VITRAIS LUSOS NA COSMOPOLITA SÃO PAULO

  • Três metrópoles das Américas sintetizam, indelevelmente, o cosmopolitismo do Novo Mundo. A primeira delas é, sem dúvida, a fabulosa Nova York, fundada pelos holandeses, em 1624, denominada Nova Amsterdam, que passou a se desenvolver com o desembarque na ilha de Manhattan das tropas batavas após a derrota, em Pernambuco, frente ao exército luso-brasileiro, em 1649, na derradeira Batalha dos Guararapes, às portas de Recife, assinalando a Restauração Portuguesa no Nordeste.
  • Os neerlandeses contaram novamente com a parceria, no empreendimento na América do Norte, como acontecera antes no Brasil, de milhares de portugueses judeus que haviam se refugiado nos Países Baixos, protegidos pelos protestantes calvinistas, para escapar da odiosa Inquisição Católica na Península Ibérica – e que também acabariam expulsos. A segunda é a magnífica Buenos Aires, às margens do sereníssimo Rio da Prata, estabelecida, inicialmente – em 1536, pelo adelantado espanhol Pedro de Mendoza (1499 – 1537), filho da andaluza Granada.
  • A terceira é, inegavelmente, São Paulo, maior das capitais de língua portuguesa, criada, oficialmente, em 1554, pelo valoroso jesuíta transmontano Manuel da Nóbrega (1517 – 1570), na qual convivem em harmonia, numerosas comunidades formadas por povos de todo o planeta. Percebi a exuberância e cosmopolitismo de São Paulo, ao aqui chegar, em 1968, num dia especialmente festivo no calendário local, 25 de janeiro – data de sua fundação.
  • Houve um jogo amistoso, naquela tarde, no Estádio do Morumbi, entre São Paulo e Benfica, que terminou 3 a 2 para o dono da casa, Uma hora depois do final da partida, li, surpreso, numa edição extra do diário “A Gazeta Esportiva”, que havia no estádio quase o mesmo número de torcedores são-paulinos e benfiquistas. Talvez tivesse um pouco de exagero. Mas, na verdade, São Paulo era então a segunda cidade portuguesa do mundo, com cerca de 600 mil emigrantes – ficando atrás apenas de Lisboa, que possuía, à época, um milhão de habitantes.
  • A fortíssima presença lusitana é sentida até hoje. Desde o Pátio do Colégio, na região central da Praça da Sé, onde os prelados de Nóbrega começaram a erguer a cidade, à fantástica coleção de 48 vitrais da grandiosa Beneficência Portuguesa, no bairro do Paraíso, próxima à queridíssima Casa de Portugal, na Avenida da Liberdade – da qual muito me orgulho de ser um de seus diretores. Os primorosos vitrais da Beneficência, instituída em 1859, parecem inspirados nas portentosas 10 tábuas do políptico do renascentista lusitano Nuno Gonçalves (1420 – 1490) – expostas, permanentemente, na lisboeta Igreja e Mosteiro de São Vicente de Fora, em São Vicente, uma freguesia vizinha à medieval Alfama.
  • Na obra de Nuno Gonçalves, como nos vitrais daqui, narra-se o heroísmo dos portugueses nos mares dos quatro continentes – reproduzindo, inclusive, uma perfeita cópia em vidro do políptico original. Exalta ainda a odisseia da construção do imenso Portugal das Américas. Principalmente a edificação de São Paulo iniciada, a rigor, pelo explorador beirão João Ramalho (1492 – 1582), “Patriarca dos Bandeirantes”, natural de Vouzela, distrito de Viseu – fundador, em 1550, de Santo André da Borda do Campo, uma das cidades que integram, atualmente, o ABC paulista.
  •   O Salão Padre Manuel da Nóbrega, no qual se encontram os vitrais da Beneficência, foi considerado “o mais belo e sugestivo do País” pelo baiano Pedro Calmon (1902 – 1985), arguto historiador brasileiro do século passado. O esplendor de Portugal, com certeza, está cá imortalizado. No coração da cosmopolita metrópole de língua portuguesa.         

ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL/ PORTUGAL)

Albino Castro é jornalista e historiador

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *