Essa história quem conta é Francisco Dornelles, ex-ministro da Fazenda e ex-governador do Rio de Janeiro, que em janeiro fará 85 anos.
Com curso de tributação em Harvard, Dornelles assumiu como procurador da Fazenda Nacional nos anos 70, tornando-se amigo do então ministro Mario Henrique Simonsen.
Um dia, despachando com Simonsen, o ministro lhe disse que estava com problemas por causa da ameaça dos EUA de sobretaxar em 35% a importação de aço do Brasil.
Digamos uma dor de cabeça em tudo semelhante à que tem agora o ministro Paulo Guedes com a ameaça do presidente dos EUA, Donald Trump, de sobretaxar a importação de aço do Brasil.
Naqueles idos dos anos 70, Dornelles aconselhou o seu chefe:
“Se o senhor me permite, ministro, eu aviso ao Harry Stone que vamos taxar igualmente a comercialização de filmes americanos aqui. Tenho certeza de que a indústria cinematográfica pressionará a Casa Branca”.
Harry Stone era uma espécie de embaixador de Hollywood, famoso lobista chefe da Motion Picture Association (MPA) para a América Latina.
Dornelles conta que ligou para Stone, seu velho conhecido, e comunicou o aumento de 35% sobre produtos cinematográficos dos EUA no Brasil.
O representante da Motion Pictures perguntou qual o motivo. E o então burocrata da Fazenda respondeu: “Ordem do ministro, já que seu país está sobretaxando o aço brasileiro.”
Stone protestou o quanto pode, mas Dornelles disse que nada podia fazer.
Pois bem. Conta o velho político que, passada uma semana, o ministro Simonsen lhe chamou esfuziante ao gabinete: “Dornelles, estive agora com o presidente Geisel e você não sabe o que aconteceu.”
“O que houve?”, perguntou. E ouviu o seguinte relato:
“Ele disse que recebeu um telefonema do Gerald Ford. Pois é, o presidente dos EUA falou que estava ao lado de Jack Valenti e queria comunicar que não haveria mais a sobretaxa do aço brasileiro. Mas que gostaria que também não houvesse aumento das tarifas sobre o cinema aqui no Brasil. Você é um gênio, Dornelles!”
Bem, não foi por conta disso, mas Dornelles acabou virando Secretário da Receita Federal.
Jack Valenti dirigiu a poderosa MPA durante 38 anos. Frequentava a Casa Branca com livre acesso, desde o governo Lyndon Johnson até 2004, quando deixou o posto.
Já Dornelles costuma contar o episódio para demonstrar a força da indústria cultural na economia dos EUA. O que a torna politicamente mais forte até que a indústria do aço.
E como sempre há formas de se negociar com altivez.
TALES FARIA ” SITE DO UOL” ( BRASIL)