O negacionismo está fazendo água, mas ainda luta para manter o discurso.
Luciano Hang, bolsonarista negacionista de primeira hora, discretamente joga a toalha e anuncia que não sabe se vai continuar investindo em planos de ampliação a sua rede de lojas, depois de 2022.
Desconfia, como a maior parte dos brasileiros, que o capitão não venha a se reeleger. Fala, como a maioria dos investidores, que é preciso ambiente favorável para planejar a abertura de mais lojas, como era seu projeto. Diante dos senadores e das senadoras da CPI mostrou pouca confiança em que o capitão tenha mais um mandato. Não foi longe, apenas resumiu a sua ambição. Para bom entendedor…
Mas a postura dele diante da CPI deixou evidente a fonte do negacionismo e a maneira como funcionou a gestão da pandemia no Brasil, pelo capitão reformado.
A CPI da Pandemia foi o palco de um espetáculo de desfaçatez. No verde-amarelo sequestrado do vestuário de mau gosto do empresário, o país pode assistir, incrédulo, à prepotência ignorante de um negacionismo genocida.
O que se viu no depoimento de Luciano Hang, o dono das lojas Havan, foi um espetáculo de falta de educação, de maus modos, de tentativa circense de desrespeito institucional à CPI e de deslumbramento por ocupar a cena pública, como prócer do rei. Declarou sentir-se à vontade no Senado, como se fosse integrante da casa.
O empresário trouxer um exemplo de comportamento que não pode ser disseminado, às custas de causar dano a quem engole mentiras como se fossem verdades. Foram essas pessoas que, por ingenuidade ou por desejo de um milagre, se tornaram milhares de vítimas de uma pandemia que matou quase 600 mil pessoas no Brasil. Ele receitou, em mídias sociais, mostrando o próprio corpo como símbolo de cura fantasiosa. A mãe de Hang não sobreviveu ao tratamento preconizado por ele, internada na Prevent Senior.
O que se viu, em alguns momentos na CPI, foi bate-boca provocado pelo empresário-periquito, cujo intuito claro era confundir o público, tornando quase impossível a elucidação de fatos. Agiu, sendo a expressão ostensiva de um incensado modelo de governar, liderado pelo capitão: a tolice com ênfase, o grito e a repetição de pseudoverdades, com a apresentação de “estudos”, que passam distante do que a ciência recomenda, para justificar seus “tratamentos”.
O capitão pode comemorar o seu séquito à sua imagem e semelhança. São discípulos, como o tal Hang, vestido nas cores da bandeira, num acinte ao símbolo nacional, arrogante, voluntarioso, sem capacidade de utilizar os pronomes de tratamento ao falar com senadores e senadoras, e num tom desafiador, como se pudesse ganhar no grito. Assim como o chefe.
A CPI cai na provocação e dá espaço para que o verde-amarelismo conveniente de Hang crie confusão. A excitação de senadores e de senadoras, diante de gestos e meias palavras do interrogado, levou a que o tal empresário pudesse andar pelo palco com gestos de prima-dona.
O circo criado pelo Luciano Hang é mais uma tentativa de ocultar a razão pela qual o empresário é investigado pela CPI da Pandemia. Também não é à toa que o filho Zero Um do capitão esteve de plantão na sessão da CPI, como animador de auditório, para igualmente desviar as atenções para o que conta.
E o que conta: quem financia a difusão de mentiras pelas mídias sociais, que induziram milhares de pessoas a consumir medicamentos sem utilidade, e com risco para a saúde, no contágio do coronavírus? Era sabido pelo empresário que houve omissão de informação no atestado de óbito da mãe, para que a ineficácia da cloroquina ficasse evidente, no escândalo da Prevent Senior?
O empresário esquivou-se, inclusive de jurar falar a verdade na CPI. Negou-se a se comprometer com os fatos. Preparou um figurino: além do traje, vídeo de propaganda da empresa e cartazetes para provocar os senadores e senadoras e para atuar como personagem do circo que ele mesmo planejou.
O investigado Hang é um candidato sério a ocupar o lugar de financiador de mentiras e igualmente perverso, ao acolher mentira também no atestado de óbito da própria mãe, sem que a Covid-19, razão da sua internação, tenha sido mencionada no documento. Disse que fatura por dia, com as suas lojas, R$ 30 milhões e que gasta R$ 250 milhões por mês em divulgação. Mas não deu os endereços dos sites onde publica. Reconheceu, porém, que podia escolher onde divulgar.
A capacidade de Hang de gerar animosidade, na CPI, trazendo para si autoridade que não tem para disseminar e divulgar tratamentos “preventivo” e “precoce” foi, no seu depoimento, o coroamento do charlatanismo online.
Fica em aberto, ainda, saber como funciona a rede de mentiras que levou falsa esperança a milhões de pessoas, enquanto uns tantos lucravam.
A quem servem e como servem personagens menores, como esse tal Hang, que ocupam o tempo do país fazendo autopromoção e mentindo, para se manterem com as burras cheias?
A sessão continua. A disposição em seguir o rosário da mediocridade mingua.
OLGA CURADO ” SITE DO UOL” ( BRASIL)