Parecia um filme de época, uma tragicomédia _ da época da Primeira Guerra Mundial, quando ainda imperavam tanques e canhões.
Sem ter mais nada para fazer, o capitão que nos desgoverna resolveu dar nesta terça-feira mais uma “demonstração de força” da sua fraqueza e covardia. Na verdade, um escalafobético desfile militar, fora de tempo e lugar, para afrontar e intimidar as instituições nacionais, mas que só serviu para assombrar os parvos e nos fazer passar vergonha perante o mundo inteiro.
Ainda bem que o patético comboio de ferro velho e muita fumaça durou apenas 10 minutos de vexame, o suficiente para a gente se perguntar: o que, afinal, os militares fizeram com as toneladas de dinheiro, um saco sem fundo destinado todos os anos para “modernizar e reequipar” a nossa frota de combate e proteger a soberania nacional?
Me deu a impressão de que gastaram tudo em comes e bebes da mais fina qualidade, cursos e viagens ao exterior, régios pagamentos de inativos e seus descendentes, uniformes de gala e penduricalhos, soldos e salários de mais de R$ 100 mil por mês para os altos oficiais palacianos, manutenção dos quartéis e das mordomias, medalhas mil e outras inutilidades.
Perfilado no alto da rampa do Palácio do Planalto, qual um napoleão tropical, ao lado de seus comandantes militares, o capitão insubordinado mirava o prédio do Supremo Tribunal Federal, alvo da sua guerra particular em defesa do “voto impresso”, a sua obsessão do momento.
No fundo, ele deveria estar achando tudo muito engraçado _ a sua grande vingança contra os generais que nunca o levaram a sério e o defenestraram do Exército. O que pensaria dessa cena o imponente general Ernesto Geisel, que o qualificou como “mau militar” em suas memórias?
Líder sindical de militares e policiais de baixa patente, fracassado como deputado e agora como presidente da República, nas últimas semanas Bolsonaro resolveu declarar guerra ao próprio país. E nada poderia desmoralizar mais as nossas Forças Armadas do que obrigá-las a participar desta pantomima.
Se algum inimigo externo visse aquele corso mambembe, certamente nossas fronteiras estariam agora mais ameaçadas do que nunca.
O Paraguai poderia ir à forra e retomar as suas terras conquistadas na única guerra de verdade de que as nossas tropas já participaram, no século retrasado (na Segunda Guerra, fomos apenas forças auxiliares das grandes potências, na luta contra o nazifascismo, que ironia…).
Várias vezes nos últimos tempos questionei aqui qual deveria ser o papel e o tamanho das Forças Armadas em tempos de paz.
Quando se discute a relação custo-benefício, lembram logo a defesa das nossas fronteiras, mais furadas do que queijo suíço, e da Amazônia, cada vez mais desmatada e queimada, na construção de pequenas pontes e trechos de estradas secundárias.
Quando convocados por Bolsonaro para enfrentar a grave crise sanitária provocada pela pandemia, sob o comando, no Ministério da Saúde, do inacreditável general Eduardo Pazuello e sua tropa de coronéis “facilitadores”, os militares deram uma grande demonstração de incompetência e ganância.
Com mais de 6 mil militares espalhados por todo o governo federal em cargos civis, cabe perguntar também o que se ensina hoje nas escolas militares que formaram Bolsonaro, Mourão, Villas Boas, Pazuelllo, Braga Netto, Heleninho, Ramos e cia.
Ao pegar carona na barca furada do capitão em 2018, levados pelo general Villas Boas e seus tuites estratégicos, os generais bolsonaristas pegaram um caminho sem volta e levaram o país a uma encruzilhada da qual agora não conseguem sair.
Até quando os outros milhares de militares, que não se associaram ao Centrão, vão continuar participando dessa trágica farsa fardada, que transformou o país num campo de provas da insânia de um capitão ressentido e alucinado que odeia os brasileiros?
RICARDO KOTSCHO ” SITE DO UOL” ( BRASIL)