Não resta dúvida de que os bolsonaristas preparam um ensaio geral do golpe no dia 7 de setembro. Mesmo que parte da articulação do ensaio golpista tenha sido desbaratada com a prisão de Roberto Jefferson e com a operação da PF desencadeada por Alexandre de Moraes contra Sérgio Reis, Otoni de Paula, Antônio Galvan, entre outros, o movimento está mantido. Pretende-se mobilizar parte dos caminhoneiros, militares da reserva, policiais da reserva e da ativa, motoqueiros, setores ruralistas e radicais de extrema-direita em geral.
Esse ensaio golpista pressupõe um discurso radical e instigador de Bolsonaro num contexto em que militares estão nas ruas por conta dos desfiles do dia da Independência. Quer-se uma demonstração de força, com dois objetivos: 1) intimidar o STF, outras autoridades, os políticos e sociedade em geral e, 2) promover uma propaganda do golpe pela demonstração de força, insinuando o apoio das Forças Armadas.
Bolsonaro trabalha com uma única lógica: o golpe. Quando mais percebe que não vencerá as eleições, mais aprofundará esta lógica. Esta é uma estratégia da extrema-direita internacional. Age para minar e destruir as instituições democráticas por dentro, quando está no poder, e se não consegue apossar-se integralmente dele, promove atos golpistas. Foi o que tentou Trump após perder as eleições. Todo cálculo e movimento políticos de Bolsonaro se movem nesse sentido. O ingresso do centrão no governo não visa uma aliança político-programática. Visa apenas impedir o impeachment e garantir a sobrevivência de Bolsonaro.
Embora Bolsonaro não conte com as Forças Armadas, enquanto instituição, para sua aventura golpista, o seu movimento não pode ser subestimado, por duas razões. Primeira: ele tem poder de mobilização de grupos radicais que podem desencadear ações violentas e provocar danos graves às pessoas e às instituições, desmoralizando ainda mais o Brasil no mundo.
Segunda: golpes não se sabe como começam e nem como terminam. Movimentos golpistas, mesmo que inicialmente possam ter forças relativamente pequenas, podem se tornar vitoriosos se não encontrarem resistência pela frente. Ocorre que nas ações de força, parte dos militares neutros e até da sociedade tendem a pender para o lado que mostrar força e possibilidade de vitória. Será um erro gravíssimo se as forças democráticas ficarem inertes ou confiarem apenas ao STF a tarefa de deter Bolsonaro.
Não se pode enfrentar a ousadia dos celerados e dos criminosos com passividade e com o medo dos democratas. Nesse momento são necessárias ações preventivas em defesa da democracia e do Estado de Direito, a exemplo dessas que o STF vem adotando. Mas são necessárias também iniciativas no âmbito do Congresso, entre os paridos políticos, os movimentos sociais, as instituições da sociedade civil e articulação dos governadores. Somente a união dos democratas poderá deter a sanha golpista de Bolsonaro e desestimular que grupos sociais e políticos se engajem nessa aventura criminosa.
No Chile, os locautes dos caminhoneiros, em 1972 e em 1973, foram a antessala do golpe. Aqui, pretende-se mobilizar caminhoneiros para bloqueios visando pressionar o Senado a cassar os juízes do STF e, se for o caso, invadir o próprio Supremo.
No se pode considerar que o que disse Sérgio Reis são bravatas de um cantor sertanejo. Ocorreram reuniões em Brasília com a presença de militares e, inclusive, com a participação do general Augusto Heleno. É dever dos parlamentares convocar o general para que forneça as devidas explicações acerca de sua participação nesse movimento golpista.
A história dos golpes na América Latina mostra que as instituições e as forças democráticas só tentaram reagir a eles depois que os atos de força foram consumados. Essas reações fracassaram, pois é difícil enfrentar, sem grandes mobilizações populares, forças armadas estabelecidas no poder. Em 1964 forças sociais e até militares garantiam que resistiriam ao golpe se este ocorresse. O golpe ocorreu e nenhuma resistência significativa reagiu. Em 2016 não houve reação ao golpe parlamentar que tirou Dilma do poder. Os atos de defesa do governo que antecederam o impeachment foram frágeis. No pós-impeachment também não ocorreram reações.
Tudo isso ensina que a defesa da democracia e do Estado de Direito, e a sua garantia, precisam ocorrer antes que o golpe aconteça. A ação preventiva contra golpes será eficaz se ocorrerem dois movimentos. De um lado, as autoridades, principalmente o Judiciário, mas também os políticos, precisam cumprir seus deveres constitucionais na defesa da democracia e da Constituição. O STF vem se mostrando assertivo nos últimos tempos. Mas, no Congresso, somente um punhado de deputados e senadores adotam posturas mais incisivas para deter o golpismo de Bolsonaro.
De outro, somente o povo mobilizado e organizado pode impor temor aos golpistas. Golpistas e tiranos sempre temeram a ira dos povos. Hoje existe uma maioria significativa e crescente contrária a Bolsonaro. Existe também uma maioria que não quer os militares na política. No entanto, não é uma maioria mobilizada. Para que esta maioria se transforme em força política e em barreira de contenção, precisa ser mobilizada. Precisa ser transformada em força política ativa.
É responsabilidade das lideranças políticas e sociais comandar processos e iniciativas que mobilizem setores significativos da sociedade na defesa da democracia e do Estado de Direito. Se os bolsonaristas querem fazer do dia 7 de Setembro um marco do ensaio golpista, os democratas precisam fazer dele um marco da defesa da democracia.
Os atos de defesa da democracia do dia 7 de Setembro precisam ser planejados, com mobilizações prévias, com ampla convocação, com politização acerca do seu significado. As principais lideranças políticas e sociais do país precisam se engajar na convocação. Será uma dolorosa e vergonhosa derrota política se os atos dos bolsonaristas e golpistas forem maiores do que os atos em defesa da democracia.
ALDO FORNAZIERI ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)