CHARGE DE LUTE
A OMS nega que tenha dado qualquer sinal de que esteja defendendo para a possibilidade de uma abertura mais rápida das economias e que estudos tenham concluído de forma definitiva que pessoas sem sintomas não repassam o covoronavírus.
Ontem, a chefe da unidade de doenças emergentes da OMS, Maria Van Kerkhove, afirmou que algumas pesquisas indicam que pacientes assintomáticos têm poucas chances de transmitir a covid-19. Ela, porém, citou apenas um estudo de pequeno porte feito pela China. Imediatamente, milícias digitais do governo iniciaram uma campanha para indicar que tal declaração significaria o fim das quarentenas.
Na manhã de terça-feira, o presidente Jair Bolsonaro repetiu os comentários de suas redes sociais, indicando que espera uma “reabertura mais rápida” após a divulgação da Organização Mundial de Saúde (OMS) ontem, de que a disseminação assintomática do coronavírus é “muito rara”. Bolsonaro, como já havia feito no passado, voltou a distorcer a informação da OMS. Para ele, “o pânico começa a se dissipar”. “Quem sabe poderemos voltar à normalidade que tínhamos no começo deste ano”, disse.
Nesta terça-feira, Van Kerkhove negou que haja uma mudança de recomendação e explicou que a comunidade internacional hoje não sabe dizer qual é a proporção de pessoas transmitindo o vírus. Segundo ela, muitas das pessoas sem sintomas são mais jovens.
Ela pede ajuda dos governos para entender ainda quando uma pessoa é mais infecciosa. Um dos estudos apontam que tal momento é quando o paciente desenvolve sintomas, que é quando ele tem mais vírus no corpo. “Estamos só no começo disso tudo”, afirmou.
Michael Ryan, diretor de operações da OMS, também negou que se saiba se pessoas sem sintomas podem não transmitir. “Isso é desconhecido ainda”, disse.
Ele da um exemplo: uma pessoa que está num restaurante e bem. Mas de repente começar a se sentir com mal-estar e febre. “É nessa etapa que uma pessoa pode estar transmitindo”, disse. “Temos de admitir: não é um vírus fácil de parar”, afirmou.
Para ele, o que se sabe é que a melhor forma de combater o vírus é a de saber onde ele está para poder suprimir a transmissão. Ryan deixou claro que a OMS continua mantendo a mesma recomendação em termos de resposta e que nada mudou por enquanto. Ele lembra que os números da pandemia continuam subindo. “Estamos subindo ainda a montanha. Precisamos adotar as medidas, pois sabemos que funciona”, afirmou.
“Ambos – sintomáticos e assintomáticos – contribuem para transmissão. A questão é saber qual é a proporção de cada um”, disse Ryan.
Para ele, se houver uma operação maior dos governos para identificar os surtos, com amplos testes, existiria a possibilidade de não ter de colocar em confinamento 100% da população. Mas, para isso, a tarefa será a de identificar e testar. “Isso pode ter êxito para parar a doença e ainda ajudar a economia”, defendeu.
Bolsonaro, porém, não citou a mesma diretora da OMS alertando minutos antes que o combate contra a pandemia estava “longe de terminar” e que o “maior risco” neste momento é a complacência por parte de governos. Nada disso, porém, foi citado pelo presidente brasileiro.
Na mesma coletiva de imprensa, a OMS pediu que o Brasil mantivesse a transparência nos dados e, num recado velado, apelou para que a América do Sul mostrasse liderança política.
A OMS também deixou claro que a situação internacional está piorando, e não melhorando. Entre sábado e domingo, o mundo registrou o maior número de casos em seis meses, com 136 mil novos diagnósticos positivos.
Nada disso foi mencionado por Bolsonaro. “Ontem a OMS também disse que a transmissão de pessoas assintomáticas é praticamente zero. Muitas lições serão tomadas. Isso pode sinalizar a uma abertura mais rápida e do comércio e a extinção de medidas mais rígidas autorizadas pelo STF e por prefeitos e governos estaduais. O governo federal não participou disso. Vai ter muita discussão”, disse Bolsonaro durante a 34ª reunião do Conselho de Ministro.
“Esse pânico que foi pregado lá atrás por parte da grande mídia começa talvez a se dissipar levando em conta o que a OMS falou por parte do contágio dos assintomáticos”, completou o presidente.
JAMIL CHADE ” SITE DO UOL” ( GENEBRA / BRASIL)