Não há mais dúvidas de que, dependendo de sua vontade, os militares do Palácio não vão largar o osso. Provaram o gosto do cargo civil, a abertura de mercado para a família – como é o caso da filha do general Villas Boas, em cargo comissionado no Ministério da Família.
Os pontos centrais de acompanhamento político, para a montagem de qualquer cenário econômico.
Peça 1 – o fator militar
O Ministro interino da Saúde, general Eduardo Pazuello, deu a prova final da cooptação final dos militares do Palácio por Bolsonaro: a nomeação de militares em todos os cargos de confiança relevantes do Ministério da Saúde, além de levar adianta o protocolo de aplicação da hidrocloroquina no combate ao Covid-19 e endossar outras pirações bolsonarianas.
Não há mais dúvidas de que, dependendo de sua vontade, os militares do Palácio não vão largar o osso. Provaram o gosto do cargo civil, a abertura de mercado para a família – como é o caso da filha do general Villas Boas, em cargo comissionado no Ministério da Família.
Pelo cargo estão dispostos a tudo, até a bancar as alucinações de Bolsonaro e a abrir espaço para colegas militares, como forma de se fortalecer na corporação.
O jogo fica assim: ajudam Bolsonaro a cooptar o centrão e ganham cargos para cooptar colegas. A rigor, seguem a mesma lógica de sobrevivência dos políticos tradicionais.
Em caso de fracasso do governo Bolsonaro, arcarão com o desgaste e comprometerão o papel das Forças Armadas como agente moderador.
Peça 2 – as disputas políticas
O acordo com o centrão se fez através de Michel Temer. Estão de volta velhos templários como Carlos Marun, o braço direito de Eduardo Cunha, e o próprio Temer. Em breve voltarão à cena Eliseu Padilha e outros próceres da pior política brasileira.
Essa cooptação coloca Bolsonaro, por enquanto, a salvo de uma autorização da Câmara para a abertura de um processo de impeachment – há a necessidade de 2/3 de votos a favor.Leia também: Contrariando Moro, MPF não vê crime em fala de Lula que associa Bolsonaro a milicianos
Mesmo assim, o desgaste de Bolsonaro é irreversível, por sua absoluta incapacidade de arrefecer os conflitos ou pensar estrategicamente. Mas o fator tempo ainda é uma incógnita. Ou seja, quanto desgaste a mais será necessário até que a balança penda a favor do impeachment?
Nas próximas semanas, a disputa central se dará no Judiciário.
Peça 3 – as disputas no Judiciário
Com os movimentos de hoje, o jogo fica na seguinte situação:
Contra Bolsonaro
Três inquéritos: o das rachadinhas, envolvendo Flávio Bolsonaro; o das Fakenews, envolvendo Carlos e o gabinete do ódio; as denúncias de Sérgio Moro, sobre a interferência de Bolsonaro na superintendência da Polícia Federal no Rio; e, agora, com a denúncia de Paulo Marinho sobre vazamento de operações da PF para Flávio. Moro agiu por conta própria. Marinho provavelmente estimulado por João Dória Jr.
O lance de Moro seguiu sua estratégia vitoriosa, desde o início de carreira. Baseia-se em evidências fracas para produzir uma denúncia – quando juiz, praticava a prisão. Aberto o inquérito, o alvo é submetido a toda sorte de investigações por parte dos vários órgãos de fiscalização, até achar alguma prova – que não precisa necessariamente estar ligada à denúncia original.
O circuito da mídia aquece a fogueira trazendo velhos e novos escândalos à tona, visando criar o clima de fervura que ajude a acender a pira do impeachment.
Nos próximos dias, a fogueira aumentará com a decisão do Ministro Celso de Mello, do STF (Supremo Tribunal Federal), de liberar os vídeos da reunião de Ministério, as investigações sobre o vazador da PF.
Contra governadores
A contraofensiva de Bolsonaro se deu através do Procurador Geral da República Augusto Aras, denunciando dez governadores por crimes cometidos nas compras sem licitação nessa guertra contra o coronavirus. As denúncias atingem os governadores de São Paulo, João Dória Jr, e do Rio, Wilson Witzel.Leia também: PGR pede para ouvir “delator” do vazamento sobre Queiroz no inquérito Moro x Bolsonaro
Seria um ato de coragem do PGR, se tivesse incluído nas denúncias as suspeitas envolvendo compras pelo governo federal, como é o caso de denúncias sobre compras dos Ministérios da Saúde e da Educação.
Como se sabe, qualquer denúncia criminal contra o Presidente só poderá ser iniciada pela PGR.
Aras joga a favor de Bolsonaro, mas não há garantias de que seu alinhamento seja incondicional. Dependendo do que apareça nas investigações, é até possível que leva adiante a denúncia.
Peça 4 – as disputas na economia
Apesar de, nas duas vezes em que recebeu empresários, Bolsonaro tenha manobrado para jogar-los contra os demais poderes – Supremo e Congresso – a cada dia que passa fica mais clara a inoperância do governo no campo econômico.
A liberação de recursos para crédito esbarrou em uma dificuldade óbvia, apontada aqui de cara: não adiantaria disponibilizar recursos para bancos, se não resolvesse a questão do risco de crédito, que ficaria por conta dos bancos. A saída seria o Tesouro assumir a maior parte do risco, através do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social).
Até agora não saiu nada. As dificuldades impostas por Paulo Guedes – tanto na ajuda aos estados quanto às empresas – são tão recorrentes, que se fica sem saber se é questão de incompetência ou de boicote.
A atuação errática do governo o transformou em exterminados não apenas de CPF como de CNPJs. E, dependendo da demora em liberar recursos, exterminador também de governos estaduais, com implicações catastróficas sobre a saúda pública.Leia também: Operação da polícia de Witzel matou o menino João Pedro no Rio de Janeiro
Essa desorganização certamente pesará na decisão do STF de partir para as vias de fato.
Peça 5 – os próximos capítulos
Há informações de bolsonaristas praticando exercícios de guerrilha, além das carreatas e violência difusa. De qualquer modo, há sinais de esvaziamento do movimento, de isolamento dos ultra-radicais, movimento acelerado pela saída de Sérgio Moro, pelas cabeçadas continuadas de Bolsonaro e pela repressão à agressividade virtual e presencial dos bolsominions.
No curto prazo, Bolsonaro continua na defensiva e há espaço para alguma racionalização das frentes democráticas de todas as linhas.
No médio prazo, há uma enorme incógnita pela frente. A cada dia que passa, ao exército de desempregados e desassistidos se juntará uma enorme legião de pequenos e micro empresários quebrados.
Com os impasses políticos e a manutenção de Bolsonaro – e, especialmente, de Paulo Guedes – não há a menor possibilidade de uma recuperação da economia.
Em tempos de tormenta, há espaço para todo tipo de aventuras, dependendo da nova liderança que apareça, ou um conciliador – que não está no horizonte – ou algum candidato a déspota esclarecido.
No campo racional, a esperança vem do consórcio do Nordeste.
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( PORTUGAL)