A pandemia do coronavírus popularizou a expressão “hospital de campanha”. Carrega um conceito militar. Originalmente, era usada em campos de batalha, para definir unidades médicas improvisadas. Tratavam dos feridos até que eles pudessem ser transportados em segurança para um hospital. Com o tempo, o termo foi transplantado para situações de desastre. Jair Bolsonaro cria agora uma novidade: o Ministério da Saúde de campanha —uma pasta hemorrágica submetida a uma gestão militar até que o presidente encontre um médico que o ature.
Em todo o regime militar, nenhum dos generais-ditadores colocou na pasta da Saúde um ministro que não fosse médico. No comando do governo civil mais militar da história, Bolsonaro expurgou da pasta dois doutores. E mantém o general Eduardo Pazuello como um interino que pode virar efetivo se não for encontrado um especialista maleável o bastante para se ajustar às suas peculiaridades anticientíficas do presidente.
Pazuello transforma a Saúde numa trincheira militar. Ele já vinha fazendo isso. Nomeara sete militares para cargos no ministério. Agora, sem o inconveniente da presença figurativa de Nelson Teich, o médico que sangrou por 28 dias no cargo de ministro antes de cair, o general nomeia mais nove militares.
Alguns foram lotados em áreas de planejamento, contabilidade e execução orçamentária. Nesses setores o rigor militar pode ser até útil. Mas outros vão lidar com áreas como atenção especializada de saúde e monitoramento do funcionamento do SUS. Nessas áreas, o emprego do militarismo pode ser tão inadequado quanto o uso de um band-aid para conter uma hemorragia.
Há dois riscos nessa operação. O primeiro é o de consolidar o Ministério da Saúde como algo inútil em meio a uma pandemia. O segundo é o de comprometer a imagem das Forças Armadas numa gestão incompatível com as necessidades da tragédia sanitária. Nas duas hipóteses, a pasta da Saúde continuará sangrando.
JOSIAS DE SOUZA ” SITE DO UOL” ( BRASIL)