Romperam-se os três pilares de sustentação do projeto de poder de Jair Bolsonaro, com base nos quais montou a bem sucedida estratégia para se catapultar do semianonimato do baixo clero à Presidência da República, nas eleições de 2018.
O presidente não consegue mais ser minimamente convincente ao falar sobre o combate à corrupção. Soa falso, é postiço. Sabe-se que não há consistência tampouco sinceridade na pregação por moralidade. Bolsonaro, seus amigos e seus aliados têm trajetórias pontuadas por casos de malversação de recursos públicos – uns mais, outros menos, mas todos com alguma passagem incômoda pelo tema.
O Governo Bolsonaro também já não representa qualquer sinal de mudança nas práticas nocivas ao interesse coletivo que capturaram a máquina pública do Estado brasileiro. Incorporou à rotina da administração métodos sabidamente inadequados, antirrepublicanos – reprovados amplamente pela sociedade. Até mesmo na relação político-parlamentar cedeu aos ensinamentos franciscanos, entoando com desembaraço as palavras de ordem do centrão, notadamente o “é dando que se recebe”.
Aos poucos, os slogans de campanha – éticos e atraentes – sucumbiram, fazendo tombar a ideia de que representava uma troca de paradigmas na administração pública. O fim do que vagamente definiu como velha política. No poder, Bolsonaro se aclimatou ao ambiente insalubre da negociação escusa. Aliou-se aos piores quadros do Congresso Nacional na tentativa de erguer sua base de sustentação. A amálgama perfeita da aliança mostrou a natureza única das partes. Não há distinção ética entre bolsonarismo e fisiologismo. São partes de um mesmo corpo, uma estrovenga a serviço quase sempre do atraso nos costumes e das espertezas comuns à corrupção no serviço público.
Se a CPI não resultar na aprovação do impeachment de Jair Bolsonaro, terá ao menos contribuído para assentar o conceito de que ele repete práticas perniciosas, contra as quais se dizia implacável combatente. A narrativa de que seu governo, autocrático na forma e caótico nos resultados, seria incorruptível acabou. A venda da carteira do Banco do Brasil, de R$ 3 bilhões por R$ 271 milhões; as denúncias de contrabando envolvendo o ex-ministro Salles, e, agora, a propina na compra de vacinas são os casos mais vistosos a ilustrar a corrupção governamental. Se o discurso era de mudança, a prática é de mais do mesmo. Perpetuam-se vícios e métodos do que há de pior na política nacional.
O exercício do poder contribuiu para revelar a verdadeira e única face de Jair Bolsonaro. Grande parte dos que se enganaram em 2018, hoje está convencida de que fora vítima de um embuste. Coube a seu próprio governo provar a empulhação. O candidato manipulou a realidade para tentar pespegar no principal partido da oposição – o PT – a pecha de radical, intransigente – uma ameaça às instituições a partir, supostamente, do avanço de um projeto de poder nitidamente de esquerda, a tal venezuelização. Alguns incautos acreditaram e lhe emprestaram apoio nas urnas. Estão frustrados e arrependidos.
Hoje, ele, Bolsonaro, representa a maior ameaça à democracia brasileira. Menoscaba as instituições, menospreza as minorias e achincalha o estado democrático de direito com assaques pérfidos e autoritários. Sem êxito, traveste-se diariamente de ditador na esperança de incorporar o personagem na vida real. Vigilantes, as instituições não permitem: enquadram-no; retiram-lhe a fantasia, trazendo-o de volta à práxis democrática.
Quando disputam pela primeira vez eleições majoritárias, os candidatos vencem pela esperança que despertam. O pleito contrasta valores abstratos do opositor com a realidade do mandatário de plantão. Bolsonaro traiu seu próprio ideário. Não inspira mais confiança nos estratos médios da sociedade, como em 2018.
Na reeleição, há mais pragmatismo. O que prevalece é o resultado, o saldo objetivo dos avanços do primeiro mandato. Não há como inspirar confiança diante de um governo rotundamente falido.
Com a administração maculada pela corrupção, a economia em frangalhos, desemprego galopante, e sem realizações a mostrar, Bolsonaro dá sinais de exaustão. Acuado com os casos de corrupção, não lhe restam muitas saídas. Daí a destemperança, os gritos, as bravatas cada vez mais intensas. A fúria dos ataques do presidente à CPI é um sintoma patológico, uma espécie de convulsão catatônica que prenuncia a falência terminal das forças daquilo que se conhece como bolsonarismo. Não por acaso, Carla Zambelli, expoente do grupo no parlamento, pede orações. Bolsonaro está desenganado.
RICARDO BRUNO ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)
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