
Bastou uma palavra para o papa Leão XIV resumir o que quer dizer aos norte-americanos. Interpelado pelo jornalista da NewsNation Robert Sherman, no final da sua primeira audiência com os media no Vaticano, à pergunta “alguma mensagem para os EUA?”, o recém eleito sumo pontífice respondeu com um “Muitas” que diz bastante mais do que as seis letras que o compõem. Um “muitas” que, no entanto, suavizou logo de seguida, e enquanto se afastava de sorriso no rosto, com um “Deus vos abençoe a todos”.
Apesar da economia de palavras do primeiro papa norte-americano, este “many” – dito no seu inglês de Chicago – foi logo visto como um claro recado para a Administração Trump. Até porque ainda antes de ser eleito papa, no dia 8, na sequência na morte de Francisco, a 21 de abril , o então cardeal Robert Prevost já criticara as políticas do presidente Donald Trump nas redes sociais. A última vez já em meados de abril quando retuitou um post a condenar a deportação para El Salvador de Kilmar Abrego Garcia, um imigrante ilegal, pai de três filhos e a viver no Maryland. “Não veem o sofrimento? A vossa consciência não está perturbada? Como podem ficar calados?”, lia-se no post. Antes disso, Prevost já partilhara uma série de artigos a criticar as declarações do vice-presidente J.D. Vance sobre ordo amoris – o conceito atribuído a Santo Agostinho e desenvolvido por São Tomás de Aquino segundo o qual “a prioridade é que tu ames a tua família, depois o teu vizinho, depois a tua comunidade, depois os teus concidadãos e, só então, o resto do mundo”. “J.D. Vance está errado: Jesus não nos pede para classificar o nosso amor pelos outros”, podia ler-se no título de um dos artigos que partilhou.
Mais de 20% dos 330 milhões de norte-americanos, os católicos ocupam hoje lugares de destaque na Administração Trump – com o vice-presidente Vance, criado como evangélico mas convertido ao catolicismo em 2019, a não esconder o orgulho na sua fé. E se dúvidas houvesse sobre o seu peso na sociedade americana, basta pensar que seis dos nove juízes do Supremo Tribunal são católicos.
Mas se muitos norte-americanos se congratularam com a eleição do primeiro papa nascido nos EUA – e o próprio Trump, casado com a católica Melania, escreveu na rede Truth Social: “É uma grande honra perceber que ele é o primeiro papa americano”, no seu campo político as reações foram tudo menos de euforia. Entre os seguidores do MAGA – Make America Great Again multiplicaram-se os lamentos por Leão XIV, na sua visão, não defender o America First. “É chocante para mim que um tipo que tem o feed no Twitter que tem e fez as declarações que fez sobre altos quadros políticos dos EUA possa ser eleito papa”, lamentou Steve Bannon, ex-estratega de Trump, em declarações à BBC. E previu que “vai sem dúvida haver fricções” entre o papa e o presidente. Para já, aguardemos para ver se Leão XIV explicita os recados que gostaria de dar aos norte-americanos.
HELENA TECEDEIRO ” DIÁRIO DE NOTÍCIAS” ( PORTUGAL)
Editora-executiva do Diário de Notícias