PAPA FRANCISCO ANTECIPA BIOGRAFIA PÓSTUMA

Era um livro para ser publicado após a morte, mas Francisco revelou-o por causa do Jubileu.

O anúncio de uma Autobiografia do Papa Francisco alvoroçou o noticiário – e o mercado editorial – e abriu o apetite para a leitura de mais uma publicação do sumo pontífice. Desta vez não era uma encíclica, nem mais um livro em que «Deus» surge no título e o rosto do Papa em destaque, como em Deus Quer que Sejas Feliz (Porto) ou Deus Ama-te (Albatroz), mas um volume onde a palavra Esperança domina o título, aumentando o do anterior de há poucos meses, A Esperança Nunca Desilude (Cultura). Esta prolífica veia literária do Papa não impediu que ao chegar às livrarias, Esperança atingisse de imediato o primeiro lugar nas vendas de não-ficção.

A razão é simples, trata-se de uma autobiografia de um Papa que deu muita esperança aos católicos com a sua eleição e por ser um relato da sua vida escrito na primeira pessoa. Coisa nunca vista no Vaticano e que Francisco decidiu alterar, revivendo a sua vida desde os primeiros anos, sem esquecer as raízes, até ao presente, não ignorando as crises do seu papado e as muitas que o mundo tem atravessado, como a da invasão da Ucrânia pela Rússia e a guerra eterna no Médio Oriente. Torna-se ainda uma obra mais importante por não evitar tópicos da sua vida pessoal que poderia ignorar.

Não se pode considerar que Autobiografia resulta unicamente do próprio pulso de Francisco, mas o processo é em tudo autobiográfico e fruto da sua reflexão. Durante os últimos seis anos, entre 2019 e dezembro de 2024, o editor italiano Carlo Musso teve bastantes conversas, trocou mensagens e recebeu textos do Papa, e é o resultado dessa relação que está posto em Esperança. Aliás Musso foi bem claro sobre todo esse processo: “Só depois dessa recolha é que escrevi uma primeira versão, a que se seguiu um percurso a dois para o livro ser o mais perfeito possível. Antes e depois, houve sempre uma grande liberdade e nunca foram estabelecidas linhas vermelhas. Desse modo, Esperança reflete as memórias muito pessoais do Santo Padre a todos os níveis: a vida pessoal, a vida religiosa e o pontificado. O Papa é a cola que une toda a narrativa, sendo claro que mesmo perante qualquer dificuldade, Francisco tem sempre uma mensagem invencível de esperança.”

O lançamento antecipado de Esperança é justificado por 2025 ser o Ano Santo do Jubileu e de este volume poder contribuir como guia espiritual para esta data. Assim, consciente de que as suas palavras poderiam ajudar a “preparar» os católicos e a «renovar» a confiança dos crentes para os desafios em perspetiva, Francisco decidiu publicar um livro que deveria ser póstumo. Com um sucesso tal que entrou na lista dos bestsellers do New York Times e tem tido resenhas bastante elogiosas pelo que a Autobiografia desvendava e a situação inesperada do principal protagonista das religiões levar para livro uma “narrativa íntima de grande força”, de evidenciar um tom “profético” em alguns dos seus pensamentos e, até, em incluir uma série de fotografias nunca vistas.

Não será necessário recorrer a jornais norte-americanos para se conhecer uma opinião esclarecida sobre esta Autobiografia quando um teólogo português leu e a referenciou da seguinte forma: “Quando me chegou a notícia da Autobiografia do Papa Francisco não fiquei muito entusiasmado. Hoje, depois de ler e reler a sua autobiografia, já não posso dizer que era desnecessária. Pelo contrário.” Quem fez esta afirmação foi frei Bento Domingues numa das suas recentes crónicas dominicais. 

O que Jorge Mario Bergoglio (Papa Francisco) conta ao longo de 358 páginas não se destina apenas a leitores crentes, também interessa a qualquer bom leitor do género Biografia, situação que se entende ainda se vai na segunda página e relata o episódio do naufrágio do Titanic italiano, o navio no qual o seu pai e avós deveriam ter viajado para a Argentina e, por não terem vendido a tempo os bens, tiveram de atrasar o momento de emigrar, salvando-se e permitindo que o futuro Papa viesse a ter existência. Está lançada uma narrativa inspirada que irá percorrer a vida do primeiro papa nascido na América e um não-europeu no Vaticano em mais de mil anos, sendo que sempre que pode liga a sua vida aos acontecimentos da História: “O que é a guerra aprendi-o com o meu avô”; a exclusão ao dizer “no meu bairro, as diferenças eram respeitadas”; os anos de repressão, que “foram anos terríveis para mim por transportar pessoas às escondidas”; a referência a Deus ser “pai e é mãe ainda mais” ao falar sobre a “condição da mulher na nossas sociedades”… Até mesmo quando confessa “sempre gostei de jogar à bola” aproveita para dizer que o “desporto é uma grande ocasião para aprender o melhor de si”.

Enfim, uma autobiografia a que não faltarão leitores.

ESPERANÇA – A AUTOBIOGRAFIA

Papa Francisco

Nascente

JOÂO CÉU E SILVA ” DIÁRIO DE NOTÍCIAS” ( PORTUGAL)

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