A Globo está sendo destruída pelos que a ergueram para o sucesso e a glória: os militares, dos quais se distanciou na Nova República, assinando sua sentença e sua agonia.
Sua danação se iniciou quando vomitou as forças nacionalistas militares ditatoriais que a sustentaram e se rendeu, para derrota-los, ao Consenso de Washington, apoiando, contraditoriamente, destruição econômica da Nova República, afetada pelo neoliberalismo antinacionalista.
A debacle política da emissora vem sendo amadurecida desde os anos 1980, embora, nesse período, tenha se transformado em potência econômica; experimenta, agora, a força superior do poder político sobre o econômico, sob o governo do capitão Bolsonaro.
Já no final da era ditatorial, início da Nova República, jogou por terra sua própria origem: nascera do tripé econômico – nacionalismo militar ditatorial/capital nacional/capital estrangeiro – e começou a dançar quando se arrependeu de ter apoiado o golpe contra a democracia, que ajudou a enterrar.
Os militares criaram a Rede Globo para desbancar a TV Tupi, de Assis Chateaubriand, e outros canais televisivos periféricos que se consolidavam, no ambiente democrático, pré-derrubada de Jango Goulart, em 1964, em aliança militares-Washington-burguesia nacional.
A política de comunicação, então, predominante na Era Vargas, seguindo com JK e quase se consolidando com Jango, obedecia, sem dúvida, a orientação trabalhista nacionalista getulista, iniciada com a Rádio Nacional, na qual se pontificava a cultura brasileira em sua essência fulgurante.
Comunicação nacionalista varguista
Os golpistas americanos, conscientes do poder de comunicação nacionalista, desenvolvido nos Estados Unidos, pelo setor privado, a serviço do Estado expansionista de Tio Sam, no pós-guerra, tinham por fim ganhar, no Brasil, a batalha da comunicação contra Getúlio.
Tal tentativa tinha Hollywood como plataforma de propaganda do American Way of Life, atrelado à ideologia democrática neoliberal, já nos anos 1940/1950.
Washington tentava zecariocar as comunicações no Brasil, para atrair Getúlio Vargas a entrar na guerra contra o Eixo fascista; porém, a força cultural varguista da Rádio Nacional, inaugurada com a revolução nacionalista de 1930, acabou preponderando até 1964.
Astuto, Gegê negociou o apoio a Washington, como queria Roosevelt, em troca da industrialização nacional, com apoio americano para construção de Volta Redonda; fortalecia-se o nacionalismo ao qual Washington pretendia esvaziar, até conseguir, depois de matar Getúlio, levando-o ao suicídio, em 1954, como estratégia de sacrifício pessoal para barrar desnacionalização da Petrobrás.
Ainda na Era JK(1956-1960), as comunicações, embaladas pelo espírito nacionalista, viveria a época de ouro cultural brasileira, fortalecendo, ainda mais, a autoestima nacional, até que o golpe em Jango, em 1964, impôs a nova ordem.
Americanização cultural
Desde então, a americanização tomou conta das comunicações, e a Rede Globo nasceu, do ventre da Time-Life, para fazer esse papel de alienar a cabeça nacional, afastando-a do nacionalismo getulista para dar lugar ao obscurantismo militar, que, ainda, assim, no plano econômico, seguiu as pegadas nacionalistas de Getúlio, especialmente, com o imperador Geisel.
A Globo viveria, na era militar, sua fase áurea, mas, depois do golpe monetário dos anos 1970, em que os Estados Unidos descolaram o dólar do ouro e deixaram a moeda flutuar, para, em seguida, puxar os juros de 6% ao ano para 22%, em 1979, a situação econômica, com os militares, sofreu um baque.
A economia nacional endividada por empréstimos externos a juros baixos, para produzir o milagre econômico, via construção de empresas estatais, entrou em buraqueira; consequentemente, a ditadura caiu de podre, afundando a economia na dívida externa impagável.
Emergiram os governos civis neorrepublicanos populistas fragilizados para administrar a massa falida, sob obrigação de se submeterem às novas ordens emanadas pelo Consenso de Washington, como relata o então embaixador brasileiro, nos Estados Unidos, Paulo Nogueira Batista, no seu livro “O Consenso de Washington – A visão neoliberal dos problemas latino-americanos”.
A Globo, a partir de então, desgarrou-se dos militares, em desgraça, e aninhou-se, completamente, à nova ordem, para monitorar, como porta-voz da Casa Branca, os governos civis – Sarney, Collor, FHC, Lula, Dilma e Temer, o golpista –, até que tudo começou a inverter-se com Bolsonaro.
