCERO

Outros programas que poderiam ter sido bem sucedidos – como a tentativa de transformar a Finep (Financiadora de Estudos e Pesquisas) – em um banco de desenvolvimento para a área tecnológica, falharam pela visão autocrática do governo e pela falta de diálogo com os clientes potenciais.

A separação entre o pensador e o palpiteiro reside na maior ou menor capacidade de trabalhar situações complexas. A maioria absoluta dos analistas midiáticos não consegue avançar além do enfoque único. O mesmo vale para a maioria das políticas públicas.

A primeira vez que vi a utilização competente do conceito de análise sistêmica foi com o grande Eliezer Baptista, o criador da Companhia Vale do Rio Doce. Nos estertores do governo Collor ele desenvolveu um plano sistêmico de criação de polos de desenvolvimento na fronteira com vizinhos latino-americanos. O trabalho ficou perdido em alguma gaveta do Palácio. Foi recuperado depois de um artigo que publiquei na Folha, após uma conversa com o engenheiro Pavão, que trabalhou no projeto com Eliezer. O então presidente do BNDES Luiz Carlos Mendonça de Barros pediu o trabalho que virou o programa Avança Brasil.

O trabalho identificava sete regiões com potencial de desenvolvimento. E concentrava, nelas, projetos de energia, telefonia, logística. Ao mesmo tempo, o BNDES identificava oportunidades  e criava uma carteira para projetos de investimento privado. Não foi adiante por outras razões, não pela concepção.

De maneira geral, a falta de visão sistêmica afeta a maioria dos programas públicos do país. Nem se fale da reforma do setor elétrico no governo Fernando Henrique Cardoso, que jogou o país em uma crise energética. Nos últimos governos, muitos programas não alcançaram seus objetivos por terem foco único, sem nenhuma forma de análise sistêmica ou de avaliações de suas externalidades – positivas ou negativas.

Um exemplo nítido foi a política dos campeões nacionais. Ajudou a transformar frigoríficos brasileiros em atores internacionais, mas à custa de uma ampla exploração dos fornecedores, pecuaristas, e de transtornos na indústria do couro e de derivados. Uma política sistêmica certamente trataria de desenvolver um modelo de apoio aos campeões nacionais, com inclusão de medidas de fortalecimento dos fornecedores.

Outro exemplo dos erros de políticas não sistêmicas foi o próprio Minha Casa, Minha Vida. O programa focou exclusivamente os custos financeiros e tributários, com isenção de tributos e financiamentos acessíveis. Não se levou em conta a questão urbana. O boom da política encareceu os terrenos urbanos,  expulsou inquilinos para a periferia e induziu à construção de conjuntos habitacionais em regiões distantes do centro e das ofertas de trabalho.

O mesmo ocorreu com os estímulos à indústria automobilística. Criaram-se incentivos sem nenhuma exigência de contrapartida – como, por exemplo, metas de exportação e emprego – e nenhuma preocupação com a mobilidade urbana e com inovações tecnológicas. Houve o aumento do congestionamento nas grandes cidades.

Na outra ponta, exemplo bem sucedido foi o Bolsa Família, articulando a montagem de uma grande base de dados de famílias carentes, a concatenação com a rede escolar. Em determinado momento, tentou-se até utilizar o banco de dados com as obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), permitindo identificar trabalhadores disponíveis para treinamento. Ao mesmo tempo, em parceria com universidades, foram criadas formas de controle eficientes.

Outro programa bem sucedido foi o Programa de Desenvolvimento Produtivo (PDP), uma formulação competentíssima da Fiocruz, contemplando o poder de compra do Sistema Único de Saúde, com negociações com grandes fornecedores, tendo como contrapartida a transferência de tecnologia para laboratórios públicos.

Outros programas que poderiam ter sido bem sucedidos – como a tentativa de transformar a Finep (Financiadora de Estudos e Pesquisas) – em um banco de desenvolvimento para a área tecnológica, falharam pela visão autocrática do governo e pela falta de diálogo com os clientes potenciais.

O IPCA 15

A prévia da inflação oficial – o Índice de Preços por Atacado 15 – mostrou que combustíveis continuam puxando a inflação. O índice foi de 1,2% no mês e 10,34% em 12 meses. Dos 98 grupos do índice, 8 registraram alta e apenas um registrou queda insignificante – Despesas Pessoais. 

No mês, o combustível representou 51,4% do índice.

No acumulado de 12 meses, 4 grupos registraram alta acima de 10%, um grupo alta entre 5% e 10% e 3 grupos entre 0% e 5%.

Nos últimos 6 meses, a inflação de 12 meses aumentou sistematicamente, saindo de 6,17% em abril para 10,05%.

LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)

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