OS MARTÍRES JESUÍTAS RUMO AO BRASIL

O Beato Inácio de Azevedo segurando a cópia fiel da famosa Salus Populi Romani – Foto: PPCJ.pt

Foi prodigiosa a evangelização dos jesuítas em todas as Américas. Do Canadá à Argentina. O Brasil foi fundado no século XVI, a rigor, por fervorosos sacerdotes da Companhia de Jesus, comandados pelo transmontano padre Manuel da Nóbrega (1517 – 1570), pioneiro dos jesuítas nas Américas – que chegou à Bahia, em 1549, na comitiva do primeiro Governador-Geral da colônia lusitana, o poveiro Tomé de Sousa (1503 – 1579).

Nóbrega, ao lado de Sousa, e com o minhoto Diogo Álvares Correia, o célebre Caramuru, criariam a cidade de Salvador, a Boa Terra, capital do futuro País. O mesmo Nóbrega, acompanhado de seu auxiliar, São José de Anchieta (1534 – 1597), nascido nas Ilhas Canárias, então já propriedade da Coroa de Castela, estabeleceriam, em 1554, São Paulo. Vislumbraram, cá, no Planalto Paulista, uma área protegida dos corsários e começaram a construir, a partir do Pátio do Colégio dos Jesuítas, a maior metrópole da América Latina.

Ambos ainda erigiriam mais uma metrópole brasileira, em 1565, o Rio de Janeiro, a Cidade Maravilhosa, que substituiria Salvador como capital em 1763. Em Salvador, aliás, viveria, pregaria e escreveria seus preciosos Sermões um dos grandes Doutores da Companhia de Jesus, o padre lisboeta António Vieira (1608 – 1697), maior homem de letras português do século XVII. Outros prelados jesuítas, como o espanhol de Navarra, São Francisco Xavier (1506 – 1552), e seu sucessor na Ásia, o italiano padre Matteo Ricci (1552 – 1610), também a serviço dos soberanos de Avis, conseguiriam converter civilizações mais antigas que as europeias, entre as quais, a Índia e a China, e até os nossos dias são reverenciados em quase todas as nações do continente.

Os restos mortais de São Francisco Xavier continuam, inclusive, expostos numa caixa de vidro e prata, na Basílica do Bom Jesus, do Patriarcado de Goa, na Índia, e cujo altar desde 1617 é local de peregrinação – mesmo depois da retirada dos portugueses, em 17 de dezembro de 1961, dos territórios que administraram por quase cinco séculos.

Quanto a Ricci, convém recordar, tamanha foi a influência na corte dos mandarins que se tornaria o primeiro estrangeiro a ser sepultado em Pequim, quando, à época, os cristãos só eram enterrados na lusa Macau. Mas poucos sabem que, muitas vezes, foi mais difícil catequizar os indígenas das Américas do que enfrentar a hostilidade dos muçulmanos nas Áfricas – e nos confins asiáticos, onde estavam presentes, para além dos islamistas, os hinduístas, confucionistas, budistas e xintoístas.

E, com efeito, o sacrifício dos primeiros mártires jesuítas à caminho do Novo Mundo, precisamente rumo ao Brasil, completa 450 anos neste 2020 – conforme lembra meu querido amigo José Carlos Rodrigues Pereira do Vale. Foi um total de 40 mortos na costa de La Palma, uma das ilhas do Arquipélago das Canárias, cruelmente afogados por protestantes calvinistas que tomaram de assalto a embarcação. Eram huguenotes franceses e controlavam a travessia do Atlântico, na altura do Marrocos. Tinham sido expulsos do Rio de Janeiro pelos portugueses. Trinta e dois dos religiosos vitimados eram lusitanos e oito, espanhóis.

Eram liderados pelo Beato Inácio de Azevedo, natural do Porto, assassinado aos 44 anos, em 15 de julho de 1570, atirado ao mar, juntamente com os demais missionários. Teria morrido abraçado à imagem da Madonna di San Lucca – como foi retratado na ilustração da coluna. Ele seria beatificado, com os outros 39, em 11 de maio de 1854, pelo Papa Pio IX (1792 -1878).

Ao buscar inspiração no apostolado de São Francisco Xavier, adotando seu prenome, o Papa Francisco, jesuíta nascido em Buenos Aires, é um exemplo da perseverança da valorosa Companhia de Jesus e seus mártires.

ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)

Albino Castro é jornalista e historiador

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