Moon providenciou um aumento no salário mínimo, de 2% acima da inflação e decidiu tributar ganhos de capital e ganhos imobiliários. Seu programa foi apresentado como modelar pela OCDE. Graças a assim, o PIB da Coreia do Sul saltou de 12o para 9o lugar, ocupando a classificação do Brasil. E aparentemente estava garantida a eleição de 2022 para seu partido.
Qualquer semelhança não é mera coincidência:
1. Até final dos anos 80 a Coreia do Sul implementou um projeto de desenvolvimento bem sucedido, comandado pelo general Park Chung-hee, que governou o país ditatorialmente dos anos 60 até 1979, quando foi assassinado.
2. O país ultrapassou a armadilha da renda média. Mas, a partir dos anos 90, foi submetido a uma série de reformas liberais que desmontaram o mercado de trabalho, jogando 40% da força de trabalho na informalidade. Houve um aumento substancial da pobreza e da concentração de renda, retratados no filme “Parasita’, vencedor do último Oscar. O desfecho foi a grande crise de 1996 e 1997 e uma perda brutal do dinamismo da economia.
3. Em 2012, novas eleições foram vencidas pela presidente Park Geun-hye.
4. Historicamente sempre houve uma convivência estreita entre grandes grupos coreanos, denominados de Chaebol, e governo federal. Sua criação foi uma parceria entre Estado e família coreanas. Dai resultaram sucessos globais como a Samsung, Hyundai Motor Company, LG, SK, Hanjin, Hyundai Heavy Industries, Lotte, Doosan, Hanhwa, e Kumho Asiana. Em 2016, surpreendentemente, o Ministério Público passou a investir agressivamente contra a presidente e o grupo Samsung. Executivos da Samsung foram presos fora da Coreia, houve uma parceria radical com a mídia que acabou levando à queda da presidente da República, e sua posterior condenação. Em 2017, o MPF conseguiu a prisão do vice-presidente e herdeiro da Samsung, Lee Jan-Yong. A acusação foi a de ter sido apoiado por um fundo de pensão estatal em uma fusão com a empresa Cheil Industries em 2015. O Lawfare prosseguiu com indiciamento de 31 diretores da Samsung por supostamente violarem leis trabalhistas. Toda a operação foi diretamente coordenada pelo Procurador Geral.
5. Parênteses breve: Em 2017, o PGR Janot encontrou-se com o PGR da Coreia do Sul na reunião do Comitê Executivo da Associação Internacional de Procuradores, na cidade de Busan, Coreia do Sul. O comitê é formado por membros de Ministérios Públicos da Coreia do Sul, Estados Unidos, Bélgica, Rússia, África do Sul, Emirados Árabes Unidos, Canadá, Azerbaijão, França e Argentina. No site da IAP, a frase de abertura é: “Elevando os padrões para promotores em todo o mundo; melhorando a cooperação internacional para combater o crime”. Entre seus objetivos, estão temas como “promover e aprimorar os padrões e princípios geralmente reconhecidos internacionalmente como necessários para o julgamento adequado e independente de crimes”, e todo um decálogo.
6. Foram providenciadas novas eleições em 2017 mas ocorreu o ponto fora da curva, a eleição do de Moon Jae-in, candidato derrotado em 2012, e com forte viés desenvolvimentista. Ele foi eleito prometendo devolver os direitos trabalhistas, retomar políticas desenvolvimentistas, lutar pela unificação com a Coreia da Noite e implantar uma pauta moral mais moderna, com a descriminalização do aborto.
7. Aí sobreveio a crise do Covid-19. Com a economia fortemente dependendo das exportações – elas representam 40% do PIB -, houve uma queda do PIB. A mídia sul-coreana imediatamente tratou de relacionar a queda do PIB com as mudanças nas leis trabalhistas.
8. No início da pandemia, a taxa de desemprego era de 4,1%. Surpreendendo a muitos, Moon lança o New Deal Sul Coreano, de 10% do PIB de investimento em 4 anos, US$ 160 milhões para dinamizar economia digital, desenvolvimento sustentável, fortalecer as cadeias produtivas internas e gerar 1,9 milhão de empregos, 1,5 milhão dos quais no setor público. No segundo semestre, o PIB caiu 2,3%, mas ainda assim a taxa de desemprego caiu para 3,7%. Mais que isso, Moon providenciou um aumento no salário mínimo, de 2% acima da inflação e decidiu tributar ganhos de capital e ganhos imobiliários. Seu programa foi apresentado como modelar pela OCDE. Graças a assim, o PIB da Coreia do Sul saltou de 12o para 9o lugar, ocupando a classificação do Brasil. E aparentemente estava garantida a eleição de 2022 para seu partido.
9. Como consequência, ampliou-se a perseguição penal por parte do Procurador Geral da República e a mídia coreana passou a dar cobertura diária às denúncias de corrupção e de investimento na imagem do PGR. Ao mesmo tempo, com 35% da população coreana professando a fé evangélica, a mídia passou a explorar pesadamente a pauta moral – investindo contra a decisão de descriminalizar o aborto e boicotando o isolamento social.
10. Para completar o quadro, Moon divulgou uma carta aberta contra o boicote americano à Huawei, acirrando a disputa com os EUA.
11.Na sequencia, o PGR ampliou a ofensiva contra o governo. Descobriu-se que ele estava levantando informações pessoais sobre juízes, para pressioná-los a apoiar as ações dos procuradores contra o presidente Moon. Resultou em suspensão do PGR por dois meses, contra a qual ele reagiu com apoio da imprensa.
10. Agora, há uma contagem regressiva para as eleições de 2022. A suspensão do PGR e o carnaval da mídia colocam o Sérgio Moro coreano na frente nas pesquisas de opinião. Candidato ligados a Moon vêm longo atrás. Nas 51% da população diz que votará em candidatos de pautas conservadoras.
Tudo dependerá do comportamento da economia em 2021.
Esse belo relato – em entrevista com o economista Ualace Moreira, da Universidade Federal da Bahia, autor de uma tese de doutorado na Unicamp sobre a Coreia do Sul – mostra situações muitíssimo parecidas com a brasileira, o uso da religião, das pautas morais, o Lawfare de procuradores, reunidos em associações internacionais, a parceria mídia-mercado-procuradores, as parcerias com procuradores de outros países, especialmente com o Departamento de Estado norte-americano, a campanha negativa contra qualquer pauta social.
Mas, como diriam os idiotas da objetividade, trata-se apenas da confluência de tendências globais, a chamada mão invisível da sociologia.
Da fase pré-Vaza Jato:
Celso Rocha de Barros, colunista da Folha
Haddad ficou aquele tempo todo na USP lendo Habermas para mandarem ele agora ir lá na frente de todo mundo dizer que o Moro é agente da CIA?
Sergio Fausto, diretor do Instituto Fernando Henrique Cardoso
Então, para ele (Haddad), é uma situação muito difícil, porque ele não pode ser candidato de um partido que quer fazer um discurso a favor da Venezuela, dizendo que o que há no Brasil é o controle do governo brasileiro pelos Estados Unidos, que a Lava Jato é uma emanação da CIA que visa desnacionalizar a Petrobras. Isso é um discurso delirante, retrógrado.
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)