Os tremores que se espalharam pelos mercados globais não se deve ao caso Evergrande em si, mas à enorme volatilidade de um mercado envolto em bolhas sucessivas. A grande bolha está fora da China.
Pelos padrões ocidentais, seria uma quebra capaz de chacoalhar os mercados, a exemplo do que ocorreu com a quebra da Lehman Brothers em 2008. Afinal, a Evergrande foi a grande empresa do boom imobiliário chinês, principal responsável pelo crescimento da economia chinesa nas últimas décadas e ainda respondendo por 28% do PIB (Produto Interno Bruto).
Esta semana, à beira da falência, com passivos estimados em inacreditáveis US$$ 300 bilhões, o espantalho da falência da empresa se espalhou pelo mundo. Atualmente ela tem 778 projetos em 223 cidades. Há um milhão de mutuários que poderão ficar desassistidos. No próximo mês, vencem US$ 129 milhões em pagamento de juros de títulos da dívida que vencem no período. Por qualquer padrão ocidental, haveria um cataclismo à vista.
Mas o modelo chinês é diferente.
A primeira diferença é em relação ao momento de enfrentar bolhas especulativas. Desde que a economia entrou na onda da desregulação, houve a ampliação das bolhas e a falta de instrumentos de intervenção dos governos nacionais. Só após o estouro, entravam em campo.
No caso da China, nos últimos anos o governo definiu o programa das “três linhas vermelhas”, destinado a desinflar as bolhas especulativas, especialmente no mercado imobiliário. Em 2017, a preocupação com bolhas imobiliárias levou o presidente Xi Jinping a apregoar que casas eram para morar, não para especular. A desaceleração do setor, nos últimos meses, foi justamente fruto de uma ação planejada das autoridades.
Ou seja, a crise da Evergrande é consequência da própria atuação do governo central.
No começo da pandemia, o governo chinês cortou as taxas de juros, especialmente dos financiamentos imobiliários, visando manter a economia aquecida. Em seguida, no entanto, decidiu aumentar as taxas para evitar a formação de bolhas especulativas. Definiu limites para os empréstimos hipotecários e também para os aluguéis nas grandes cidades. Obviamente, contendo o valor dos aluguéis, por tabela reduziu a bolha imobiliária.
Nas 70 maiores cidades da China, em agosto os preços de imóveis subiram apenas 0,2% em relação do mês anterior, depois de 8 meses de aceleração. De acordo com o National Bureau of Statistics, as vendas de novas casas caíram 24% em 30 cidades, em relação a 12 meses atrás; e a venda de terrenos caiu 53% em 100 cidades, enquanto os preços das novas casas aumentaram pela taxa mais lenta este ano.
Foi esse movimento que provocou o golpe final na Evergrande. Os preços de suas ações despencaram 90% nos últimos 6 meses,
De qualquer modo, a exemplo dos bancos norte-americanos na crise de 2008, a Evergrande é grande demais para falir. As discussões são sobre as formas de recuperá-la. Não se trata apenas do passivos da empresa, mas de um milhão de mutuários com casas inacabadas.
Os tremores que se espalharam pelos mercados globais não se deve ao caso Evergrande em si, mas à enorme volatilidade de um mercado envolto em bolhas sucessivas. A grande bolha está fora da China.
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)