É um golpe absolutamente racista, colonial e novamente podemos dizer que setorial, vinculada a um setor histórico de poder econômico”, descreveu antropóloga Francisca Fernandez
Jornal GGN – A situação política e social em Bolívia vem agonizando desde a renúncia do presidente Evo Morales, o vice-presidente e diversos ministros neste 10 de novembro. Nesta terça (12), nova escalada de tensão despertou o país, em um duro conflito social provocado por aqueles que hoje tentam assumir o poder. De acordo com especialistas ouvidos pelo GGN, não se trata de uma simples oposição a Evo Morales, é um golpe cívico-militar e policial, de caráter reacionário, racista e de ultra-direita.
O fantasma da fraude eleitoral, que alavancou as primeiras fortes reações no país desde o resultado da vitória de Evo nas eleições do último 20 de outubro, alimentados por um relatório da Organização de Estados Americanos (OEA) que questionou a legitimidade dos votos e convocou as forças militares a atuarem por uma nova eleição no país, trouxe figuras de atuação nas ruas em perseguição política direta ao atual governo e seus membros.
“Nos roubaram as eleições, nos obrigaram a renunciar, isso é um assalto. Evo Morales não teve outra via, teve que ceder, teve que renunciar ante este iminente golpe de Estado e também à traição de certos setores que prometeram lealdade ao presidente”, afirmou Ronald Montecinos [leia mais aqui], coordenador do partido de Morales, Movimento ao Socialismo (MAS) no Exterior no Chile, ao GGN.
Com as ameaças, Evo Morales decidiu renunciar no dia 10 de novembro, seguida de renúncias de diversos membros do mandato, incluindo o vice-presidente Álvaro García Linera e a presidente do Senado, Adriana Salvatierra, governista que teria a função de assumir o controle do país em sucessão a Morales. Na manhã de hoje, o avião do presidente renunciado estava a caminho do México, país que ofereceu asilo político ao então mandatário, enquanto que o líder opositor Luis Fernando Camacho convocou a polícia e as forças armadas a empreender uma busca contra Morales, logo após ordenar a sua prisão.Leia também: Bolsonaro e Putin terão reunião para falar da situação boliviana
“Estamos diante de um golpe de Estado perpetuado pela polícia e militares, mas principalmente pela extrema direita. (…) Se por um lado está inserido em um contexto de conflitos políticos, é um golpe absolutamente racista, colonial e novamente podemos dizer que setorial, vinculada a um setor histórico de poder econômico, que está na zona oriente de Bolívia, Santa Cruz especificamente”, analisou a acadêmica e antropóloga Francisca Fernandez.
Especialista em estudos andinos, a antropóloga da Universidade Academia de Humanos Cristiano, do Chile, atua em comunidades Aymaras, de Bolívia, Chile e Peru. Ela reconhece que o governo de Morales trouxe avanços na recuperação territorial para os povos originários do país, mas que também cometeu erros, dentro do Movimento ao Socialismo (MAS), de reproduzir lógicas de hierarquia e autoritarismo, além de políticas econômicas extrativistas.
“Há um clima muito complexo e é importante levar em consideração que a crítica a Evo Morales não é unitária, diferente do que hoje se instalou. A que se instalou agora é da ultra-direita, que é contra tanto Morales e seu governo, quanto também dos setores campesinos, indígenas, feministas e sócio-ambientais mobilizados”, pontuou. “Estamos diante de ataques racistas, misóginos e patriarcais”, alarmou Francisca Fernandez.
PATRICIA FAERMAN ” JORNAL GGN” ( BRASIL)