O pandemônio na cena econômica, com reação barulhenta do mercado financeiro, é a representação do sequestro político do capitão pelo chefe da Câmara dos Deputados, o Lira, que tirou o dedo do botão amarelo, diante de retórica antidemocrática, e apertou o botão verde da gastança.
A ideia fixa de garantir mais quatro anos de poder – com todos os salamaleques e vantagens – é o propósito que norteia as decisões que agora turvam a visão de futuro do país, do ponto de vista de compromisso constitucional de uso do dinheiro público.
Os privilégios de bilhões de reais em emendas parlamentares criam um falso dilema, de que falta dinheiro para auxílio aos mais pobres. Os R$ 400,00 que o capitão quer entregar para comprar os votos da sua reeleição têm o custo embutido de dinheirama destinada aos senhores deputados, para comprar tratores e outros implementos, a preços que auditorias merecem conferir.
A ilusão do bom mocismo, de atender à tragédia previsível, que aumentou o fundo da pobreza, pela incompetência visível à luz do sol, com o anúncio de auxílios com feição de benemerência, tem apenas a finalidade de criar discurso de palanque.
Os senhores deputados, acostumados com a gala de Brasília, não querem perder a boquinha. E só pensam nisso, liderados por um determinado Lira, que já tem o plano escrito da própria reeleição à presidência da Câmara.
Um discurso para garantir aderência precisa de três elementos: coerência, consistência e congruência. A coerência é juntar lé com cré. Promessas devem ser consistentes com ações. E a comunicação congruente junta não apenas as ações e a lógica, mas os sentimentos que revelam a consciência do que se experimenta. Ou seja, não dá para mostrar o que não se acredita.
O capitão faz gestos, que pretende simbólicos, de apoio a uns e outros, para depois largar o sujeito no descampado. Ainda que abrigue um Pazuello sem função, mas com gratificação salarial que lhe permite usar a sua sala para fazer planos para disputar eleição. E fala que o seu ex-posto Ipiranga fica no governo. Soa a conversa de cartola falando de treinador derrotado, que continua prestigiado. Mas Guedes gosta do cargo, menos pela responsabilidade – coerência e consistência – com sua conversa de antes da eleição, e mais pelo desfrute (como o tal Queiroga).
No final das contas, quem vai mandando e tem a gaveta cheia de pedidos de impeachment, e agora o relatório da CPI da Pandemia, é o Lira, que sabe muito bem que pode mexer os seus cordões sem correr o risco de ser contrariado pelo capitão, que está com a corda no pescoço.
Lira pode ameaçar os colegas que não votaram a PEC 32 como ele queria, na vingança aos procuradores que pegaram no seu pé, nas Alagoas. Tem a caneta do orçamento das emendas dos tratores, das quais os deputados correm atrás; uma capacidade dissuasória que não tem rival. E tem todos e mais alguns argumentos para fazer o capitão piar fino.
Mas o capitão se esforça, convenhamos, em seduzir incautos. O último aceno foi o anúncio de um auxílio aos caminhoneiros, aqueles mesmo que convocava para fechar Congresso e o STF (Supremo Tribunal Federal), mas prontamente rechaçado.
O capitão tem pouco gás.
Mas nem tudo está perdido (fora das redes sociais).
O Aras, da PGR (Procuradoria Geral da República) – que sonha com emprego de ministro do STF (ainda!) – é o seu recurso para engavetar o relatório da CPI da Pandemia.
De um conhecido personagem de política, o ex-deputado Valdemar Costa Neto, dono do PL, condenado pelo mensalão, o capitão deve ganhar um partido para chamar de seu e, finalmente, ter uma legenda para concorrer ano que vem.
Enquanto isso, Lira banca o jogo.
O capitão quer parecer que manda, mas, o capitão é refém. A bola está no pé de Lira.
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