A Semana de Economia, da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas, permitiu um bom apanhado sobre dois temas: as razões da atual fase de estagnação da economia brasileira; e as causas do país ter perdido o bonde do desenvolvimento. O segundo ponto deixo para um outro artigo.
Em sua apresentação, Demian Fiocca expos os argumentos de Larry Summers, o economista que vem comandando as revisões nos diagnósticos sobre crises e, especificamente, sobre o fenômeno da estagnação secular.
Há duas vertentes sobre insuficiência da demanda de longo prazo.
A primeira, que diz que a oferta não cria sua própria demanda. A segunda, a que considera mediação entre lucro e investimento.
Larry Summers traz para a discussão a questão da concentração de lucros.
O desafio da demanda – principal fator da estagnação secular – não vem dos salários, que são gastos, mas da concentração do lucro. Nos últimos anos, dobrou a parcela dos ricos na renda nacional americana. Os 1% mais ricos passaram de 10- a 20% da renda nacional.
Quando se analisa o perfil das empresas, quem obtém o lucro, quem tem acesso a financiamentos e equity, são empresas com perfil de Amazon, Facebook, Google. No seu caso, dificilmente o lucro volta para a economia. Ao contrário de empresas de infraestrutura, por exemplo, cuja capitalização era garantia de aumento dos investimentos.
A grande questão é que as políticas macroeconômicas falharam, e antes da crise de 2008 o crescimento se manteve com medidas artificiais. Os cinco anos anteriores, de crescimento, só foram possíveis devido às distorções do excesso de crédito e do sobre investimento em habitação, que garantiu um crescimento de 1,15% ao ano. Em caso de nova crise, como será feita a transição fiscal e de juros, sem espaço para isso?
De 2004 a 2013 o Brasil cresceu 4,5% ao ano. O mistério maior não é a crise de 2015, onde houve uma freada de arrumação, mas a continuidade da estagnação, mesmo com queda da inflação e dos juros.
Na crise do subprime, o Brasil conseguiu contornar a crise de crédito com a atuação dos bancos públicos. De 2016 em diante houve grande mudança no perfil de sua atuação. Em 36 meses, bancos públicos tiraram da economia 5,8% do PIB e os bancos privados colocaram apenas meio por cento. Se bancos públicos tivessem mantido a oferta de crédito, estima Demian, haveria 2 pontos a mais na demanda.
Nelson Barbosa identifica quaturo fatores para explicar a estagnação:
- Efeitos da grande recessão de 2014-2016
- Estratégia de política econômica de Temer-Bolsonaro.
- Piora no cenário internacional a partir de 2018
- Incerteza institucional com politização da Justiça e judicialização da política, levando ao chamado apagão das canetas – funcionários de bancos públicos relutando em assinar qualquer contrato com receio da criminalização imposta pelo Ministério Público.
- Cenário político instável.
Barbosa cita estudos de Manoel Pires e Bráulio Borges sobre o aperto fiscal. A medida correta é a variação do déficit primário, corrigindo pelo ciclo: ou seja, qual seria o resultado esperando se a economia estivesse operando em pleno emprego. Por essa métrica, o país estaria há três anos com contração fiscal de 0,7% do PIB.
A lógica do governo é proceder a um ajuste fiscal de tal ordem que devolverá a confiança ao investidor, de tal maneira que o gasto privado possa aumentar mais que proporcionalmente à queda do gasto público.
A hipótese de Barbosa é a chamada histerese (de acordo com o dicionário, é a capacidade de um sistema preservar uma deformação efetuada por um estímulo).
Muito tempo de inflação elevada gera indexação. Muito tempo de produto permanentemente abaixo do seu potencia, cria desestímulo adicional ao investimento privado.
Em vez de rever a teoria, à luz dos fatos, o governo muda as hipóteses. Agora, recorre aos argumentos ad terrorem, de que a flexibilização do teto de gastos transformará o Brasil em Venezuela em 24 horas.
As propostas de Barbosa são:
- Manter estratégia de reformas estruturais.
- Atenuar restrição fiscal no curto prazo para garantir programas essenciais (saúde, educação e segurança) e recuperar investimentos mais rapidamente em infraestrutura e habitação.
- Com taxas de juros atuas, financiar aumento do investimento com emissão de dívida pública.
- Nova meta fiscal, de gastos correntes, excluindo investimentos, com cláusula de ajuste automático de despesas (em caso de recessão).
O Índice de Bons Tempos Econômicos
Um trabalho interessante foi apresentado por Daniela Campelo.
Ela criou um Índice de Bons Tempos Econômicos casando duas variáveis: preços de commodities e taxas de juros americana. O ponto ótimo é preços de commodities em alta e taxas de juros em queda. E vice-versa.
O índice é interessantíssimo, especialmente nos momentos de inflexão, onde se casa perfeitamente com a perda de popularidade dos governantes e em sua capacidade de se reeleger.
Por exemplo, houve uma reversão forte em metade dos anos 60 e no começo dos anos 80. No primeiro caso, comprometeu a democracia; no segundo, erodiu a ditadura.
Segundo esse índice, 2003 a 2010 foi um período sem precedentes na América Latina, com todos os ventos a favor. A reversão começa em 2010, justamente o início do governo Dilma.
As desonerações de Dilma foram praticadas, também, em outros países da América Latina. A diferença maior, que levou ao impeachment, foi o desrespeito ao resultado das eleições de 2014.
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)