Gabinete é eco conceitual do que muitos imaginam ter sido a trajetória do ex-juiz: teria comprado vaga em concurso e desrespeitava direitos humanos
Depois que Sergio Moro ganhou notoriedade além do Paraná, com a Lava Jato, o que se disse sobre ele: 1) como um agente público que não sabe citar uma só biografia, embora afirme que este seja seu gênero literário favorito, conjuga mal os verbos e confunde a palavra cônjuge com conja passou no concurso para juiz? Talvez tenha fraudado o concurso. É o que se afirma.
Também se disse sobre ele: 2) que as prisões preventivas prolongadas, muitas vezes em estabelecimentos penitenciários insalubres, eram método equivalente à tortura, a que ele recorria para forçar acordos de delação. Hoje já está comprovado que alguns desses acordos produziram depoimento mentiroso, como o de Antonio Palocci.
Ecos conceituais desses dois males do serviço público estão presentes no gabinete que Sergio Moro montou no Senado Federal. Dois de seus assessores foram acusados, respectivamente, de participar de fraude em concurso no Judiciário e também da prática de tortura.
Em ambos os casos, seus protagonistas teriam sido absolvidos pela Justiça, embora, num primeiro momento, um deles tenha cumprido até prisão preventiva.
A assessoria de Sergio Moro disse que o senador não se manifestará, mas não enviou as sentenças de absolvição de seus servidores na justiça criminal, apesar de solicitadas. Os funcionários também não darão entrevista.
No caso da fraude em concurso, a servidora em questão é Isabel Coelho da Paz Mendes, coordenadora de comunicação do gabinete de Moro, com salário-base de R$ 28,5 mil.
Segundo a portaria GPR 1609, de 21 de dezembro de 2005, assinada pelo então presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, Isabel teve a nomeação para o cargo efetivo de Técnico Judiciário anulada, em razão da fraude.
Na época, seu nome foi encaminhado para o Ministério Público, Advocacia Geral da União e Tribunal de Contas da União. Em dezembro de 2012, ela e os demais acusados de fraude tentaram barrar o processo contra eles, mediante apresentação de habeas corpus, mas a medida foi negada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O caso de processo por tortura envolve o policial José Paulo de Freitas e Silva. Ele e mais 14 agentes públicos, entre delegados, investigadores, carcereiros e um PM, foram processados sob a acusação de torturar quatro suspeitos da morte da adolescente Tayná Adriane da Silva, de 14 anos, em 2013. Os denunciados cumpriram prisão preventiva.
De acordo com a denúncia do Ministério Público, aceita pela Justiça, todos os policiais trabalhavam no momento da tortura – portanto, poderiam tê-la impedido – ou participaram diretamente dos atos de violência, na delegacia do Alto Maracanã, em Colombo, região metropolitana de Curitiba.
Tayná havia desaparecido em 25 de junho daquele ano, após avisar a mãe que estava voltando para casa. No dia 27, a delegacia do Alto Maracanã, em Colombo, prendeu quatro suspeitos, que, segundo o delegado Silvan Rodney Pereira, teriam confessado que estupraram a adolescente várias vezes, e, em seguida, a mataram.
No dia seguinte, o corpo da menina foi encontrado submerso num poço na região. Foi coletado sêmen nas roupas de Tayná, e o resultado demoliu o inquérito da Polícia Civil: o material genético não pertencia a nenhum dos suspeitos.
Eles contaram, então, que confessaram os crimes após terem sido torturados.
Segundo reportagem do UOL, publicada na época, o caso gerou uma “crise” na “legitimidade da atuação” da Polícia Civil, conforme revelou o secretário da Segurança Pública do Paraná, Cid Vasques.
Por conta disso, o delegado-geral da corporação foi substituído. Os quatro suspeitos que confessaram o crime sob tortura foram levados para fora do estado do Paraná, protegidos pelo Programa Federal de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas.
Já o policial José Paulo, um dos 15 processados por tortura, foi condenado em primeiro instância, absolvido em segunda, e aguarda resultado do julgamento no Superior Tribunal de Justiça.
Enquanto isso, recebe do Senado salário-base de R$ 7.974,02, uma vez que foi contratado por Sergio Moro para ser um dos seus funcionários de apoio. Com o adiantamento do 13o, mais auxílio alimentação, José Paulo recebeu, em junho, R$ 12.212,00 líquidos.
O caso Tayná, até hoje, não foi esclarecido. A falsa confissão, obtida sob tortura, prejudicou todo o inquérito. Como se viu na Lava Jato e também em qualquer outra investigação, a fraude pode ajudar a dar notoriedade a seus protagonistas num período, às vezes curto, mas destrói a credibilidade da justiça.
JOAQUIM DE CARVALHO ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)