Ditadores x Democratas
No poder, o capitão extravasou velha mágoa por ter a Globo renegado o golpe de 64, sem o qual não se teria tornado império de comunicação, e se rendido ao Consenso de Washington, no Governo FHC; o neoliberal tucano colheu o ódio dos militares ao defender que as Forças Armadas deixassem de exercer papel estratégico soberano, para se transformar em polícia de quarteirão, com aplauso de influentes jornalistas tucanos, como Élio Gaspari.
Bolsonaro chegou a dizer que seu sonho era matar FHC, e esse sentimento bolsonarista se tornou comum na tropa, considerada, pelo Consenso de Washington, perfeitamente, dispensável.
A repugnância militar à Nova República, somente, seria amenizada no Governo Lula, que aprovou, no Congresso, em 2005 e em 2007, o Plano Nacional de Defesa(PND) e a Estratégia de Defesa Nacional(EDN); ambas iniciativas políticas estratégicas lulista atendiam as principais demandas das forças armadas: expansão da cibernética(Exército); construção do submarino atômico(Marinha) e compra de caças supersônicos(Aeronáutica), como combinação articulada da defesa do território nacional; Lula fortaleceu os pressupostos essenciais dos militares no campo da soberania nacional, contrariando, portanto, Washington, a quem FHC havia se rendido.
Os americanos, vocalizados pela Globo, cuidaram de demonizar Lula, ligando-o a Geisel, que havia contrariado Governo Carter(1977-1981), ao romper com os Estados Unidos, para fazer acordo nuclear com Alemanha.
A incompatibilidade dos militares com o PT, porém, se acentuaria no governo Dilma, com a questão da Anistia, conduzida, politicamente, em desacordo com aqueles que sempre se julgaram guardiães da pátria, desde a Guerra do Paraguai(1864-1870).
Ojeriza militar aos Marinho
Durante todo esse período, em tempos de redemocratização, consubstanciados com posição da Rede Globo, fechada com Washington, contrária aos interesses dos militares, aos quais Lula atendera, Bolsonaro alimentou revanchismo em relação aos irmãos Marinho.
No poder, agora, o capitão presidente dá vazão a sua vingança: trabalha para não renovar concessão da emissora, que vence em 2021, fecha todos os canais de contato à família Marinho, nega resposta às indagações dos repórteres da emissão e, claro, empurra o Grupo Globo para a ponta da praia; tenta leva-lo a passar seu negócio para terceiros, como especula, com razoável lógica, o repórter Luís Nassif, da TV GGN.
Em meio às incertezas que cercam a Globo, avançam providências dos Marinho rumo a uma fuga do perigo dos riscos que se acumulam.
Demissões de funcionários, maior fonte de despesas da emissora, dependente da expansão de serviços, como fonte de renda, multiplicada pelo valor-trabalho dos seus competentes trabalhadores, e todas as consequências que tal situação produz, em matéria de queda de qualidade dos serviços etc, jogam o império de comunicação em completa falta de expectativas e perspectivas.
Luta encarniçada
A decisão dos Marinho de ir à luta contra o capitão presidente, para tentar derrubá-lo, o mais rápido possível, para que não se crie condições favoráveis à reeleição dele, vira obsessão crescente, no compasso do pânico que toma conta da empresa, sem nenhum apetite para novos investimentos, a fim de não jogar dinheiro fora.
O apelo à repetição de programações antigas e a insistência numa linha editorial neoliberal antinacionalista, contrária ao interesse social, vai, ao mesmo tempo, vulnerabilizando a Globo, agora, diante da sua maior concorrente, a CNN, de bem com Bolsonaro e super-capitalizada em dólar, para enfrentá-la, desbancando-a do mercado, se preciso.
Na prática, Bolsonaro pisa no pescoço dos Marinho, asfixiando-os, enquanto visita seus concorrentes, Silvio Santos, o Bispo Macedo, etc.
O oligopólio neoliberal midiático aguentará até quando, ou a CNN poderá, brevemente, engoli-lo, numa disputa de gigantes?
Seria a ressurreição do grupo Time-Life?
Ou vem aí, quem sabe, capital chinês, para comprar a Globo e dar um cavalo de pau no mercado de informação, polarizando guerra geopolítica midiática China-Estados Unidos, na América do Sul?
Todas especulações estão valendo.
CÉSAR FONSECA ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)