Ministro da Economia afirma que situação fiscal do setor público é dramática e defende que Governo e Congresso avancem sobre alguns tabus orçamentários, como o da indexação de recursos
O desafio de controlar os orçamentos públicos pode levar o Congresso Nacional a entrar para a história. Quem aponta este caminho para deputados e senadores é o ministro da Economia, Paulo Guedes, que lança, assim, uma nova campanha para difundir proposta que defende publicamente desde antes da posse do governo Bolsonaro, quando assumiu o comando da economia: a desindexação das receitas orçamentárias.
Guedes revela que ouviu a expressão “Vamos para a história” de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), que ele não nominou.
Na primeira audição, na Comissão Mista do Orçamento, onde o ministro foi prestar esclarecimentos sobre a proposta de Orçamento para 2020, o convite para ingressar na história não despertou entusiasmo de Suas Excelências. Os membros da comissão, acostumados a enxergar verbas nas entrelinhas das planilhas, pediram mais detalhes sobre a essência das propostas, como seriam encaminhadas etc.
Os números do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA – 2020) justificam a preocupação do ministro da Economia. As despesas obrigatórias representam 94,0% da despesa primária, ao passo que as despesas discriminatórias, a exemplo do custeio da máquina, respondem por 6,0%.
Para investir, o Executivo vai dispor de R$ 19 bilhões, o que é assustador, considerando que as emendas de bancada impositivas reservam R$ 15 bilhões, e impõe ao Poder Público buscar outras formas de financiamento, acelerando as concessões e privatizações.
Paulo Guedes lembra o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, para quem o Orçamento poderia ser gerido por um software simples, já que os recursos estão todos comprometidos.
Na área econômica, fala-se em uma PEC DDD, que abrangeria a desindexação de recursos, a desvinculação (reajustes automáticos) e a desobrigação de despesas.
Guedes inclui as propostas no chamado Pacto Federativo, acredita que elas devam ser lançadas depois da Reforma da Previdência e que iniciem a tramitação pelo Senado.
O ministro sabe que essa linha de ação tem limitações e observa que o presidente Jair Bolsonaro já disse que não vai admitir desindexar o salário mínimo. Guedes acrescenta à lista de exceções a educação básica e a saúde
Ainda assim, ele cita uma infinidade de penduricalhos, que engessam o orçamento, a exemplo dos cerca de 280 fundos públicos que aponta.
Constituintes
O ministro Paulo Guedes estabelece a Assembleia Nacional Constituinte (1987-1988) como marco zero de seu discurso reformista. Naquele momento histórico ele diz que era adequado carimbar recursos públicos. Passados mais de 30 anos, não faria mais sentido este “empoçamento”, que em 2018 foi de R$ 23 bilhões.
O problema do DDD é antigo e os economistas que estiveram à frente da implantação do Plano Real, nos idos de 1994, classificaram como peça fundamental para viabilizar o plano a desvinculação de receitas. O primeiro instrumento com este objetivo recebeu o nome de Fundo Social de Emergência, muito embora não fosse social nem de emergência. O fundo recebeu outras denominações ao longo do tempo, sendo atualmente chamado de Desvinculação de Recursos da União (DRU).
Como prova de que a vinculação não ficou restrita aos constituintes, desde os anos 90 são inúmeras as iniciativas parlamentares (algumas exitosas) de retirar receitas deste instrumento, vale dizer, de vincular o desvinculado.
Em outra vertente, deve-se registrar que data de 2000 a Emenda Constitucional que assegura os recursos mínimos para o financiamento das ações e serviços públicos de saúde (EC 29/2000).
É bem contemporânea a visão parlamentar no sentido de que a melhor forma de assegurar a destinação de recursos é constitucionalizá-los.
O ministro Paulo Guedes sabe disso e reforça o recado quando declara que “a decisão de carimbar [recursos] já não é mais sensata”. Ele sustenta que “está na hora de mudar esse software”.
Teto de gastos
Guedes considera que a principal razão para os problemas fiscais do país foi o descontrole dos gastos públicos nos últimos 40 anos. Contrariando algumas visões que defendem a flexibilização da Emenda Constitucional que estabeleceu o teto de gastos (EC 95/16), ele disse que a saída do país não está em furar o teto, mas em quebrar o piso dos gastos.
Na apresentação da proposta orçamentária, o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, mostrou que cresceu, em relação a este ano, a insuficiência de recursos para cumprir a Regra de Ouro, segundo a qual o volume de empréstimos do setor público não pode superar as despesas de capital.
Se neste ano as despesas condicionadas somavam R$ 258,1 bilhões (uma operação de crédito suplementar foi aprovada pelo Congresso para suprir este rombo), para 2020 as despesas condicionadas chegam a R$ 367,03 bilhões. Com isso, no ano que vem, o Executivo terá que pedir ao Legislativo nova autorização para descumprir a Regra de Ouro, aprovando um crédito suplementar neste volume.
Na proposta orçamentária, estão condenadas à aprovação desse crédito as seguintes receitas:
▪ Benefícios previdenciários – R$ 156,5 bilhões
▪ Pessoal e encargos sociais – R$ 104,6 bilhões
▪ Bolsa Família – R$ 9,0 bilhões
▪ Subsídios e subvenções econômicas – R$ 6,7 bilhões
▪ Compensações à Previdência Social pelas desonerações – R$ 5,0 bilhões
▪ Seguro-desemprego – R$ 10,3 bilhões
▪ Sentenças OCC (sentenças judiciais) – R$ 20,4 bilhões
▪ Complementação Fundeb – R$ 6,6 bilhões
▪ Financiamento de campanha eleitoral – R$ 1,2 bilhão
▪ Benefícios aos servidores – R$ 3,4 bilhões
▪ Despesas obrigatórias com controle de fluxo – R$ 25,4 bilhões
▪ Despesas discricionárias do Poder Executivo – R$ 17,5 bilhões
CARLOS LOPES ” BLOG OS DIVERGENTES” ( BRASIL)
- Carlos Lopes é jornalista e diretor da Agência Tecla / Informação e Análise