Na guerra fraticida entre Bolsonaro e a Globo, agora chegou a vez do futebol.
E a principal vítima é o telespectador, que vai pagar mais caro para acompanhar os jogos do seu time.
Ao tirar da Globo a transmissão da final do campeonato carioca contra o Fluminense, em junho, o presidente do Flamengo, Rodolfo Landim, numa operação casada com o presidente Jair Bolsonaro para implantar a Lei do Mandante, abriu a porteira para bagunçar o mercado de futebol na TV, que era um quase monopólio do Grupo Globo.
Com o Ministério das Comunicações entregue a Fábio Faria, um deputado do Centrão que é genro de Silvio Santos, quem saiu ganhando foi o SBT, que ficou não só com a transmissão de Flamengo e Fluminense, mas em seguida comprou os direitos da Libertadores e agora disputa com a Globo outros campeonatos.
Até outro dia, os principais jogos de futebol passavam na Globo e ninguém precisava ficar zapeando por 500 canais nem procurando na internet, mas agora surgiram 14 opções em canais abertos e fechados canais abertos e fechados, a maioria deles pagos.
Era de se esperar que, com o aumento da concorrência, os preços dos pacotes fossem cair, mas aconteceu exatamente o contrário, como mostra a matéria “Ver futebol fica mais caro com direitos divididos com streaming”, de Luciano Trindade, na Folha.
“A criação de novos canais e serviços de streaming especializados em jogos de futebol e a consequente fragmentação dos direitos de TV dos principais torneios tornou mais caro para os torcedores acompanhar as partidas.
Na maioria dos casos, o cliente precisa ser assinante de uma das operadoras e comprar um pacote de pay-per-view das diferentes competições. Se o seu time disputa diferentes campeonatos, azar dele.
Na quinta-feira, pela primeira vez, um jogo da seleção brasileira pelas eliminatórias da Copa de 2002, não passou nos canais da Globo e apareceu, de repente, na TV Brasil, a emissora do governo que Bolsonaro pretendia fechar porque era chamada de TV Lula.
Durante todo o dia, informou-se que o jogo só seria transmitido pelo El Plus, serviço de streaming do Esporte Interativo, e pelo El Canal del Fútbol, no YouTube, em língua espanhola.
Foi quando entrou em ação o secretário-executivo do Ministério das Comunicações, Fábio Wajngarten, e resolveu transformar o jogo da seleção num grande comercial de propaganda do governo, no melhor estilo da TV da Coréia do Norte.
Não foi fácil. Os direitos de transmissão pertencem a uma empresa indicada pela Federação Peruana de Futebol, que queria cobrar uma fortuna pela transmissão, o que fez a Globo desistir do negócio.
Como que por encanto, de uma hora para outra a TV Brasil ganhou o direito de passar o jogo, graças a um “agrado da CBF”, segundo o seu presidente, Rogério Caboclo, que nunca saberemos quanto custou.
Chamaram às pressas um narrador para transmitir o jogo dos estúdios da emissora, ao lado do comentarista Márcio Guedes, um ex-jornalista em atividade, que faz a defesa do governo em suas redes sociais e ataca os “comunistas” da mídia.
Durante toda a partida e no intervalo, os dois deram um deprimente show de sabujice, agradecendo a toda hora a Wajgarten e Caboclo, e mandando “abraços especiais” ao presidente Jair Bolsonaro.
O futebol entrava assim, oficialmente, na campanha pela reeleição, como se fosse uma antecipação do horário da propaganda eleitoral gratuita, dois anos antes do pleito.
Márcio Guedes exagerou na patriotada e provocou a indignação do jornalista José Trajano, meu colega aqui do UOL, que escreveu em sua rede social:
“Registro com pesar que Márcio deixa a profissão saindo pela porta dos fundos. Sua pusilanimidade na transmissão do jogo de ontem (aliás, quanto pagaram e quem pagou pela transmissão?), ao passar o pano para o Capitão Corona, dizendo com satisfação e orgulho os times pelos quais o tresloucado torce, me enojou”.
Tive o mesmo sentimento como jornalista e ex-colega de Márcio Guedes nos velhos tempos do Estadão, e fiquei impressionado como uma pessoa pode mudar tanto na vida para agradar aos poderosos de plantão.
Só o que não muda é a obsessão do Grupo Globo para mandar Lula de volta à cadeia, ao mobilizar todos os seus comentaristas no lobby com discurso único para apressar a mudança da lei sobre a prisão após condenação em segunda instância, a pretexto da aloprada libertação do traficante André do Rap.
Um dos principais responsáveis pela eleição de Bolsonaro, que usa de todos os meios para asfixiar economicamente a empresa e não vai sossegar enquanto não cassar a concessão da emissora em 2022, a Globo parece que sofre da Síndrome de Estocolmo.
Mesmo apanhando dele como cachorro magro, a Globo quer porque quer tirar Lula de cena para quê? Para deixar o caminho livre para a reeleição de Bolsonaro?
Em seus oito anos de mandato, Lula nunca ameaçou a Globo. Ao contrário, foi muito respeitoso nas relações com a emissora, até mais do que devia para o meu gosto.
Quem é, afinal, o grande inimigo da Globo que ameaça a sua sobrevivência e a do país como nação soberana?
Tem coisas que não consigo entender, muito menos explicar.
Nessa disputa
RICARDO KOTSCHO “BALAIO DO KOTSCHO” ( BRASIL)