AS DISPUTAS DE RUA E A HORA DE AVANÇAR NOS ESPAÇOS DE MEDIAÇÃO PARA DEFENDER A DEMOCRACIA

~CHARGE DE AROEIRA E SÉRGIO SOUTO

As manifestações em favor de Jair Bolsonaro, independentemente das avaliações sobre a quantidade de pessoas que compareceram, levam definitivamente a luta política para as ruas. Entra-se em uma nova fase do fascismo, na qual os principais veículos de mobilização da etapa anterior – veículos de mídia – perdem o controle sobre as massas. Pouco importa se lideradas por um estadista ou por um imbecil, a besta das ruas ganha vida própria, mas não o suficiente, ontem, para o autogolpe.

Hoje, as manifestações propuseram explicitamente o fechamento do STF (Supremo Tribunal Federal). Dias atrás, o Ministro Luís Roberto “Iluminista” Barroso deu novamente carne fresca à matilha alegando que as raras decisões da casa, em defesa dos direitos individuais, justificariam a selvageria das ruas. Para se poupar, atiçava os mastins contra seus adversários, mesmo sabendo que as mordidas seriam em cima de uma democracia claudicante.

A pusilanimidade de Barroso é um indício claro da dificuldade em recompor o centro democrático visando impedir o avanço da barbárie nesses tempos de cólera. Ainda haverá necessidade de mais massa crítica contra a barbárie, até os homens bons terem certeza de que é um bom negócio pular de volta para o barco da democracia.

A falta de noção de perigo é tamanha que a Globonews colocou todos seus jornalistas instrumentalizando as manifestações, apresentadas como em defesa da reforma da Previdência e do pacote de encarceramento em massa do Ministro Sérgio Moro. Pouco importa se esse endosso significou um reforço extra para um governo que está desmontando o país. A síndrome do imediatismo é uma praga inarredável.


O pacto
O impeachment se deu quando o principal adversário do PT, o PSDB, se viu sem condições de recuperar o poder. Não apenas pela derrota de Aécio Neves por Dilma Rousseff, mas também pela perspectiva de, em 2018, ter Lula novamente como candidato.

Foi uma reedição dos golpes políticos-midiáticos-jurídicos que marcaram a América Latina desde a redemocratização dos anos 80. A maneira como advogados legalistas tardios, Ministros garantistas retardatários, jornalistas que se tornaram democratas de nascença desde o ano passado se uniram, no pré-impeachment, para tentar legitimar o golpe é assunto para a história.

Eu sei o que ele fizeram no último verão. Mas o que importa, agora, é o rascunho do mapa do inferno que se desenha, caso a parte racional da sociedade civil não se junte em fortalecimento do chamado centro democrático.

Se não chegarem a um acordo, a alternativa Bolsonaro será Hamilton Mourão, com duas forças disputando o controle do país: ou as milícias, com Bolsonaro, ou o poder militar, com Mourão. E ninguém se iluda com os militares. A exemplo de outras instituições contemporâneas, trata-se de uma força incapaz de pensar o país até nos aspectos que lhe dizem respeito direto: a noção de defesa nacional, desestruturada com a venda da Embraer, sem um sinal sequer de resistência das Forças Armadas, ou o decreto das armas, ameaça direta aos soldados, quando a anarquia se impuser.

A defesa da democracia não poderá depender de nenhuma dessas alternativas, mas de um grupo democrático forte, que vá acumulando massa crítica para se antepor ao avanço do autoritarismo.

Leia também: MP que reestrutura Esplanada dos Ministérios pode ser votada hoje, mas com ressalvas
Daí a necessidade premente de um rearranjo do centro democrático.

O fator Lula
Maior líder da história, Lula padece de um dilema paradoxal. Seria o personagem público mais qualificado para conduzir o grande acordo nacional, não fosse o desequilíbrio que impõe ao jogo pela absoluta ausência, no campo tucano-mercado-liberal, de um interlocutor à sua altura.

Transformado no grande mote da polarização política, no entanto, não há espaço para Lula ser protagonista principal. Basta colocar a cabeça de fora para Imediatamente acender o antilulismo, resultando no impasse político. Não adianta deblaterar contra essa democracia condicionada, hipócrita: ela é um dado na realidade, em um país em que a defesa da democracia é tratada de forma utilitarista.

Mesmo sem Lula em primeiro plano, o polo progressista tem se aglutinado em torno de Fernando Haddad, como representante do principal partido de oposição, o PT e o político respeitado por outras lideranças significativas do arco da esquerda. A maneira como está sendo recebido em várias partes do país, o modo como foi tratado pela juventude estudantil paulistana nas passeatas pela educação, a coerência e, ao mesmo tempo, a interlocução com forças modernas da esquerda e do centro, o qualificam como o grande interlocutor do lado do PT.

Já o Partido de Jorge Paulo Lehmann e os Novos da vida estão trabalhando mercadologicamente nomes novos. Em vez de apostar desde já em uma improvável eleição em 2022, deveriam esquecer um pouco a miragem Luciano Huck e se empenhar nesse grande acordo e, principalmente, em diluir a pesada demonização dos adversários, plantada no período pré-impeachment.

Leia também: Candidato a PGR, Paulo Bueno diz que Lava Jato não perdeu pulso e defende combate ao crime
No Senado, há remanescentes da razia produzida pela Lava Jato em condições de conduzir negociações junto aos demais poderes. Há um grupo de governadores nordestinos de espírito democrático comprovado. Se o PSDB conseguir se libertar do imediatismo de João Dória Jr poderá agregar os políticos históricos com jovens promessas comprometidas com a democracia e a tolerância.

O importante é que um pacto dessa dimensão tem que ser equânime, respeitando o conceito de frente cuja bandeira maior tem que ser a defesa da democracia.

LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *