As datas nacionais, por toda a parte, costumam ser festa de congraçamento, aquela em que se comemora a comunhão de identidades e desejos, uma espécie da “Feliz Ano Novo” de uma coletividade, como no 1° de janeiro, acima de cores, credos, renda, idades e tudo o mais. Uma festa sem natureza religiosa ou de classe, de todos.
O golpe de 1964, que separou militares de civis foi, na história, o que começou a fazer se perder tal natureza democrática. Passou a ser o dia da “Parada Militar”, que aqui não carrega sequer o conteúdo de soberania, seja pelo alinhamento servil aos Estados Unidos, seja pela sua outra face, a tutela – para muitos desejada ou consentida – da sociedade pelo poder militar, em lugar de ser este a projeção da afirmação do país-nação.
Os 30 anos de democracia não foram capazes de fazer nascer, dentro das Forças Armadas, uma visão diferente desta tutelar, velha de quase um século e que perdeu, muito cedo, a rebeldia de sua juventude no tenentismo, trocando a causa da transformação pela obsessão conservadora.
Na esquerda, em vetor invertido, a adesão acrítica aos valores globais, expressa no identitarismo, deixou-se desbotar a bandeira nacionalista que sempre a marcou por um arco-íris de causas necessárias e generosas. Espertamente, o entreguismo apossou-se, como fantasia, de símbolos que sempre foram dela.
Neste processo, a alma nacionalista se foi, porque ser conservador, no Brasil, passou a confundir-se com a manutenção de um status-quo colonial, agora tão explícito que o presidente brasileiro, na primeira mensagem do Sete de Setembro, no Facebook, logo na primeira linha, saúda…os Estados Unidos.
Numa boa reportagem de Cristian Klein e Rafael Rosas, no Valor Econômico, o professor de Filosofia Renato Lessa descreve como nos sentimos a três anos de completarem-se dois séculos de independência:
“O que vejo no futuro imediato é a desconfiguração da ideia de nação. O Brasil deixa de ser um país e passa a ser um lugar, um território, para se fazer negócio, com um mínimo de regulação. Como era na época da colônia, quando o Brasil não era um país. Era um espaço de predação, inclusive no regime de trabalho, em que podia se usar mão de obra sem qualquer restrição”.
Para que possamos ser “plenamente” assim, completa ele, é preciso destruir o que remanescia do projeto nacional pós 1930. E Jair Bolsonaro é o portador deste “desprojeto”.
É curioso, em relação a uma matéria em que se procurava ouvir a resposta sobre “qual é o projeto para o nosso país?”, dois líderes militares do Governo, Augusto Heleno e Eduardo Villas Bôas e o Ministro da Economia, Paulo Guedes, não tenham respondido aos pedidos de entrevista.
Não é fácil dizer que se quer apenas ser uma boa, eficiente e bem-comportada colônia.
FERNANDO BRITO ” BLOG TIJOLAÇO” ( BRASIL)