Portugal viveu sob os Habsburgo de Madri de 1580, dois anos depois do desaparecimento de O Desejado Dom Sebastião, aos 24 anos, na Batalha dos Três Reis, na marroquina Alcácer-Quibir, até 1640, quando a Casa de Bragança fez a Restauração da Coroa de Lisboa.
Três capitais brasileiras foram construídas durante os 60 anos em que a dinastia vienense foi soberana do imenso Império lusitano. A primeira delas foi João Pessoa, em 1585, batizada, inicialmente, de Filipéia de Nossa Senhora das Neves, em homenagem ao Rei Felipe II (1527 – 1598), El Prudente, que em Portugal era Felipe I. Com a invasão holandesa passou para Frederikstad e, posteriormente, Cidade da Parahyba – ganhando o nome atual em 1931.
A segunda foi Natal, no Rio Grande do Norte, em 1599, e a terceira, Belém do Pará, em 1616. João Pessoa é a quarta capital mais antiga do País – tendo antes Salvador, de 1549, São Paulo, 1554, e Rio de Janeiro, 1565.
Visitei a capital paraibana nos primeiros dias de 2005 e fui recebido com um acolhedor almoço em família, no dia três de janeiro, na casa de meu caríssimo e saudoso primo, Guilherme Rabay (1933 – 2013), um dos engenheiros responsáveis pela recuperação, nos anos 1990, do plácido Porto de Capim, no Varadouro, às margens do Rio Sanhauá, afluente do Paraíba – bem como pelo trabalho de preservação do esplêndido conjunto arquitetônico barroco do Centro Cultural São Francisco, reunindo as igrejas de São Francisco, cuja foto ilustra a coluna, a da Ordem Terceira e a de Santo António.
O complexo barroco de João Pessoa começou a ser erguido no período espanhol, em 1589, sendo considerado um dos mais preciosos de todo o continente latino-americano. Tão exuberante quanto as obras primas do barroco castelhano no Novo Mundo. Comparável à Catedral de Assunção, austeramente retilínea, com fachada neoclássica, ao lado do Rio Paraguai, próxima ao Palácio López, diante da província argentina de Misiones. Igualmente magnífica como as inúmeras igrejas rococós de Minas Gerais, ao longo da Estrada Real, ligando Diamantina à fluminense Paraty.
O Centro Cultural pessoense foi edificado por mestres de obra vindos de Portugal, trazendo, inclusive, as pedras e a riquíssima azulejaria. Ao contrário do barroco mineiro – em sua maioria desenhado pelo brilhante artista luso-brasileiro, António Francisco Lisboa (1738 – 1814), o Aleijadinho, utilizando pedras locais.
O gênio e o cosmopolitismo dos portugueses estão presentes na Paraíba. O adro do convento dos franciscanos tem a extensão exata da altura da Igreja e um monumental cruzeiro de pedra domina a entrada. Há ainda ornamentos de origem asiática, como um leão chinês, numa das muralhas laterais, nas quais a Paixão de Cristo é reconstituída, em azulejos, em alpendres. O querido primo Guilherme era admirador de Felipe II e, nos seus últimos anos de vida, empenhou-se para que uma estátua do monarca austro-madrilenho fosse colocada no Porto de Capim. Aliou-se também aos paraibanos que sonham com a volta do nome da capital para Filipéia ou, pelo menos, Cidade da Parahyba – grafado hoje como Paraíba.
Afinal, a morte de João Pessoa, em 1930, aos 52 anos, na Confeitaria Glória, propriedade de nosso avô, à Rua da Palma, na região central de Recife, não foi um crime político – embora concorresse como Vice-Presidente na chapa de Getúlio Vargas (1882 – 1954). Pessoa seria assassinado por um conterrâneo, o jornalista João Dantas (1888 – 1930), ao saber que a esposa o traía com o candidato. Destino trágico e sem glória para a histórica metrópole nordestina fundada pelos Habsburgos.
ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)
Albino Castro é jornalista e historiador