Quando passar o vendaval, e poderá ser em breve, gestos dessa natureza serão contados como o caso do procurador que empenhou sua biografia em troca do fogo fátuo de um poder que acabará na próxima esquina da história.
O vice-procurador-geral eleitoral Renato Brill de Goés não é um bolsominion típico. Pelo contrário. Até a semana passada era um procurador considerado, com boas posições em direitos humanos. Virou Bolsonaro.
O Ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta é um médico racional, que tem dado demonstrações de maturidade e responsabilidade pública excepcionais. E era Bolsonaro.
O que leva pessoas desse nível a aderirem ao que de pior a política brasileira apresentou em todos os tempos? A adesão a Bolsonaro há muito deixou de ser uma opção política para se tornar uma escolha moral.
O que acontece com o caráter de pessoas como Brill de Góes, para ter a presunção de acabar com um partido político que representa várias dezenas de milhões de eleitores brasileiros? Como pode alguém que se considera minimamente racional e conhecedor de princípios jurídicos e de direitos humanos, proceder a essa confusão entre pessoas e a instituição do partido a ponto de ter essa pretensão de varrer do mapa político o maior partido brasileiro?
Seria vontade de agradar o chefe? Seria o fato de querer impor autocraticamente seu antipetismo sobre 47 milhões de eleitores? Seria o fato de que suas convicções se adaptam às circunstâncias da sua carreira profissional? Vale tanto a pena assim manchar sua biografia com um gesto dessa natureza?
Mandetta fez o caminho inverso. Chegou ao posto de Ministro por sua adesão ao bolsonarismo. No poder, lembra o personagem de Vitório de Sicca, no filme “De crápula a herói”. Percebeu a relevância do cargo, a responsabilidade pública e passou a ter um papel central no combate à doença, indo contra o chefe. Vai ser demitido ou não, pouco importa. Em um país de oportunismos, de pusilanimidade de homens públicos, Mandetta inscreveu-se na história.Leia também: Mandetta e as circunstâncias: como se comportou no impeachment
Por outro lado, quantos procuradores/as exemplares, de biografia irrepreensível, acabaram jogando fora história, imagem e reputação para agradar ao Deus do momento, fosse Bolsonaro ou a mídia? Os exemplos estão aí, à vista de Brill de Goes. Na era das redes sociais, o julgamento da história não precisa aguardar décadas para se realizar.
Quando passar o vendaval, e poderá ser em breve, gestos dessa natureza serão contados como o caso do procurador que empenhou sua biografia em troca do fogo fátuo de um poder que acabará na próxima esquina da história.
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)