
CHARGE DE AROEIRA ” BLOG BRASIL 247”
Quase um mês atrás, o Oriente Médio parecia promissor para o governo Donald Trump.
Em 16 de maio, o presidente dos EUA, acompanhado por uma delegação de CEOs das trinta empresas americanas com maior impacto na economia global, concluiu uma viagem de quatro dias por três países árabes considerados aliados.
O resultado da visita à Arábia Saudita, Catar e Emirados Árabes Unidos não poderia ter sido melhor. Além dos acordos comerciais, foi assinado um plano de investimento dos Emirados no valor de US$ 440 bilhões no setor energético dos EUA, bem como a maior venda de armas da história, ao preço de US$ 142 bilhões para a monarquia saudita.
Foi também a melhor representação de que na região mais conturbada do planeta, abalada primeiro pelo ataque do Hamas de 7 de outubro de 2023, e depois pela sangrenta repressão israelense contra a população de Gaza, ainda havia espaço para negócios altamente lucrativos tanto para as corporações quanto para os governos que usam seu poder econômico.
Com os regimes extremamente ricos do Golfo Pérsico alinhados aos Estados Unidos e com Israel estabelecendo à força seu poder militar nos territórios palestinos e países vizinhos, a questão final a ser resolvida no Oriente Médio é o que fazer com o Irã. Principalmente, como incitar uma crise que poderia minar o regime xiita, que, internamente, precisa enfrentar dissidências cada vez mais proeminentes em meio a uma crise econômica alimentada por críticas recorrentes às crescentes restrições às liberdades civis.
Enquanto isso, no âmbito internacional, o aríete usado pelos Estados Unidos e Israel para deslegitimar o Irã concentra-se na desconfiança em torno de sua produção de armas atômicas. Esse medo é ainda mais alimentado pela recusa do Irã em reconhecer o direito do Estado de Israel de existir e por uma retórica nacionalista e religiosa, combinada com bravatas ocasionais, que no Ocidente é frequentemente interpretada diretamente como uma ameaça direta.
Para o governo de Benjamin Netanyahu, a política de enriquecimento de urânio de Teerã é simplesmente inaceitável. Nem o compromisso com o uso exclusivamente civil, nem o monitoramento por organizações internacionais, nem quaisquer acordos que o Irã possa firmar com os Estados Unidos e as principais potências europeias são válidos.
No entanto, neste momento, o principal problema para Washington e Tel Aviv não é tanto o governo iraniano, mas as redes e organizações, como o Hezbollah e os Houthis, que se alimentam dos recursos do regime xiita e que podem potencialmente espalhar conflitos para qualquer canto do Oriente Médio ou mesmo da Europa, onde imigrantes de países árabes e um crescente movimento islâmico radical coexistem à margem, em uma situação de precariedade e exclusão, ainda mais incentivados pela extrema direita governante.
O suposto desligamento da Casa Branca da operação israelense nas primeiras horas de 13 de junho diz muito sobre a visão predominante de Washington sobre o Oriente Médio. Também diz muito sobre a divisão de trabalho acordada entre os Estados Unidos e Israel.
Para o governo Trump, além das diferenças políticas e culturais, existem parceiros racionais com quem buscar negócios lucrativos e joint ventures. Os Acordos de Abraham, assinados durante seu primeiro mandato, revelam esse desejo compartilhado de expandir o mercado capitalista em troca de favores políticos e alinhamentos ideológicos. Esta é uma condição essencial para novos acordos desse tipo.
Em contraste, quando se trata de lidar com governos rebeldes e organizações terroristas, o melhor concorrente é Israel, que não busca pacificar a região, mas, no máximo, exercer controle por meio de seu enorme destacamento militar. Mas, embora as diferenças em Washington sejam claras, no cenário de guerra em si, essas distinções nem sempre são tão óbvias.
Para a política interna israelense, o ataque ao Irã (foto) se tornou uma prioridade máxima, já que as últimas semanas foram as mais difíceis para garantir a sobrevivência do governo Netanyahu.
Uma proposta para convocar novas eleições, apresentada pelo principal partido da oposição, inicialmente teve o apoio de dois dos grupos religiosos e conservadores que compõem a aliança governante, mas eles rejeitam a iniciativa que exige que os membros ultraortodoxos cumpram o serviço militar obrigatório como qualquer outro cidadão israelense.
A derrota apertada da oposição na manhã de quinta-feira dá a Netanyahu algum fôlego, mas o obriga a reconstruir urgentemente sua aliança nacionalista de extrema direita. O ataque ao Irã, realizado após a votação, deveria levar o primeiro-ministro a iniciar a tarefa de reconstruir suas fileiras internas em meio a críticas generalizadas à sua campanha brutal em Gaza e à falta de vontade política para negociar a libertação dos reféns sobreviventes ainda mantidos pela organização terrorista Hamas.
A nova ofensiva israelense traz mais uma vez o cenário de guerra à tona. Não só o papel mediador assumido por Trump nas negociações com o Irã sobre o urânio enriquecido é obscurecido e até mesmo deslegitimado, como também estabelece limites precisos às suas ambições e à sua sede insaciável por ganhos políticos e econômicos. Mais cedo ou mais tarde, a Casa Branca perceberá que precisa negociar não apenas com os países árabes, mas também com Israel, a quem, no entanto, fornece anualmente amplo apoio financeiro para garantir seu sistema de defesa e o aprimoramento constante de suas capacidades armamentistas.
A esta altura, não seria de se estranhar que o líder republicano também considerasse a possibilidade de uma mudança no governo israelense, diante de um aliado que, além das semelhanças ideológicas, atualmente traz mais complicações do que benefícios ao seu próprio projeto econômico.
Em meio à disputa entre os “grandes atores” e as ambições dos “tomadores de decisão”, o Oriente Médio está agora um passo mais perto de uma guerra total. Um “ataque preventivo” dificilmente evitará o desastre iminente…
DANIEL KERSFFELD ” PÁGINA 12″ ( ARGENTINA)