Uma esplanada, um convidado, uma conversa descontraída. O humorista estreia a mais recente rubrica da SÁBADO e fala de tudo: do seu novo filme à sua timidez e à bola (“sou do melhor clube português”).
Há várias formas de encarar o trabalho de César Mourão. Se nos Commedia a La Carte se especializou no humor de improviso, em Terra Nossa, o programa que mantém na SIC, reforçou a fama e o afeto popular. A isso juntou o trabalho como ator e músico. Agora, prepara-se para ganhar nova vida no cinema.
Com o filme Podia Ter Esperado Por Agosto, quase a chegar às salas, estreia-se como realizador. Um bom pretexto para inaugurar a nova rubrica de verão da SÁBADO. Numa tarde soalheira deste mês, sentámo-nos com ele na esplanada do café Linha d’Água, em Lisboa.
À chegada, pousou a câmara fotográfica que trazia à tiracolo. “Isso é uma Leica?” Era, e é também uma ferramenta de observação e registo, um hobby ainda pouco revelado ao grande público, que o abraça e beija nos mercados e ruas e ao qual, garante, está grato. Ainda há, porém, facetas de César Mourão por descobrir. É a essas que quer agora dar espaço.
Gosto muito de pessoas, não gosto assim tanto de lidar com elas. Se me deres a escolher, fico num canto. Não encho uma casaGosta genuinamente de pessoas ou já é a mecânica da profissão?
Gosto de pessoas, não gosto assim tanto de lidar com elas, até porque sou tímido. Sou fascinado por observar comportamentos e pessoas. Sei que não parece, mas se me convidares para o teu aniversário, à partida não vou, fico “epá, aquilo é não sei onde, com não sei quantas pessoas”.
Então num contexto social é o tipo de pessoa que gosta de ficar no canto?
Se me deres a escolher, fico num canto, com um copo e dois ou três amigos a falar baixinho. De repente há um interruptor que se aciona e aí passo a liderar sem querer, mas volto depois ao canto. Não encho uma casa, sou bem pacato.
Que outra profissão gostava de experimentar?
Adoro a minha profissão mas tenho um fascínio por publicidade, era uma coisa que adorava. E fotografia é uma coisa que gosto há muito tempo. O meu sonho era ficar a realizar de vez em quando, daqui a uns anos, e viver da fotografia à volta do mundo.
As pessoas vão ficar surpreendidas por o verem como realizador?
Sinto que a minha carreira está a ser como dar a medicação aos meus filhos. Primeiro enchemos a seringa, depois há um desmame. Andei, durante muito tempo, a dar a dose certa às pessoas, felizmente gostaram, depois fui reduzindo a dose.
Tem medo de saturar o público?
Não sei se é todo o público, mas tenho a certeza de que vou, eu e qualquer pessoa que trabalhe em televisão e cinema. Nesta profissão estás constantemente em late check-out.
O meu sonho era ficar a realizar de vez em quando, daqui a uns anos, e viver da fotografia à volta do mundo
Qual é o melhor plano para o fazer sair de casa?
Um bom jantar. Basta um bom convívio com amigos, jantar não sei onde e ficar na rua a conversar até às tantas.
E jantaradas em casa?
Adoro, e não é só o jantar em si. Adoro teorias à mesa, e nem estou a falar de quando está tudo bêbado, até porque bebo muito pouco álcool.
Vai à bola com frequência?
Sim, e sou do melhor clube português [Sporting Clube de Portugal].
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Comporta-se quando está a ver jogos de futebol?
Não me passo a ver jogos salvo uma exceção, com o Benfica. Quando era miúdo, ia com os meus avós a um talho em que o senhor, com a bata suja de sangue e com uma faca grande, era muito benfiquista. Ele achava graça – percebo que tenha alguma –, sabendo que eu era muito sportinguista, a sair com a faca e dizer ‘se não fores do Benfica, arranco-te os olhos’. Acho que a culpa é desse senhor.
Ronaldo no Panteão?
Se me perguntares agora, digo-te que acho que não faz sentido. Se ele chegar aos 90 anos, quem tiver 40 naquela altura vai achar “sim senhor, o Ronaldo, este senhor”.
A conversa prossegue, mas César Mourão vai intervalando respostas com disparos da câmara. “Desculpa, deixa-me só apanhar isto. Lá está, é a tal coisa da observação.” Foi assim, aliás, que construiu a personagem Esperança, homónima da série que estreou na SIC em 2020. “Não sou uma pessoa de guardar recordações físicas. Às vezes tenho pena, vi Stevie Wonder [que considera ter sido o melhor concerto da sua vida], guardei o bilhete? Não. Mas guardo tudo na cabeça.”
Quanto ao futuro, prefere não revelar o jogo, mas deixa em aberto: “Sei que digo que a ideia é sair da televisão daqui a uns anos, mas se calhar não é, estou é a preparar a possibilidade de ter essa saída.
TIAGO NETO & BRUNO COLAÇO ” REVISTA SEMANAL SÁBADO” ( PORTUGAL)